Lys Coimbra 28/10/2015Tão intenso quanto Nietzsche pode serEm "o caso Wagner - um problema para músicos" e "Nietzsche e Wagner - dossiê de um psicólogo" este ilustre filósofo rabugento tenta demonstrar, de maneira contundente, que Wagner é músico frívolo e decadente, que agrada somente os pobres de espírito e as almas exaustas e superficiais.
Em várias passagens Nietzsche sustenta que o estilo wagneriano é uma grande corrupção para a música, uma doença da qual ele próprio foi acometido e posteriormente curado, e arremata dizendo que "a própria doença pode ser um estimulante da vida: mas é preciso ser sadio o bastante para esse estimulante!".
Ao atravessar o abismo dos gostos duvidosos e se ver "curado" do que considera uma neurose, ele acredita pagar um alto preço por isso, e afirma que "não se é impunemente o espírito mais profundo de todos os milênios - mas também não sem recompensa". Isso porque todos aqueles que conseguem "cruzar o abismo" passam a ser mais suscetíveis e a ter um gosto mais sutil e refinado para todas as coisas boas da vida, mas, em contrapartida, mais difíceis de satisfazer. Ele afirma que "nós, porém, que dos livros e da música exigimos sobretudo substância, estamos mal servidos em mesas apenas 'representadas', e nos vemos em situação pior".
Nietzsche defende seus argumentos com paixão e contundência e em cada página eu era capaz de imaginar aquele imenso bigode mal humorado tentando me convencer da mediocridade e do veneno destilado pela música de Wagner.
As notas de rodapé desta edição foram essenciais para nortear algumas passagens da obra, que por vezes se mostrou complexa, considerando a vasta cultura do filósofo.
A entrevista com C. P. Janz, autor da biografia mais consagrada de Friedrich Nietzsche, trazida ao final do livro, também foi bastante esclarecedora sobre os vários aspectos que o incentivaram a escrever "o caso Wagner" e sobre os possíveis motivos para o desprezo que dedicado ao compositor.
O livro é curto, mas bastante intenso e cheio de referências a várias obras clássicas de várias naturezas e repleto de "pérolas filosóficas" que nos levam a refletir sobre a vida e suas várias nuances.
Por fim, encontrei, dentre as milhares de frases profundas e cheias de substância, uma citação que me parece definir esse filósofo irascível e seu jeitinho todo peculiar de filosofar: "Há espíritos livres e insolentes, que gostariam de negar e ocultar que no fundo são corações destroçados, incuráveis".