1919

1919 John Dos Passos




Resenhas - 1919


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jota 02/10/2023

MUITO BOM: 1919, segundo volume da trilogia USA (que pode ser lido separadamente) traz histórias tão envolventes quanto as do primeiro volume, Paralelo 42

Como este livro de John dos Passos (1896-1970) foi uma releitura que se seguiu à leitura de Paralelo 42 (1930), primeiro volume da trilogia USA (que se completa com O Grande Capital, 1936), penso que 1919 (publicado em 1932) me pareceu melhor desta vez. Talvez porque eu esteja mais velho (era pouco mais do que um adolescente quando li o exemplar do meu pai), além do que nessa releitura não li as seções Noticiário (composta basicamente por recortes de manchetes e trechos de matérias de jornais daquele tempo) e A Lente Objetiva (fragmentos de pensamentos, fluxos de consciência caóticos, por vezes poéticos, de personagens anônimos) em sequência, preferindo lê-las depois de acompanhar as histórias ficcionais e as biografias dos personagens reais que dão vida ao volume.

1919 faz referência ao ano em que se deu a Conferência de Paz de Paris, que efetivamente deu fim à Primeira Guerra Mundial, em que participaram os chamados quatro grandes de então, França, EUA, Inglaterra e Itália, paises que elaboraram os tratados de paz assinados por Alemanha, Áustria e Bulgária. Mas da guerra em si mesma dos Passos fala muito pouco, portanto caso se fosse estabelecer uma conexão do livro com, por exemplo, o ótimo filme 1917 (que Sam Mendes dirigiu em 2019) haveria quase nada de comum entre ambos, já que o escritor deu ênfase aos bastidores do conflito e não às batalhas, mortes e mutilações de soldados, atos de bravura ou covardia verificados, cidades arrasadas pelos bombardeios etc.

Apesar de fazer parte de uma trilogia americana, 1919 se passa muito mais em terras européias do que americanas, claro, pois foi lá que se deu a guerra e a paz: foi para o velho continente que vários personagens americanos foram levados a viver suas vidas de um modo ou de outro, todos afetados pela decisão do então presidente Woodrow Wilson de entrar na guerra em 1917, tendo ele governado o país de 1913 a 1921. Alguns desses personagens já apareceram ou foram citados no volume um da trilogia (Paralelo 42), outros irão apenas se interrelacionar em 1919 ou nem isso. Uns tiveram final trágico, outros levaram a vida na Europa numa boa, como o jovem de uma abastada família, Richard Ellsworth Savage, que vai ter como amante Anne Elizabeth Trent, conhecida como Filhinha, a filha de um fazendeiro texano, ou ainda Eveline Hutchins, filha de um médico, que se alistou como voluntária da Cruz Vermelha em Paris e ali arrumou dois amantes...

Já os personagens reais são, além do próprio Woodrow Wilson, o futuro presidente Theodore Roosevelt, o jornalista John Reed (autor de Dez Dias que Abalaram o Mundo, sobre a Revolução Russa de 1917), Paxton Hibben, diplomata, J. P. Morgan, banqueiro, Joe Hill, anarquista etc., todos apresentados através de pequenas biografias. Mas são os personagens fictícios, não apenas os citados acima, aqueles que vão realmente prender a atenção do leitor (pelo menos foi o que se deu comigo), fazer a leitura de 1919 valer a pena, com suas histórias narradas por dos Passos geralmente em três episódios distribuídos ao longo do livro.

Dos Passos simpatizava com os ideais das esquerdas americanas de seu tempo, assim é que no episódio em que narra as atribulações de Ben Compton, jovem judeu que se envolve com o movimento sindical e vai amargar dez anos de prisão por conta das políticas repressivas do presidente Wilson, lemos trechos do Manifesto Comunista de Marx e Engels. Temos ainda outros personagens vindos dos sindicatos ou com atuação destacada neles, como também o olhar de compaixão de dos Passos para com os trabalhadores das classes menos abastadas da rica sociedade de seu país, que experimentava um grande desenvolvimento com os negócios da guerra, como sempre acontece (e isso faz o livro ter certa atualidade, não?). Curiosamente, alguns de seus personagens de origem humilde terminam mal, como o já citado Ben Compton e outros.

Outra história curiosa: talvez a melhor do volume para mim, a do marinheiro Joe Williams, termina de maneira insólita, depois de ele ter escapado com vida de outras situações bastante perigosas. E 1919 finda com o irônico texto O Corpo de Um Americano, um João Ninguém morto na guerra, ou como querem outros, o Soldado Desconhecido. Sempre homenageado por aqueles que costumam mandar os outros para a guerra, mas que nunca puseram os pés num campo de batalha. Na cerimônia citada por dos Passos para homenagear o desconhecido soldado americano morto, o presidente Woodrow Wilson teria levado um ramo de malmequeres...

