mari 06/01/2021
behind the headlines
Esse livro foi recomendação da minha professora de Sociologia, Magda, que tem um grande repertório de livros que te fazem sair da zona de conforto. Ouso dizer que ao mesmo tempo que a maior parte do que tá escrito aqui é óbvio, entender como funciona a mídia é um verdadeiro soco no estômago. Oscar Wilde disse: “Antigamente os homens tinham a tortura. Hoje eles têm a imprensa”. É sobre o papel desempenhado pela imprensa ao longo dos séculos que Ryan Holiday vai falar sobre esse livro.
Fazendo um paralelo com o Brasil, ao longo da história desse país conseguimos perceber como as mentiras, repetidas inúmeras vezes, se tornam verdade. A Revolta da Vacina no Rio que começou por boatos acerca da vacina antivariólica; a ameaça comunista criada por Getúlio Vargas e depois reproduzida pelos militares em 1964; basicamente toda a campanha do Collor... são apenas exemplos históricos de momentos em que a mentira se tornou verdade. Entrando na contemporaneidade, temos o Governo Jair Bolsonaro fundamentado em mentiras e invenções. Como poderia Bolsonaro, com suas acusações de corrupção, doutrinação nos Institutos e Universidades, alinhamento com a violência, discriminação e preconceito, estar errado quando ele falava exatamente o que a massa brasileira queria ouvir? Existe uma charge na língua espanhola que o personagem sintetiza exatamente isso ao dizer: “¿Cómo va a ser falsa si dice justo lo que yo pienso?”.
Entretanto, há um personagem fundamental nessa história que estava presente durante a Revolta, durante o mandato de Getúlio e Collor, e está mais que presente durante o Governo Bolsonaro, competindo por manchetes e furos diariamente: o jornalismo brasileiro. Jair pode dizer que foi eleito graças a mídia brasileira, que hoje tanto o odeia. As manchetes, as entrevistas, o espaço que a ele foi cedido foi sagrado para que sua catastrófica campanha fosse desenvolvida. O palco estava armado, o palhaço tinha todos os holofotes e os que concordavam com quem comandava o show foram seguindo-o. E é sobre isso que o Ryan Holiday fala em “Acredite, estou mentindo”.
A credibilidade do jornalismo no Brasil está tão baixa que notícias compartilhadas em redes sociais se tornam mais verídicas que as publicadas nos maiores jornais do país. Porém, esse fato não é algo exclusivo dessa terra tropical, como apontado pelo Holiday. O livro foi escrito em 2012, quando a Internet já caminhava para ser como hoje em dia. O autor foca bastante nos blogs e sites, e como eles influenciam em diversos aspectos da vida estadunidense ao longo dos anos. Eleições, celebridades, religião, divulgação de filmes... tudo vira pauta para esses sites que lucram ao compartilhar essas histórias. Ryan aponta a maneira como os blogs distorcem a realidade e como destroem tudo em busca de uma notícia desconhecida e polêmica. “O mundo incessante e instantâneo do jornalismo iterativo é antitético a como o cérebro humano funciona. [...] O jornalismo iterativo coloca empresas e pessoas em uma posição impossível: manifestar-se a respeito de um artigo só faz validar a história original – não importa o quão incorreta esteja – e ficar em silêncio deixando a história como foi escrita significa que a notícia não é realmente iterativa.” A ciência prova que o ser humano tem extrema dificuldade em se corrigir quando está errado, e é sobre isso que o autor comenta na citação acima. A mídia atua camuflando a verdade quando nota que está errada.
Acho que de maneira geral, em 2021, as coisas não são tão diferentes de como eram em 2012. Se é preciso fazer campanha contra Fake News, assegurar credibilidade a uma notícia e promover avisos de “Quer ler o artigo primeiro?” antes de retuitar alguma notícia então não estamos muito avançados do que a nove anos atrás. A diferença clara é como a notícia se tornou algo instantâneo e criou mais espaço para o desenvolvimento de mentiras. Os blogs estão ultrapassados, os sites ainda resistem embora você consiga achar qualquer informação no feed do Instagram, numa thread do Twitter ou até mesmo em um vídeo de 60s no Tik Tok.
Enfim, é um livro aterrorizante e claro ao mesmo tempo. Tudo exposto desse jeito abre espaço para comparações internas e que acontecem até hoje. Embora tenha muita redundância, o autor passa sua mensagem muito bem. “A mídia e o público deveriam estar do mesmo lado. A mídia, quando funciona adequadamente, protege o público contra marqueteiros e suas tentativas incessantes de enganar as pessoas.”