CG! 31/05/2024
O coração do tolo
“E você, meu amigo galvanizado, você quer um coração. Você não sabe o quão sortudo és por não ter um.”
Escrito em 1900 e adaptado para o cinema em 1939, com pretensões de uma proposta infantil, O Mágico de Oz foi muito além disso. Suscitou a curiosidade literária em uma escrita que atravessou o século; provocou o cinema em um clássico marcante com Judy Garland, e que no campo da música ainda gera discussões sobre sua curiosa sincronia com o álbum The Dark Side of the Moon.
Em uma narrativa de simplicidade infantil, mas longe de ser ingênua, a menina Dorothy é levada do interior do Kansas a uma jornada de fantasia que em algum ponto lembra as digressões de Alice (Lewis Caroll), mas que guarda a particularidade de fazer todo o sentido às crianças adultas.
A jornada é conduzida por ela e seu três raros amigos na busca daquele que teria o poder de suprir os defeitos que faziam cada um deles serem quem são; uma força poderosa de um homem oculto em um lugar não muito distante. O mágico que poderia dar um coração ao homem-de-lata, fazer do leão um ser corajoso, e dar o poder de reflexão ao espantalho.
Alinhando a necessidade da bravura, da inteligência e da capacidade de sentir, Dorothy é a guia que aos poucos vai compreendendo seu papel na construção de cada um deles, em um caminhar de sentido que aos poucos afasta O Mágico de Oz de ser apenas um livro infantil.
Ao final, aquilo que se cria como o máximo da capacidade que pudesse resolver os problemas de todos eles não passa de um vazio. A longa jornada construída sob os fundamentos de uma percepção de pura esperança não era mais do que isso: uma esperança.
Mas nem isso - essa falta de verdade - acaba por significar que aquela crença não deveria ser tomada como verdadeira durante o caminho. A estrada das pedras amarelas era – e deveria – ser assim composta, a partir de uma mentira, para que só então pudesse Dorothy perceber que não há lugar como o seu lar. Talvez a ensinar, na fábula, que alguns pontos de vista somente se revelam depois de atravessado todo o caminho pedregoso. Simples, porém conclusivo e real. Um livro infantil para crianças adultas.
“- Ainda assim - disse o Espantalho -, quero um cérebro em vez de um coração; porque um tolo não saberia o que fazer com um coração se tivesse um.
- Fico com o coração - respondeu o Homem de Lata. - Porque cérebro não faz ninguém feliz, e a felicidade é a melhor coisa do mundo.”