Codinome 17/07/2021
Um pouco sobre "O falecido Mattia Pascal / Seis personagens à procura de um autor"
Pirandello é um típico escritor que consegue unir filosofia e literatura, como, por exemplo, Albert Camus; aliás, ambos com formação em filosofia e com Nobel de literatura na conta. Camus provavelmente foi influenciado pelo escritor italiano e, daí, aparecem as grandes simetrias entre os dois: principalmente na problemática do absurdo na relação ora homem/mundo, ora homem/homem.
Nesse livro de Pirandello, após o romance "O falecido Mattia Pascal", há um artigo muito bom, chamado "Advertência sobre os escrúpulos da fantasia", em que trata da verossimilhança e do absurdo, na literatura e artes em geral. Uma bagagem significativa para o leitor que busca compreender a filosofia do escritor.
Temos duas obras: o romance já citado e a peça teatral, chamada "Seis personagens à procura de um autor". O romance publicado em 1904 e a peça exibida em 1921, ou seja, uma diferença espaçosa de 17 anos entre os dois. Na minha opinião, a peça consegue ser mais madura do que o romance pelo fato de ser mais complexa, conseguindo traçar ideias mais diversas sem se dispersar (algo, aparentemente, difícil de se fazer).
Mesmo assim, "O falecido Mattia Pascal" é uma obra muito importante e que traz a ideia do sujeito que se vê afastado de sua primeira vida, tendo, então, uma liberdade total. Mas que sua consciência, sua identidade e as próprias dificuldades burocráticas não o deixam, de fato, com essa total liberdade, seja lá isso o que for.
Em "Seis personagens à procura de um autor", temos o problema desses personagens que buscam viver o drama que foi idealizado e pensado para elas, numa ânsia por essa identidade que se expõe (1º problema filosófico: como se comporta essa tensão entre essência e aparência?). Não bastando a existência delas soltas no mundo, o que é para Mattia Pascal um privilégio (2º problema: a ficção é mais real ou livre que a própria realidade?). Por que não basta isso? Porque são personagens, e para elas, o sentido de suas vidas é representar seus dramas pré-estabelecidos (3º problema: até que ponto isso conversa com a realidade?), explicando-se essa busca incessante pelo autor.
Dentro da peça, há várias falas que nos fazem pensar sobre essas problemáticas que enumerei e sobre muitas outras - lendo as falas do pai da família, isso fica bem claro. Faz-me chegar à conclusão de que o teatro talvez seja a arte que mais consegue se aproximar da filosofia.
De qualquer maneira, ambos os textos (inclusive os materiais não-ficcionais escritos por Pirandello e que foram dispostos no livro) são importantes obras que conseguem nos fazer filosofar (tal como faço ao resenhar esse livro). Caso não consiga isso, indico materiais de apoio de críticos falando sobre obra e vida do autor.
Obs.: o leitor mais atento pode questionar o porquê de apenas 4 estrelas. Bom... Senti em "O falecido Mattia Pascal" uma gordura desnecessária, pareceu-me que Pirandello poderia ter criado algo mais enxuto e, na peça, achei os dramas internos das personagens, em alguns momentos, bem cansativos ao ler.