Paloma.Ferreira 02/07/2021
Gated Communities
CAPÍTULO 1 – Confiança e medo na cidade
“...as cidades globais entraram numa nova fase histórica, inaugurada no fim do século XX.”
No primeiro capítulo, Bauman nos constrói a estrutura textual a partir dos sentimentos, uma ótima narrativa, já que o capítulo do livro nos traz justamente dois sentimentos dicotômicos muito debatidos em todo o nosso contexto de vida. Viver a cidade é uma experiência ambivalente, assim como ela é capaz de atrair, seu poder de afastar também é grande.
É emergido um debate sobre insegurança, medo e emoções que nos aflige e que consequentemente despertará tais sentimentos no ser humano em relação ao meio em que está inserido. Sigmund Freud vai apresentar três causas embasadas na “lógica factual” da psique humana, no que tange os sofrimentos humanos:
Primeira (medo de sofrer), Segunda (medo em si): “poder superior da natureza, da fragilidade dos nossos próprios corpos e da inadequação das normas que regem os relacionamentos mútuos dos seres humanos na família, no Estado e na sociedade.” (Freud apud Bauman, 2005).
Aceitamos os limites do que somos capazes de fazer. Sabemos que nunca conseguiremos dominar a natureza totalmente e menos ainda tornaremos nossos corpos imortais. Ou seja, estamos prontos da nos contentar com “segundas opções”.
Terceira (miséria de origem social): “tudo o que foi feito pelo homem pode ser refeito.” Ou seja, estamos sempre querendo que o universo se adapte as nossas necessidades.
Robert Castel complementa o sofrimento humano, ao nos trazer uma definição de segurança, que seria esta uma tentativa de amenizar o sofrimento, ou seja, refazer as tipologias já existentes. “a insegurança moderna não deriva da perda de segurança, mas da ‘nebulosidade de seu objeto’”. Ou seja, não é a falta de segurança que nos faz clamar por segurança, mas sim a busca por ela.
A partir do momento em que temos o foco para a segurança das cidades, ou seja para os gated communities, as grandes fortificações e utilização de diversos aparatos tecnológicos e totalmente excludentes, criadores de fronteiras, teremos na mesma proporção a perda da solidariedade, que é substituída por este espírito de competição o que originará a dissolução dos laços comunitários. “Quando a solidariedade é substituída pela competição, os indivíduos se sentem abandonados a si mesmos, entregues a seus próprios recursos – escassos e claramente inadequados.” (pg 21).
“quanto mais nos separamos de nossas vizinhanças imediatas, mais confiança depositamos na vigilância do ambiente. ...Existem, em muitas áreas urbanas, um pouco do mundo todo, casas construídas para proteger seus habitantes, e não para integrá-los nas comunidades às quais pertencem.” (Gumpert e Drucker, apud Bauman).
São Paulo, por exemplo, é uma cidade feita de muros, isolamento e distância da cidade, ou seja, separação dos que são considerados socialmente inferiores. “A cerca separa o ‘gueto voluntario’ dos arrogantes dos muitos condenados a nada ter.
Outros assuntos abordados é a xenofobia, mixofilia e mixobia nas cidades atuais.
Diga-se mixofilia: a interação e a vivência com refugiados, imigrantes e qualquer tipo de pessoa que possua cultura diferentes da sua. Mixofobia, como o nome diz, é o preconceito com este grupo. “A sensação de nós’, que expressaria um desejo de semelhança, não é mias que um modo de fugir da necessidade de olhar profundamente um dentro do outro”. (Richard Sennett apud Bauman, 44).
Também é trazido ao debate as “classes perigosas” (Robert Castel) que nada mais é do que as “gente em excesso”, que não conseguiram ser reintegradas na aceleração do progresso econômico. Baumman os conceitua como “supérfluos” ou underclass (EUA), em resumo “gente que não contribui para a vida social”. Ou seja, são pessoas que na grande dialética do avançar dos anos, não conseguiram uma posição de destaque dentro do cenário econômico, sobretudo, sendo totalmente empurrados a uma categoria de subclasse, que provavelmente, nunca perderá tal título. Essas pessoas são empurradas para os off-limits “espaços marginais”.
Manuel Castells nos diz que a polarização se acentua, temos então, dois tipos de cidadãos: “primeira fila” ligado as comunicações globais. E na outra ponta (última fila), as redes locais fragmentadas, baseadas na etnicidade, confiança depositadas na própria identidade como recurso mais precioso para defesa (quase sempre é a reação).
A globalização, para os da “primeira fila”, apresenta um mundo mais amplo, portanto, sem muitas limitações. Este grupo geralmente não se identifica com o lugar onde moram, tão pouco nos negócios de sua cidade. Seus interesses são flutuantes, afinal sua posição é privilegiada no cyberespaço. Portanto, até mesmo sua morada pode tornar-se virtual. Já os da última fila estão fadados a permanecerem no lugar. Ou seja, seus sonhos, esperanças e insatisfações são dirigidos para as “questões locais”.
