Valério 25/08/2016
Primoroso
Considero favoritos apenas em torno de 10% dos livros que leio. Mesmo dando preferência aos grandes clássicos aclamados mundial e historicamente.
Assim, acredito destacar os destaques entre os destaques.
E é isso que torna tão difícil demonstrar a grandiosidade de "As afinidades eletivas".
Goethe não apenas descreve um carregado drama com cores sinistras e comoventes. Tempera o livro com insights e observações da natureza humana com a destreza que lhe é peculiar (já bem demonstrado em "Fausto" e "Os sofrimentos do jovem Werther").
A tragédia, e sua atratividade indiscutível nos seres humanos está presente.
Mas, até a última linha, torcemos pelo bom desenlace.
Entretanto, durante a leitura, me vi dividido entre sentimentos contrapostos.
Semelhante ao que ocorre em nossa vida, valores antagônicos colidem: virtude, necessidade, costumes, moral, destino, fé.
Um livro que foi considerado à frente de seu tempo. E que acredito ainda estar à frente do nosso tempo.
A percepção de Goethe da índole de nossa espécie, a sutileza ao descrever o que nos move e muitas vezes mal nos damos conta, é surpreendente.
Em determinado trecho (página 46), há uma brilhante metáfora entre o que acontece nas relações amorosas e em alterações químicas na estrutura da cal, gerando as chamadas "afinidades eletivas", título do livro. A partir daí, segue-se uma discussão que discorre quanto à motivação no desfazimento e criação de relações: Necessidade? Vontade? Destino? Inevitabilidade? Ou apenas um fenômeno ocasional?
Alguns breves trechos dignos de nota:
"A conduta é um espelho no qual cada um reflete a sua imagem"
"Ninguém é mais escravo do que aquele que se considera livre sem sê-lo"
"Enquanto a vida nos arrasta, acreditamos estar agindo por nós mesmos, escolhendo nossas ocupações e divertimentos, mas, na verdade, se olharmos bem, estamos sendo obrigados apenas a seguir os planos e as tendências da época". Tão verdade. Fazemos realmente o que queremos, o que planejamos e como planejamos? Planejamos mesmo estar onde estamos, ou foi tudo decorrência de uma série de eventos autônomos, permeados por uma ou outra ação de nossa iniciativa, apenas para nos moldarmos às circunstâncias e oportunidades que se apresentaram?
O que estamos buscando? Será que buscamos algo, ou só vivemos um dia após o outro? Seria a vida mesmo apenas nascer crescer, procriar e morrer?
Há ainda diversos trechos relevantes que, se fosse transcrevê-los todos, talvez reproduziria o livro.
Recomendo com afinco a leitura. Pois, além de todo o conteúdo filosófico, há também uma história linda, trágica e bela como substância elementar.
Que você também possa se emocionar e elevar seu espírito com este forte livro.