Thaís 07/08/2015
O livro “Te pego lá fora”, escrito por Rodrigo Ciríaco, descreve através de contos as vivências ocorridas em escolas da rede pública de ensino na atualidade, abarcando histórias que retratam o ambiente escolar como um todo, ou seja, o dia-a-dia de alunos, funcionários e professores. O autor divide seu livro de forma criativa por estações do ano, respectivamente verão, outono, inverno e primavera.
No capítulo um o verão, encontram-se as histórias mais pesadas, discutindo assuntos polêmicos que são recorrentes em uma escola, como alunos ligados ao tráfico de drogas, casos de abuso sexual, a importância para os jovens serem aceitos em um grupo e etc. Entre os contos desse capítulo um merece destaque o “Miolo Mole Frito”, no qual, Ciríaco relata uma redação de uma aluna que desejava matar seu padrasto, pois estava cansada de ser violentada. No final da narração, diz ao professor que quando terminar de ler seu texto, tudo estará resolvido, o padrasto já estará morto e ela bem longe. A aluna aborda seu desejo no trecho a seguir:
Meu sonho é matar meu padrasto. Essa noite eu consigo. Vou ferver óleo de madrugada e jogar dentro do seu ouvido. Enquanto ele estiver com o sono pesado, dormindo que nem um menino. Não será para ele não sofrer, não, eu quero que ele sofra. Muito. Mas tem que ser na trairagem pra ele não me machucar mais, não mexer mais comigo. Nem com a minha irmã. (CIRÍACO, pag. 25).
Ao decorrer do outono, serão abordados temas envolvendo gravidez na adolescência, a fábula de um rato observando as injustiças recorrentes no cotidiano escolar, alguns contos como “Sóca para dentro” retratam a desvalorização do profissional educador, em seu espaço de trabalho. Entretanto, a desvalorização esta em todos os âmbitos, como no caso do conto “papo reto”, no qual comicamente o autor retrata a vida de muitos profissionais que não conseguem se dedicar a escola, pois o salário é tão baixo que precisam de mais de um emprego para se sustentar. E o âmbito de guerra que a escola se encontra, em que por interesses “maiores” (políticos), muitos alunos saem da escola sem saber ler ou escrever, o educador que luta para mudar essa situação, muitas vezes é massacrado pela estrutura já corrompida, em que o certo é reproduzir e não produzir educação.
Por outro lado, no capitulo inverno, mostra que a escola é um espelho da sociedade inserida, é um espaço que o professor vai encontrar vários preconceitos, como o retratado no conto “O livro negro”, um aluno é machista com uma menina e sofre racismo, mas a própria estrutura escolar é racista, pois como se chama o livro que se registra as coisas “erradas” que os alunos fazem? Livro negro. Em “obituário”, a história é narrada por um professor que se suicidou cansado do sistema, em que muitos têm que morar na rua, ser humilhados pedindo esmola por não conseguir um emprego, o professor desistiu desse mundo desigual, repleto de desumanidades.
O capítulo primavera, é um renascer, mostra que o autor ainda acredita que é possível mudar essa estrutura social. Como nos contos “Poeta” e “Literatura (é) Possível”, mostra que os alunos são capazes, mesmo com tanto descaso com o ensino público, eles são bons, e os professores que ainda não desistiram é por causa dos alunos, enxergam que ainda é possível fazer um bom trabalho mesmo com a desvalorização, uma frase que expressa tudo isso: “E o que antes eram feras viraram rosas – com espinhos – capazes de exalar um perfume de revolta, amor, palavras e carinhos que olhando nos meus olhos dizem: não só a literatura é possível, professor, Nóis também”. O ultimo conto “Nós, os que ficamos”, expressa que desistir não é a solução, apesar de todas as dificuldades que os educadores encontram para exercer sua profissão, como os exemplos retratados acima, é sim possível transformar essa realidade, será uma luta difícil e duradoura, mas é possível.
Por fim, esse livro faz refletir de forma dramática e ao mesmo tempo cômica, como é importante haver uma reestruturação no ensino público brasileiro, o sistema escolar que esta em vigor atualmente não pode continuar, com os alunos “passando de ano” sem saber ler ou escrever, essa luta vai ser árdua, mas no final tudo dará certo.