Julia G 19/08/2011Perseguição Digital - Loraine PivattoResenha publicada originalmente no blog http://conjuntodaobra.blogspot.com
"Joana lembrava de todos os detalhes e palavras ditas naquela noite. Lembrava de todas as vírgulas, olhares e suspiros.
'Joana, tente aceitar. O nosso amor acabou. Não há mais sintonia entre nós. Eu não me sinto feliz, preciso de uma nova vida, conhecer outras pessoas, sinto-me sufocado ao seu lado.'
Como posso aceitar isso? Como acabou? Para mim nada acabou. Tudo continua no mesmo lugar de sempre, meu sentimento por ele é o mesmo, ou melhor, é a cada dia maior, é tão grande que quase nem cabe dentro de mim. Como ele pôde falar do nosso amor assim, com tanto descaso, como se fosse um sapato velho que você usa até furar a sola e depois joga no lixo, vai na loja e compra outro?" (Pág. 15)
Fazia três meses que Joana viu Fernando sair pela porta de casa. Ele a havia abandonado sem o menor remorso, sem nenhuma satisfação. E, para ela, aquilo não fazia nenhum sentido, já que até então tudo parecia tão bem entre eles... E o tempo não parecia estar curando tudo, como dizem.
Quem nunca sofreu por amor? Há uma fórmula para superar isso? E se você não quiser exatamente superar?
Joana encontrou sua fórmula. Por meios nem tão lícitos ou éticos, ela encontrou uma forma de estar perto de seu amor. Seria mesmo tão errado olhar - e apagar - recados da caixa postal? Ler o e-mail de Fernando e, às vezes - por que não? - responder por ele? Ela só queria entender por que ele estava agindo daquela forma, por que não dizia ao menos o que aconteceu para mudar tanto.
A perseguição silenciosa não era, entretanto, tão benéfica para Joana. Saber cada detalhe do dia-a-dia do homem que amava, inclusive aqueles que mulher nenhuma gostaria de saber, a fazia sofrer cada vez mais. Mas era impossível deixar de perceber o amor e o desejo no olhar de Fernando cada vez que se encontravam. E, entre tudo, isso era o que mais a deixava confusa.
Desde que li a sinopse do livro, me encantei pela história. Era realmente uma trama bem diferente de tudo que eu já tinha lido, e minha curiosidade ficou aguçadíssima. Mesmo assim, fiquei muito surpresa - de forma positiva, claro - quando me vi completamente absorvida e presa pelo livro. Não significa que tenha me identificado pelos personagens, mas os compreendi, e isso foi mais que o suficiente.
No início do livro, Joana se sente vazia. Mesmo após três meses sozinha, não é menor a falta que sente de Fernando. Cada respiração sem ele parece um tormento sem fim, e isso vai fazendo com que ela perca qualquer noção de realidade. Eu a definiria, neste momento, como surtada, o que percebi logo na primeira cena. E toda essa tristeza acabou com qualquer resquício que poderia ter de amor próprio. Joana implorava por Fernando a cada encontro, e só não digo que se humilhava pois ele acabava correspondendo.
Mesmo com suas atitudes singulares, foi impossível não imergir na montanha russa emocional de Joana. Chorei e ri com ela, amei e odiei. Não concordava com o fato de ela correr tanto atrás do Fernando, ou ainda de não se importar com os erros que ele cometeu, querendo apenas tê-lo ao seu lado. Sentia que ela estava se anulando, independente das razões que tinha para achar que ele ainda a amava. Percebi como é tênue a linha entre determinação e obsessão, e a personagem ora estava de um lado, ora de outro.
Eu odiei e amei Fernando. Não há como explicar isso, mas é mais ou menos como amar alguém que nos faz sofrer. Gostei muito também do fato de ter sido abordado o tema adoção, principalmente quando se refere a crianças mais crescidas.
A linguagem utilizada por Loraine não tem nada de sofisticada e é, por vezes, até mesmo coloquial, o que não reduziu em nada a riqueza do texto. Apesar de ter lido algumas críticas nas resenhas do skoob, eu gostei muito do fato de a autora intercalar as narrações em primeira e terceira pessoa. Essa ferramenta nos permite visualizar o que todos os personagens pensam de suas vivências, mesmo que a narrativa tenha Joana como foco principal. Outro ponto que me agradou foram os títulos dos capítulos, que brincam com os ditados populares os inserindo em perspectivas da informática.