NW

NW Zadie Smith




Resenhas - NW


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anne (: 30/05/2021

um viva à descoberta da realidade
nos últimos quatro dias me aproximei do final do livro e tenho sofrido com a ideia de escrever sobre.

sabe aqueles filmes em que você vê montes de histórias de vários personagens diferentes, e em algum momento elas se cruzam e você tem aquele desfecho bem clichê feliz, com os escrotos se ferrando e as mocinhas com seus novos pares e novos destinos? e você percebe a trilha sonora te envolvendo em nostalgia, e o sol se pondo lá no fundo junto com os créditos.

pois é. isso é exatamente o contrário do que acontece em NW e muito mais, e por isso é tão bom. eu PRECISO aplaudir Zadie Smith pela generosidade com seu público ao construir enredos em que simultaneamente nada acontece e o mundo ferve ao redor das personagens e/ou dentro deles. ela investe pesadamente na complexidade delas, deixando aqui e ali pequenos traços de suas personalidades, da construção de cada uma e do que pode ou até deixa de vir no futuro de cada história; ficando a cargo de quem lê acompanhar esses fios e conseguir construir o tecido que perpassa toda a narrativa. e caso você seja desatenta/o durante a experiência: o desserviço é todo seu. até o personagem com passagem mais breve e "insignificante" (afinal, poderia ser qualquer um rs, quem leu sabe) te deixa com um nó na garganta, pelas suas escolhas, pelo tanto de vida que já foi ou que ainda virá e o que se fez/faz dela.

ao colocar os personagens nesse caldeirão de culturas que é NW, região de Londres, ela te conduz (e sim, eu sei, isso é contraditório em vários níveis; mas é esse o sentimento) a se perder na pluralidade. existe diversidade de crenças, culturas, trajetos, e principalmente: a diversidade que habita cada ser humano, o que norteia seus princípios e emoções, nas suas inconsistências, na confusão entre conciliar o racional e tudo o que foge a isso. e Zadie faz uso disso tudo na maneira de apresentar o enredo, variando o tipo de narrativa, a voz que conta essas histórias, tudo de certo modo experimental.

é um livro carregado de conflitos, apatia, realismo, melancolia e eu diria que de ira também, tem que ter estômago pra olhar pro mundo e pra si e perceber as coisas como são. não existe epifania que se sustente diante da crueza e do contraste da realidade além (ou aquém) das expectativas.

"179. Aforismo
Como o dom é uma coisa difícil para uma mulher! Ela vai se punir por tê-lo recebido." pg. 283
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Higor 17/12/2018

'20 melhores livros do século 21': Livro 18
Uma das maiores vozes da atualidade, Zadie Smith é um sucesso, tanto com os críticos, quanto entre leitores. Seus livros estão sempre presentes nos prêmios literários mais conceituados do ano, chegando a abocanhar alguns deles; ela também é presença marcada em importantes listas literárias: colocou, por exemplo, dois títulos na lista ‘Os 20 melhores livros do século 21’, feito repetido apenas por Chimamanda Ngozi Adichie.

'NW', no entanto, é o livro menos aclamado pelos críticos, mas com uma justificativa para estar na lista: as reflexões e personagens criados sobre a sociedade urbana, exploradas em seu máximo, imprimem a certeza de que o livro deveria, sim, figurar na lista, como o representante máximo do nosso século.

Tal livro como símbolo de representatividade é ser certo exagero ou prematuridade, diante de tantos lançamentos e dos livros não lidos, que remetem ao mesmo tema, mas diante do que eu li, é impossível ser indiferente quanto a futilidade e prolixidade das pessoas do século 21, tão plásticas, vazias, egoístas, a procura de felicidades instantâneas, mesmo que com isso, coloque uma vida inteira edificada com dificuldades, em ruínas.

Isso sem contar a grande protagonista da história: Londres, mais especificamente North Westhern, uma das áreas do código postal da cidade, concentrando-se em NW6, um distrito particularmente pobre e com variedade cultural por conta de intensa migração. Mas muito além disso, o que fascina o leitor são as descrições da cidade, tão viva e conturbada e imponente, com seus cheiros e cores e sons, que passam despercebidos por nós, diante de nossa correria, mas que estão ali, a mostra.

Apesar de ser um livro experimental, o que faz com que muitos leitores fujam do livro, é algo bem moderado, que vai agradar leitores habituados, sem deixar de conquistar novos leitores. Os diálogos, exatamente como falamos, em meio a poluição sonora da urbanização, representado o caos da cidade, causa desconforto de início, mas nada de bestial.