“Em poucas palavras: as cidades se transformaram em depósitos de problemas causados pela globalização.” E tais problemas só são debatidos quanto atingem a esfera local, o que de certa forma é contraditório, pois vivemos cada dia mais num modelo globalizado.
“É nos lugares que se forma a experiencia humana, que ela se acumula, é compartilhada, e que seu sentido é elaborado, assimilado e negociado. E é nos lugares, e graças aos lugares, que os desejos se desenvolvem, ganham forma, alimentados pela esperança de realizar-se.”
As cidades contemporâneas são campos de batalhas entre os sentidos globais e identidades resistentes. A modernidade é liquida, os resultados passageiros, a homegeinização é um percurso promissor. Quanto maior a uniformização do espaço, maior é o isolamento a ser produzido, pois se intensifica a intolerância às diferenças.
Steven Flosty “espaço escorregadio”, “espaço inatingível”.
CAPÍTULO 2 – Buscar abrigo na caixa de Pandora: medo e incerteza na vida urbana
“Com falta conforto em nossa existência, acabamos por nos contentar com a segurança, ou a ficção de segurança” (The Hedgehog Review apud Bauman, 52).
O progresso, se apresentava uno com a sua promessa de avanço e felicidade duradoura. Caracterizava-se como o ponto chave para libertação de diversos males. Entretanto, o que temos visto é um efeito apavorante e fatalista, mudanças que não trazem paz ou alegria fazem parte do cotidiano. É a “insônia povoada de pesadelos.” (Baumman, 53).
Dinheiro líquido: investimentos de todos os tipos, gerando a “capital do medo”. A globalização é quem fornece as balas para serem atiradas no meio, porém sempre há um financiador.
“Quando falamos das condições de vida na cidade, estamos nos referindo, na pratica, às condições de vida de toda a humanidade.” (56)
Hoje, temos cidades que nos faz pensar mais no perigo do que na segurança, contrariando totalmente a lógica de vivenciar tais espaços. “A vida nas cidades está se convertendo em um estado de natureza caracterizado pela regra do terror e pelo medo onipresente que a acompanha.” (Diken e Lausten). Bunkers, as cidades tornaram-se bunkers. É a arquitetura do medo, do arrepio.
Como Richard Roger exemplifica, é papel do arquiteto fazer os construtores, investidores entenderem a importância de tornar os espaços aprazíveis, quer com vegetação, quer com menos dispositivos miraculosos, a lógica é sempre a do capital, portanto, em dez anos, o edifício deve ser capaz de amortizar os custos. Roger também apresenta um panorama geral das cidades, da morte das cidades. A globalização afetou primeiramente, estes nossos espaços públicos, tão logo, devemos carregar em nós a missão de proteger estes espaços. “É nos locais públicos que a vida urbana e tudo aquilo que a distingue das outras formas de convivência humana atingem a sua mais completa expressão, com alegrias, dores, esperanças e pressentimentos que lhes são característicos.” (70)
Niam Ellin aponta as diferenças como um fator de integração, afinal o espaço público é palco para as mais diversas manifestações, de maneira que, a diversidade é sempre exaltada. Assim sendo, os espaços públicos precisam ser planejados para atender a tal demanda diversa, com usos igualmente múltiplos, sendo catalisadores e não barreiras. Neste sentido, qual o papel das esferas privadas¿ Como estas podem realizar projetos integrados ao espço público¿ Gehl coloca muito bem esta questão em seus escritos, apresentando diversas tipologias de edificações que contribuem para a vida na cidade.
“...a arquitetura ‘fornece um testemunho exaustivo do progresso da barbárie para a civilização”. (Lewis H Morgan apud Baumman, 73).
E por fim, a última frase de Baumman exemplifica o porquê de o urbanismo ser uma utopia, o “progresso da a civilização’ não é uma conquista, mas uma permanente luta cotidiana. Combate jamais totalmente vitorioso, que muito provavelmente não alcançara sua meta, mas que continua a ser encorajado pela esperança de vencer.
Este capítulo traz uma curiosidade sobre os SUV, consomem 30% gasolina, poluem 3x mais, em razão do seu peso, em colisões mostra-se mais perigoso. (2002 EUA).
Em 2005, menos de 10% da população indiana possuía um emprego regular (muitas estatais foram privatizadas, o que contribui).
CAPÍTULO 3 – Viver com estrageiros
“Quanto mais o espaço e a distancia se reduzem, maior é a importância que sua gente lhe atribui; quanto mais é depreciado o espaço, menos protetora é a distância, e mais obsessivamente as peças traçam e deslocam fronteiras.
Frederick Barth, grande antropólogo diz que “as fronteiras não são traçadas com o objetivo de separar as diferenças. Ao contrário, justamente por que se demarcam fronteiras é que, de repente, as diferenças emergem... vamos em busca de diferenças justamente para legitimar as fronteiras. (apud baumman, 75).