Lopes 09/08/2018
A matéria de valor
“Judeus sem dinheiro”, de Michael Gold, é sempre comentado como o primeiro grande romance/biografia sobre a questão judaica nos EUA no entreguerras. Caso não seja, ao menos alcançou o status de obra primordial deste assunto. Autores como Saul Bellow, Hannah Arendt e Phillip Roth conseguiram “dar sequência” a questão abordada por Gold. Na verdade esses relatos de sua infância formam um romance biográfico. Sua vida serviu de espelho para as contestações ao mostrar as verdadeiras conjunturas das vidas judaicas principalmente nos bairros de Nova York. São situações do menino Gold que universalizam os judeus - vítimas de perseguição em seus países e que viram nos EUA uma brecha para se livrar do terror - e suas condições, que nada mais são do que comuns, pobres, e muitas vezes miseráveis, como qualquer outro grupo integrante da sociedade global que se refugia. O que a princípio gera espanto na obra são as situações peculiares da visão de um menino judeu sobre a sociedade, o choque não existe, pois logo cedo Gold já se viu naquela sociedade, mas a nostalgia da vida não vivida é permeada no quase diário. Já o envolvimento terno do autor é que justifica a qualidade da obra. Percebe-se uma luta pela identidade, em que ela está em plena formação. A cultura herdada já é contaminada pela nova, conquistada nas ruas. E a transparência desta mistura é lida como um cortejo de espontaneidades que salvam e atraem o outro, como qualquer arte, quando descartamos algumas características para adentrar ao personagem apresentado. São fatos narrados em primeira pessoa que denunciam a mulher e o homem em suas crises humanas, transpondo a criação de rompantes diante da necessidade de quebrar preconceitos, de linguagem e social. Literatura aqui é memória e possibilidade de criar sentimentos que nos aproxime daquele momento, e Michael Gold destacou-se como um dos primeiros nessa arte dentro deste tema de forma precisa e intensa, sem desqualificar o lugar que o recebeu, mas entendendo que lugar é o que estamos, e não necessariamente o que nascemos.