Por fim, 'NW' é um grande livro sobre a vida nas grandes cidades, não importa se na Londres de Smith, na minha Brasília, ou se em qualquer outra cidade grande com seu grau de caótica: a mensagem é passada de igual forma, a maneira como os personagens, e nós mesmos, nos comportamos atualmente, sem nos importar com o lado, apenas com individualismo, invejando o próximo, ambicionando sempre mais, deixando pequenos atos e conquistas e até mesmo desejos, por que não dizer?, de lado.

’20 melhores livros do século 21’ é uma lista encomendada pelo site de cultura da BBC, em que diferentes especialistas foram responsáveis por eleger os melhores livros do mais recente século. Para saber mais sobre a lista e conhecer os demais livros, acesse:

site: leiturasedesafios.blogspot.com
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Lopes 17/11/2017

Zadie Smith sabe se apropriar de suas referências literárias, e vai além, a autora demonstra essa apropriação com um estilo artístico único, que revela uma tensão por toda a obra "NW". Essa tensão poderia ser descrita como a ação da trama em si, onde a característica que se destaca é a formatação da linguagem para cada personagem. É como se cada uma tivesse sua origem literária em autor mestre num fazer linguístico, como James Joyce e Virginia Woolf , e essa origem é a maior delicadeza entregue pela autora nesta obra. Poder ver onde começa uma vida e para onde ela não irá, pois o acaso é servir ao que é literário e não ao que consentimos como tal. Smith perambula pelo que ela sente, percebe as vibrações daquela região, concretiza e arquiteta uma pequena destruição, retira do projeto urbano os trejeitos de cada personagem, que se enclausuram no sistema, sem terem sido atuantes nesta entrada, sendo empurrados, melhor dizendo. São quatro personagens, quatro direções e elementos que coadunam e se desfazem numa dura realidade, talvez a única, restrita a grandes escritores
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Ladyce 16/10/2017

Há tempos meu marido insiste que eu leia Zadie Smith. Por isso tenho ambos "Dentes brancos" e "Sobre a beleza", em português e inglês. Mas não foi por aí que conheci a autora. Meu grupo de leitura votou por ler "NW" e fiquei entusiasmada. Sabia que era uma autora excepcional. Talvez eu tenha exagerado na expectativa, porque achei "NW" um livro bom mas com problemas. Pelo menos não me agradou como esperava.

O próprio título sugere que o personagem principal de "NW" não é uma pessoa, mas um lugar: a região de Londres habitada em sua maioria por imigrantes da Jamaica, Irlanda, Índia, China, que se encontra exatamente a noroeste na cidade. É uma área mais pobre, com cultura própria, internacional, ecumênica e, aqui, descrita de maneira vívida e realista. No entanto, às vezes a atenção aos detalhes parece esconder a trama, ou ela é inexistente. Por isso, por ser a história de um local, a narrativa vai para todo lado, sem direção e o texto é picado ainda que às vezes lírico. Não é fácil de seguir, não é user friendly. Mas prende. Seduz. Envolve como a atmosfera de um lugar parece rodear tudo o que ali se faz. Lembra maresia em cidade praiana, ou o ar cinza de uma cidade com minas de carvão. No noroeste de Londres, a colcha de retalhos de culturas se ajustando à inglesa produz uma cacofonia própria, barreira transponível só depois de imersão profunda.

Há quatro personagens, amigos que se conhecem de infância (Leah, Natalie, Félix e Nathan), vidas comuns, que seguimos através de sketches do dia a dia, em staccato, numa narrativa não linear. Mesmo assim, eles são bem desenvolvidos, tridimensionais, existem em nossa imaginação bem caracterizados. Eles dão apoio a observações sensíveis que consideram preconceitos de classe e raça.

Talvez a mais impressionante característica desse livro sejam os habilidosos diálogos, que soam verdadeiramente "como se fala" [imagino o trabalho que devem ter dado para traduzir!], com o 'impromptu' de interrupções de pensamento e lógica. De fato, Zadie Smith parece querer trazer o caos das conversas simultâneas das grandes metrópoles para perto de nós. Esses diálogos, cheios de gírias e de coloquialismos ecoam a desordenada linha narrativa e ajudam o entendimento do caos que envolve os moradores dos grandes centros urbanos. Também retrata, em paralelo à conturbada vida citadina, a monotonia de vidas que seguem rotinas por vezes insensatas e o tédio que as permeia. O resultado é um livro que leva à introspecção, apesar do 'barulho' que o cerca.

