Brenda @caminhanteliterario 14/06/2024Das distopias/utopias clássicas que eu li, essa foi a que menos me empolgou. Todas as ideias apresentadas na história são excepicionais, e as proposições de reflexão muito interessantes. No entanto, o livro meu pareceu um recorte de três arcos diferentes que não se amarram de forma coesa, e principalmente sinto falta de personagens mais aprofundados. O texto parece muito seco, sei lá.
O material de apoio diz que o livro surgiu a partir de um conto que foi escrito antes do homem conseguir conhecer o espaço. É meio bizarro pensar que nessa época o céu parecia um novo mundo a ser explorado e o quanto isso permitia imaginar que o impossível poderia habitar logo ali. O trama inicialmente se sustenta em cima de quem são os Senhores Supremos que estão invadindo o planeta. E essa primeira parte me deixou bastante intrigada e curiosa.
Além disso, eu adoro a ideia de utopia, mais do que a de distopias. O conceito por trás de como toda a perfeição traria monotonia e apatia me ganha demais. Ainda sim, uma utopia imposta a força pro um ser superior acaba se confundindo com uma distopia. Contudo, tirando a Liga da Liberdade do inicio da história, os seres humanos parecem se adaptar bem a essa paz imposta e isso me incomoda um pouco. O homem inatamente adora o poder e não se submeteria tão facilmente ao dominio mesmo que benéfico. Ou pelo menos, na incapacidade de lidar com seres tão superiores, não os idolatraria, como é o que parece acontecer no livro.
Devo admitir que os Senhore Supremos se assemelharem ao diabo foi o ponto alto do enredo. Genial demais. O tempo todo me perguntei que aparencia chocaria tanto o ser humano, e a resposta é uma que ele já teria pré-concebida como a encarnação do mal. E é muito curioso ver como os eles usam a estratégia de minar esse preconceito ao longo do tempo pra gradativamente ser tornarem tão natural a realidade daquela população.
Por outro lado, o sequestro do Stormgreen, permitido pelos senhores supremos, deixa claro que eles enxergam a raça humana como um meio para um fim. E isso fica ainda mais evidente quando eles se comparam a Inglaterra enquanto os terrestres seriam a India. É a partir do momento que eles se revelam que o foco do livro se torna descobrir quais são seus reais objetivos ali.
O irônico é que inicialmente o Senhores Supremos são quase como que colocados no mesmo papel de Deus. São onipresentes, onicientes e onipotentes, definindo o futuro da humanidade a sua maneira, mesmo que de forma pacífica. Já ao final do livro a percepção que eu tenho é que eles são mesmo a representação do diabo que levou fim da humanidade, ou seja, ao apocalipse, mas sem nunca poder alcançar de fato o paraíso (não podendo evoluir). Nesse caso a Mente Suprema seria a real analogia pra Deus. È curioso perceber que as vezes colocamos alguem no papel de “deus/dono de nossas vidas” simplesmente porque possuem mais conhecimento ou mais poder, sem nunca paramos pra pensar que mesmo esse indivíduo pode ser submisso a algo superior.
No entanto, é na segunda parte do livro que a história me perde. Gosto dessa ideia do fim da raça humana , da transformação da nova geração pra seres mais evoluídos e de como o homem perde o próposito de existência quando se ver impedido de perpetuar sua genética. Mas a evolução das crianças em si me pareceu muito mal construída e totalmente desconectada da primeira parte do livro. Elas só começam a transcender sem nenhum background e de uma forma muito rápida e quase mágica, pendendo mais pra um livro de fantasia do que sci fi.
Nesse ponto eu estava muito mais interessanda na empreitada de Jan em ir ao planeta dos Senhores Supremos do que nas crianças sem si. O rapaz parece ser o único personagem realista, já que pra mim é impossível o ser humano se conformar a um mundo perfeito, principalmente quando existem proibições impostas por forças dominadoras.
Já a absorção das crianças pela Mente Suprema soou como qualquer coisa pra mim, mesmo que eu enxergue como uma analagia legal ao apocalipse e ao paraíso. Fico com aquela sensação de que falta explicar alguns porques. Não que seja algo estritamente necessario, mas só evoluir por evoluir parece uma premissa simples e boba demais. Ainda sim, acho interessante a ideia do tempo como cíclico. Os seres humanos com aversão ao diabo por já saber que aquele seria o fim de sua espécie.
Por outro lado o retorno de Jan a Terra foi muito legal. A percepção de ser o último humano do planeta é atraente e aterrorizante ao mesmo tempo. Em vários momentos o Senhores Supremos batem na tecla que o ser humano não esta pronto pra acessar o conhecimento completo, e ao final Jan parece confirmar essa ideia. Acredito que eu enxerge certo sentido nisso sim. Ou isso quebraria uma pessoa, ou a transformaria em algo insensível e frio, como parece ser o caso das próprias crianças. Nesse caso eu prefiro evoluir passo a passo mesmo rs.
Mas a pergunta que me fiz é: será que os humanos aceitariam tão facilmente o domínio dos Senhores Supremos se soubessem que seria o fim da humanidade? Porque pensando bem, o acesso ao paraíso cristão nada mais é do que o fim da nossa existência terrena como conhecemos. Estariamos nós prontos pra abrir mão disso?
É uma história que possui conceitos muito interessantes e reflexivos, mas que gostaria de ter visto sendo construído de forma mais robusta e profunda. Ainda sim foi um livro instigante que me fez considerar ideias que nunca tinha passado pela minha cabeça antes. E qual é!? O ET ser o diabo é fod4 demais.