Tauana Mariana 28/09/2013
Para ler o Pato Donald
Pode até parecer paranoia ou exagero de teórico que vê submissão, opressão e alienação em tudo. Mas acredito que, apesar de forte e com uma acidez crítica incrível, o livro tem sim, fundamento.
Estudando sobre o Getúlio Vargas, cheguei à história do Zé Carioca, e consequentemente, à história da Disney. Me fascinei pelo assunto, mas, infelizmente, nunca o pesquisei ou utilizei minha curiosidade nesse contexto para um viés acadêmico. Assim, estudo e leio sobre a Disney "apenasmente" por curiosidade.
Eis que lendo sobre o Zé, cheguei ao livro O imperialismo sedutor, de Antônio Pedro Tota. O livro fala sobre a "americanização" do Brasil depois da Segunda Guerra Mundial, e obviamente, essa "americanização" estava estreitamente relacionada à Disney. O Brasil encanta-se então com um pato que não usa calças e um rato que usa luvas.
Interessada no assunto, adquiri o Para ler o Pato Donald, livro indicado por Tota e citado por grande parte dos pesquisadores do tema. O livro é curtinho, tem 162 páginas, mas o conteúdo é denso e de difícil digestão.
Os autores realizam uma densa e complexa análise sobre o conteúdo das tirinhas Disney em um determinado período. Na obra, você percebe, por exemplo, que no mundo Disney existem poucos "pais" e "mães", já tios e sobrinhos são a maioria. O tio, desta forma, é um parente próximo mas que não tem obrigações financeiras e morais com os pequenos. Não é o responsável por sua educação, e por isso, pode eximir-se de uma conduta exemplar (entre outros motivos).
Nas histórietas, os autores também destacam que, para a mulher só resta a panela. Ou a panela para fazer a comida da família, ou o caldeirão, para as feitiçarias. Deste modo, a mulher se restringe à donzela dona de casa ou a bruxa má e perversa.
Compreendemos também que um grande número de histórias é relacionada à conquista do ouro. Os personagens de Disney estão sempre atrás de ouro, tesouros e riquezas fáceis. O ouro (e o dinheiro), são recompensas para os astutos e espertos, e não para os trabalhadores. Nesse aspecto, a obra chama a atenção para o excessivo consumo apresentado nas histórias. Os personagens estão sempre de folga, ou viajando, e ainda assim demonstram poder aquisitivo. Até o Pato Donald, que não quer trabalhar e sempre busca empregos fáceis e que não exijam esforços, trabalha apenas para pagar "a última parcela da televisão", aliás, as parcelas não acabam nunca. Para os autores, Donald seria um "parasita" do sistema econômico.
O essencial do livro, no entanto, é como as histórias de Disney refletem um sistema de dominação e submissão social entre EUA e América Latina, especialmente o Chile. Referindo-se à Donald, Mattelart e Dorfman afirmam: "enquanto a sua cara risonha deambula inocentemente pelas ruas de nosso país, enquanto Donald for poder e representação coletiva, o imperialismo e a burguesia poderão dormir tranquilos" (pp. 161-162).
Obviamente, está resenha não faz jus ao conteúdo, muito menos à complexidade da questão apresentada pelos autores. Por isso, sugiro que, aqueles que se interessaram ou não entenderam ou discordam do assunto, leiam o livro. Vale a pena. :D