Difícil dizer porque, mesmo assim, achei esta obra digna de quatro estrelas de um total de cinco. É como se fosse um voto de confiança. Sinto em Zadie Smith uma escritora que tenta ultrapassar os limites da narrativa linear. Quase cubista, vendo o mundo por diversos ângulos simultaneamente, ela nem sempre tem sucesso. O resultado, por mais difícil que a leitura tenha sido em partes, é ainda acima da média dos romancistas que conheço. Talvez não tenha sido a melhor maneira de ser apresentada à escritora. Mas se este livro marca, deixa vínculo, fica na memória, nada mais lógico do que ler e esperar mais da escritora. Agora irei em "busca do tempo perdido". Neste fim de ano vou me dedicar à leitura de Dentes brancos e/ou Sobre a beleza. Estou certa de que não me decepcionarão.
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Alexandre Kovacs / Mundo de K 22/09/2015

Zadie Smith - NW
Editora Companhia das Letras - 336 páginas - tradução de Sara Grünhagen - Lançamento 29/04/2014.

Este é o quarto e mais recente romance de Zadie Smith, lançado originalmente em 2012 e sucessor do premiado "Sobre a Beleza". A sigla NW (North Westhern) representa uma das áreas do código postal da cidade de Londres, subdividida de NW1 à NW11, sendo a área NW6 relativa ao distrito de Kilburn, uma região pobre e caracterizada por uma grande variedade étnica devido à presença de imigrantes, ou descendentes de imigrantes, de todo o mundo, principalmente da Irlanda, Índia, África e Caribe. Uma região onde a própria Zadie Smith, filha de um inglês com uma jamaicana, cresceu. O departamento de criação da Editora Companhia das Letras foi feliz no projeto da capa interna do livro ao remeter à ideia de um caleidoscópio, nada mais apropriado à característica multicultural e multiracial urbana do romance.

NW cobre o período da década de 1970 até os dias de hoje e tem como base quatro personagens principais — Leah Hanwell, Natalie Blake, Felix Cooper e Nathan Bogle, todos originários do mesmo bairro e conjunto habitacional. No entanto, apesar da origem comum e problemas sociais semelhantes, os personagens que são apresentados de forma caótica (como na vida real) têm histórias de vida completamente diferentes e seus próprios impasses existenciais. Enquanto Leah e Natalie conseguiram estudar, completar as respectivas universidades de filosofia e direito e constituir casamentos convencionais, Nathan que estudou na mesma escola que elas encontrou dificuldades e se transformou em um usuário de drogas pesadas e morador de rua. Felix é habitante do mesmo bairro, ex-viciado em processo de recuperação, que terá um desfecho trágico, funcionando como elo de ligação entre os outros três outros personagens.

O resumo acima pode passar a ideia de uma narrativa simples e linear, mas a verdade é que Zadie Smith para contar a sua história apostou em uma construção do texto quase experimental, alternando diferentes vozes narrativas, no presente e passado, exigindo bastante atenção do leitor que precisa voltar várias vezes às partes anteriores (pelo menos eu tive que retornar) para não se perder, sem falar na estranheza geográfica das ruas do distrito de Kilburn em Londres. Como exemplo, o trecho parcial abaixo, relativo à descrição do percurso feito por Leah ao retornar do trabalho para casa, utiliza recursos de fluxo de consciência, tendo sido comparado ao estilo de James Joyce e Virginia Woolf.

"O doce fedor de narguilé, cuscuz, kebab, gás do escape de um ônibus parado. Noventa e oito, dezesseis, trinta e dois, lotados — é mais rápido andar! Fugitivos do St. Mary, Paddington: homem fumante prestes a ser pai, velhinha girando a cadeira de rodas e fumando, sujeito duro na queda segurando um saco de urina, um saco de sangue, fumando. Todo mundo adora cigarro. Todo mundo. Jornal polonês, jornal turco, árabe, irlandês, francês, russo, espanhol, News of the World. Desbloqueie seu celular (roubado), compre um kit de baterias, um kit de isqueiros, um kit de perfumes, óculos de sol, três por cinco, um tigre de porcelana tamanho real, torneiras douradas. Cassino! Todo mundo acredita em destino. Todo mundo. Era pra ser. Simplesmente não era pra ser. Topa ou não topa? Telas de tv na loja de tv. Cabo de tv, cabo de computador, cabos de áudio e vídeo, faço um bom preço pra você, um bom preço. Folhetos, ligue pro exterior por menos de 4, aprenda inglês, sobrancelha com cera, Falun Gong, você já aceitou Jesus como seu plano de ligação pessoal? Todo mundo adora frango frito. Todo mundo. Banco do Iraque, Banco do Egito, Banco da Líbia (...)" (pág. 47)

Leah é branca, descendente de irlandeses, seu ambicioso marido é negro e francês de origem africana. Apesar de formada em filosofia, ela trabalha em uma organização de ajuda humanitária (onde é a única branca), a primeira parte do romance é toda dedicada à Leah e transmite um sentimento de melancolia e abandono da personagem que precisa lidar com sua ambiguidade sexual ao esconder a gravidez do próprio marido. A passagem abaixo destaca a sua inadaptação, na saída do trabalho e dá uma pista inicial da gravidez indesejada (por ela).

