Marselle Urman 31/08/2016
Camadas
On "House of Leaves"
Apesar de ter sempre encontrado recomendações efusivas sobre esse livro, consegui começar a lê-lo do jeito que gosto : Sem saber absolutamente nada sobre a estória. Tive que apelar pra loja gringa da Amazon porque o livro não é encontrado em terras tupiniquins - e, dada sua estrutura e público restrito, não acredito que um dia venha a ser traduzido e publicado por aqui.
Comecemos.
Os avisos pra o leitor abandoná-lo são abundantes no começo da narrativa. Começando com : "this is not for you". Truque bom, claro que isso só instiga mais. Comecei a ler, e no princípio quase o abandonei. Geralmente só abandono livros (sofrendo) quando não encontro sentido, fico patinando, e o começo desse livro é chato. Eu ia dizer complicado também, mas complicado ele é inteiro.
Todavia, depois do capítulo sobre o "Echo" as coisas começam a ficar interessantes.
Pra mim, resenha não é sinopse, mas aqui cabem umas palavrinhas. Todo livro é como uma caixinha fechada. Uma caixinha que o autor te dá, e lá dentro tem um pequeno mundo. Bom um ruim, goste você do livro ou não, acho que a metáfora prevalece. Nesse romance, temos uma boneca russa, uma Matrioska. Uma estória dentro de outra dentro de outra. O estilo narrativo me lembrou o 2666 de Roberto Bolaño ( que gostei muito).
É difícil "descascar essa cebola", mas vou fazer uma tentativa. Imagine que você, por acaso, se depare com laudas e mais laudas de papel, deixadas por um desconhecido, e comece a ler. É um texto intenso e detalhista, o trabalho de uma vida talvez, eu diria até que uma tese de mestrado, e fala sobre um filme. Um filme muito intrigante sobre algo impossível ( A Bruxa de Blair, talvez), também gravado em primeira pessoa sempre, por narradores diferentes envolvidos na mesma situação. E totalmente impossível. Aparentemente é uma obra épica, pois existem ( de acordo com seus papéis) centenas de estudos, livros, reportagens e análises sobre esse dito "filme", inclusive feitos por gente famosa. Mas, não importa o quanto você busque, não consegue encontrar nenhuma referência a que algo do tipo tenha existido em nosso mundo ( o filme).
Você começa a organizar esses papéis na forma de um livro, a ser enviado pra uma editora...e essa leitura acaba com a sua vida.
Um parêntese : se alguém prestar atenção em você, enquanto lê esse livro, pensará que é louco. Várias vezes você virará o livro de um lado, de outro, lerá contra um espelho e de ponta-cabeça até não saber mais pra que lado virar a próxima página (isso aconteceu comigo)...coisa que ocorre pra dar a você, leitor, uma vaga idéia do quanto se pode se sentir perdido e desnorteado como acontece na casa.
Que casa, como assim?!?
Aquela do título, a casa das folhas.
São usados muitos recursos, os que o papel permite, pra imergir o leitor na estória. É a estória de Navidson & cia. Ltda, pesquisada e narrada por Zampanò (pessoa intrigante), compilada e anotada por Johnny Truant (fracassado escroto) e trazida pra nós por Mark Z. Danielewski ( sobre quem nada sei).
E é uma estória muito interessante.
Repito : não se engane, não é uma leitura fácil.
Agora, analisando friamente enquanto leitora experiente de romances de terror, não é nada assim tão fantástico. Tirando todas essas camadas de marketing e envolvimento sensorial que remete quase à poesia concreta, o "core", o núcleo dessa estória já não é original.
Se bater no liquidificador o "Rose Red" do Stephen King com o"The Deep " do Nick Cutter, você tem essa estória.( Maravilhoso esse último, não canso de rasgar seda pra ele).
Vale a pena ler?
Vale.
Mas não é "tudo isso".
SP, 31 de agosto de 2016