Pedro Bastos 25/07/2013Intimista, cúmplice e esclarecedor A leitura de "A memória da pedra" me deixou intrigado do início ao fim por uma série de razões. Positivamente, acrescento. A primeira das razões é a sofisticada narrativa de Mauricio Lyrio, que me deixou em um estado de alucinação de tão boa que é. Apontado como "iniciante" pela mídia em geral, o leitor que comprou "A memória da pedra" está na expectativa de ler um romance considerado entusiasta, mas de "estreante". Ponho entre aspas pois esta conotação sempre transmite uma ideia de que os "iniciantes" têm qualidade inferior ao que se aprecia, como se houvesse um padrão de escrita e criação literária a ser seguido. Eu, pelo menos, acredito que cada escritor tem suas particularidades e que a qualidade de seus textos aumenta não a medida que se vai alcançando o tal "padrão", mas sim que vão evoluindo em função do seu amadurecimento artístico e pessoal. Assim sendo, todos são apreciáveis e, portanto, qualificados.
Diante deste meu contexto, Mauricio Lyrio surpreende por ser um "estreante" que já sai mandando muito bem em seu primeiro romance, em todos os aspectos. Não é preciso ser um grande especialista em literatura - ou um leitor dedicado - para perceber que a prosa do escritor e diplomata tem uma deliciosa cadência que foge aos padrões "certinhos" das narrativas. Muitos autores utilizam informações sugestivas para conduzir seus romances; Lyrio vai além das "sugestões". Sua narrativa insere o leitor no mix de sentimentos e de subjetividades de cada um dos numerosos personagens, fazendo com que os que giram ao redor do protagonista Eduardo também tenham papéis importantes ao longo da estória. A exploração de suas subjetividades é um ponto muito alto de "A memória da pedra" - promove uma intimidade e cumplicidade do leitor com a trama.
Além de adentrar o mais íntimo dos sentimentos dos personagens, a narrativa é, definitivamente, quem conduz o leitor ao entendimento de tudo. Não me deixei preocupar em compreender as recorrentes metáforas e a inserção de contextos não-anunciados ou explicados; leia e permita que as frases te levem aonde elas querem te levar. O "não-entender", ao meu ver, pareceu ser parte da composição, uma maneira de proporcionar essa imersão no mundo particular dos personagens e de seus ambientes sob uma perspectiva bastante humana, desprovida de qualquer perfeição ou neutralidade para se explicar/entender algo.
Quanto aos personagens, Lyrio explora o mundo daquele estereótipo do intelectual-esquerdista-mas-que-mora-na-parte-rica-da-cidade. Isso se percebe nos dilemas de vida, o conteúdo das conversas entre amigos, os ambientes pelos quais circulam. No entanto, o autor não se aproveita das contradições dos atos e dos discursos comumente encontrados por aí, especialmente nos profissionais do âmbito acadêmico, para moldar seu romance, mas sim na fragilidade emocional que essa "carcaça" muitas das vezes esconde. Deste modo, "A memória da pedra", além da narrativa fantástica, tornou-se uma eletrizante leitura por assinalar que o esclarecimento nem sempre é tão clarificado assim: a ignorância é mais companheira do que se pensa.