"A mesma piada todo dia. Uma piada que você pode fazer se você não for Leah, se você não for a única garota branca na Equipe de Distribuição de Fundos. No corredor, as mulheres irrompem de cada sala, calor adentro, manteiga de cacau passada, prontas para uma noite quente lá fora na Edgware Road. Da Ilha de São Cristóvão, Trinidad, Barbados, Granada, Jamaica, Índia, Paquistão, com seus quarenta, cinquenta, sessenta anos e, no entanto, bustos, bundas e pernas brilhantes continuam abertos para a sensualidade de um início de verão de um jeito que as mulheres da família de Leah jamais poderão ficar. Para elas o sol é fatal. Tão vermelhas, tão pálidas. Leah veste só uma roupa de linho branca e comprida. Parece uma santa menor. Ela vai atrás. Passa pela cena do crime, um cesto de lixo cheio de vômito enfiado atrás de um vaso de planta na sala de descanso porque o banheiro ficava longe demais." (pág. 44)

Leah entende que a vida da amiga Natalie já com dois filhos e uma confortável situação financeira é bem melhor resolvida, mas este não é absolutamente o caso. Natalie (que era a melhor amiga de Leah na escola e se chamava Keisha na época) é negra, filha de jamaicanos e seu marido, de família rica, é de origem jamaicana e italiana. Zadie Smith utiliza o recurso (na parte mais longa do livro) de 185 pequenos trechos para contar a trajetória de Natalie desde criança até a sua atormentada fase atual em que não consegue ser feliz no papel de uma bem-sucedida dona de casa e profissional de sucesso e começa a se conectar a um estranho site de relacionamentos na internet. Ao longo desses trechos o leitor consegue encaixar e entender melhor passagens e escolhas das duas personagens no passado que explicam a sua situação atual.

"Agora que havia tanto trabalho a fazer — agora que toda a vida dela tinha se tornado essencialmente trabalho —, Natalie Blake sentia uma calma e uma satisfação que só tinha experimentado antes durante a bateria de exames para a universidade ou um prejulgamento. Se ao menos pudesse desacelerar a coisa toda! Ela tivera oito por uns cem anos. Teve trinta e quatro por sete minutos. Com muita frequência se lembrava de um diagrama em giz desenhado num quadro-negro, muito tempo atrás, quando as coisas se moviam num ritmo razoável. Um mostrador de relógio, simbolizando a história do universo num intervalo de 12 horas. O big bang aconteceu ao meio-dia. Os dinossauros chegaram em algum momento no meio da tarde. Tudo o que estava relacionado ao homem entrava nos cinco minutos antes da meia-noite." (trecho 166 - 'O tempo acelera' - pág. 270).

"Fantasia de filha. Fantasia de irmã. Fantasia de mãe. Fantasia de esposa. Fantasia de advogada. Fantasia de rica. Fantasia de pobre. Fantasia de britânica. Fantasia de jamaicana. Cada uma exigia um guarda-roupa diferente. Mas, quando considerava essas atitudes diversas, ela se esforçava para pensar em qual seria a mais autêntica, ou talvez a menos falsa." ( trecho 170 - 'Fantasiada' - pág. 273).

A parte dedicada a Felix Cooper narra em detalhes um dia completo na vida do personagem, o processo de negociação para a compra de um carro clássico que ele pretende reformar, a conversa com o pai jamaicano e a visita à casa de Annie, uma ex-namorada que ainda está presa ao mundo das drogas, com direito a uma tórrida cena de sexo. Felix está decidido a buscar um futuro melhor devido ao seu relacionamento atual, mas ele precisa primeiro escapar da brutalidade de NW em um jogo no qual as suas chances são mínimas.

Talvez pela ambiciosa estrutura narrativa, o livro não é simples de analisar e também não obteve unanimidade de crítica (ranking de 3,37 no goodreads e 3,1 no Skoob), mas foi incluído entre os melhores romances de 2012 pelas conceituadas resenhas do New York Times e Wall Street Journal.
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