gleicepcouto 11/06/2014Flash Forward (Galera Record), do canadense Robert J. Sawyer, foi uma surpresa em vários aspectos. Todas positivas.
Primeiro que quando fui pesquisar sobre o autor, fiquei chocada por nunca ter ouvido falar dele. O cara tem dezenas de livros publicados, é conhecido na área de ficção científica e já ganhou prêmios importantes como o Prêmio Hugo, o Prêmio Aurora (dois dos mais prestigiados prêmios de ficção científica) e o Prêmio Nebula (curiosidade: o primeiro Nebula foi para Duna, de Frank Herbet, em 1965 - e uma das minhas próximas leituras), além de finalista de outros. Ah, também nem tinha ideia que Flash Forward tinha virado série pela ABC, com Joseph Fiennes, mas só durou uma temporada.
Segundo que eu esperava algo completamente diferente. Por ser um livro da Galera Record, pensava que estava diante de um livro mais ação, e menos introspecção. Uma história com muitas aventuras e reviravoltas, mas cheia de vigor físico; e não uma reflexão sobre livre-arbítrio, física e destino. A ação existe, mas os debates filosóficos são muito mais expressivos. Mas calma, nada monótono. Realmente as discussões são interessantes e levadas a um nível relevante de exploração sobre a natureza humana.
"- Vi você na CNN quando eu estava em Tóquio. Você realmente acredita que nós não temos livre-arbítrio?
Lloyd ficou surpreso.
- (...) Sim, realmente acho que o futuro é tão fixo quanto o passado. E, com certeza, o Flashforward sustenta isso: se o futuro não fosse fixo, como poderíamos todos ter visões de um futuro coerente? (...) Na verdade, não seria impossível que todos tivessem visões?"
Sawyer conduz bem a sua história. Ele sabe balancear conhecimento e acontecimento. Então, quando o leitor pode estar começando a piscar mais lentamente, ele dá uma pausa na quantidade de informação passada e parte pra ação. Percebemos isso claramente nas suas personagens principais. Theo é a parte "movimento" do livro, enquanto que Lloyd, a "reflexiva". Claro que essas características se alternam ao longo da leitura e não morrem em si mesmas.
As personagens são bem elaboradas e com motivações cruciais. Os dilemas que têm que encarar como consequência do flashforward são os mais variados: culpa, morte, separação e outros. Tudo isso por apenas terem visto 137 segundos de seu futuro.
É interessante perceber como o futuro pode interferir no presente. É como se, sabendo o futuro, não exista mais presente, pois você vive em função daquele. Se viu algo bacana, como garantir que seu futuro continue o mesmo? E se vislumbrou algo ruim, o que fazer para se evitar que se concretize? Somos donos de nosso destino? Aliás, destino existe? E o livre-arbítrio entra aonde? Essas e outras questões são embasadas ao longo de diálogos ágeis, coerentes e bem escritos.
Nem tudo, porém, fica só na conversa. A busca de Theo por respostas para o seu futuro é ativa e, próximo ao final, angustiante. Sawyer colocou as manguinhas de fora e escreveu uma cena de dar taquicardia até em pessoas com boa saúde.
Como dito antes, Flash Forward não é tanto o que espero de livros da Galera (acho que tem mais a ver com a Record), e talvez, por isso, as pessoas não tenham curtido muito, já que Galera e Record são voltados para públicos distintos. Acredito, porém, que livro bom pode ultrapassar a barreira de target, de gênero e de todo o restante. Dessa forma, mesmo que ficção científica ou os tipos de questionamentos encontrados no livro não façam a sua cabeça, vale a pena conferir Flash Forward. Antes de tudo é um livro bem desenvolvido e que tem muito a dizer.
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