Bem, apesar de Jean-Paul Sartre ter declarado uma vez que dos Passos era o melhor romancista do século XX – talvez pela novidade da formatação que ele deu aos volumes da trilogia USA –, superando em sua visão Hemingway, Faulkner, Steinbeck e Fitzgerald, parece que nem mesmo nos EUA ele recebe o amplo reconhecimento que os círculos literários e os leitores deram a esses quatro grandes autores, mantido até hoje, décadas depois de suas mortes. Mas pretendo ler algum dia o terceiro volume da trilogia USA, O Grande Capital (1936). É isso.

Relido entre 13 e 30 de setembro de 2023.

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Lista de Livros 12/05/2023

Lista de Livros: USA (02): 1919, de John dos Passos
“— Céus, eu bem que ia fazer um cara feliz se tivesse a chance – disse ela e caiu no choro.”
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“— Companheiros, isto não é nenhuma guerra. É um hospício.”
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“— Se você estivesse aqui uma semana atrás, Anne Elizabeth, teria visto uma verdadeira nevasca.
— Eu pensava que neve era como nos cartões de Natal disse Esther Wilson, uma garota de aparência interessante, com olhos negros e rosto comprido e uma voz grave que soava meio trágica. — Mas era apenas ilusão, como um monte de coisas.
— Nova York não é lugar para ilusões — disse Ada com aspereza.
— Tudo me parece mais ou menos uma ilusão — disse Filha, olhando para fora da janela do táxi.”
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Mario Miranda 24/06/2019

1919, segundo livro da Trilogia USA, mantém a lógica de John dos Passos de reconstruir a história recente norte-americana, nesta obra ao longo dos anos de 1910 (Paralelo 42 focaria especialmente nos anos de 1900). Como o próprio período abrangido sugere, o cenário da 1ª Guerra Mundial é o pano de fundo para todo o desenrolar da narrativa.
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Da mesma maneira que em Paralelo 42, 1919 não tem um personagem principal, mas sim uma narrativa que se baseia na história de 5 personagens, um narrador em primeira pessoa e recortes de jornais e notícias da época. O que pode parecer uma confusão, é um enriquecedor de toda a trama, que nos transporta diretamente para o local-tempo do que foi os Estados Unidos na década de 1910. Os personagens, sendo a maior parte deles relacionados com os que já aparecerem em Paralelo 42 como coadjuvantes - irmãos, amigos - são todos de alguma maneira relacionados a Guerra, seja como voluntários, como membros da Cruz Vermelha ou apenas como Revolucionários/Socialistas contrários a guerra (em um sentido, muito próximos a narrativa de Philip Roth em "A Pastoral Americana").
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Dos Passos, que foi um adepto do Socialismo no início de sua vida (tendo sofrido uma drástica mudança ideológica após a Guerra Civil Espanhola) nos traz um panorama completamente inovador de movimentos subversivos norte-americanos, com agremiações sindicais-socialistas tentando promover diversas modificações nas bases estado-unidenses. Em um dos personagens, inclusive, traz o impacto da Revolução Soviética e a expectativa que o mesmo se alastrasse para todo Ocidente - EUA inclusive.
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Desde 1980 existe o Prêmio John dos Passos, conferido pela Universidade de Longwood, atribuído anualmente ao melhor, ainda pouco reconhecido, escritor norte-americano.

site: https://www.instagram.com/marioacmiranda/?hl=pt-br
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Franco 29/07/2017

Drama existencial, conteúdo político
O livro já chama a atenção pela sua forma de escrita. Além da narrativa clássica em terceira pessoa, que é o grosso do livro, insere pequenos trechos de discursos midiáticos, além de uns confusos fluxos de consciência em primeira pessoa. Confesso que isso não me agradou muito, apesar de se encaixar perfeitamente no conjunto da obra.

Conjunto esse que é uma mistura de drama existencial e conteúdo político. Ao mesmo tempo em que o autor faz críticas ácidas à imaginada democracia norte-americana, traz até nós personagens capengas em seus sonhos, desejos e realizações.

Os personagens, que são vários dentro da história, são apaixonantes cada qual a sua maneira. Mas todos transpiram uma sensação de fracasso, honrando o pertencimento de Passos à chamada 'geração perdida'. E perdidos numa mistura de sexo, álcool e guerra, transitam por uma vida em busca de sentido, mesmo que esse sentido mude de um dia para o outro e nunca, nenhum deles, seja alcançado plenamente.

A leitura vale a pena, tanto para o leitor que busca um conteúdo mais histórico e politico, quanto para aquele que curte um drama existencial.
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Peterson Boll 19/06/2012

Uma corajosa estória sobre o pós-Grande Guerra nos EUA e o movimento sindical/comunista e a vigorosa e violenta repressão da chamada 'maior democracia do planeta'. Claro, o autor, um comunista de carterinha (que depois se desiludiu com o movimento graças ao Tio Stalin) abraça a causa com amor, mas mesmo assim, a obra é um relato de época, não um panfleto.
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