TiagoHelmer 08/05/2019É um livro diferente de tudo. Não é uma biografia, não é uma autobiografia. São as cartas do escritor estadunidense Truman Capote organizadas no tempo, sem alterações. Por esse motivo o livro é tedioso, mas consegue trazer uma experiência grandiosa. Nenhum personagem criado, biógrafo ou até mesmo uma autobiografia consegue trazer tamanha exatidão ao descrever uma personalidade. O leitor sente que conhece Capote no final do livro, o leitor decifra Capote. É um exercício de historiadores, biógrafos e antropólogos. Uma fonte histórica real, sem interferência.
Com a leitura dá para perceber o humor de Capote, seus medos, seus sonhos, em quem ele confia, suas experiências diárias, etc. Em uma carta em particular ele descreve sua vida na infância, contando sobre o suicídio da mãe, o abandono do pai, problemas na escola. Em outra carta ele responde a uma pergunta sobre sua crença em Deus, mostrando sua experiência pelo budismo, a admiração pelo catolicismo, mas que naquele momento ele estava bem consigo e que estava aberto para outras crenças. Enfim, você realmente conhece Truman. Nos momentos em que ele escreve cartas a amigos sobre a construção de sua obra “A Sangue Frio” mostra a sua perseverança, perfeccionismo e maestria como autor. Foram aproximadamente cinco anos que ele se exilou na Europa para escrever o que para vários críticos foi sua obra prima, ele realmente se dedicou o máximo e o resultado foi extraordinário. O que mais impressiona nas cartas é o bom humor de Capote, mesmo em momentos difíceis ele recorre ao bom humor. Escrever cartas para ele era realmente “um prazer fugaz”, título desse livro.
Por se tratar de cartas do dia a dia é preciso paciência e ter critério para absorver o livro, pois existem momentos de simples informações cotidianas e até mesmo fofocas desnecessárias, mas essa é a mágica do livro. Essa obra te obriga a ter sensibilidade, levando em consideração a infância difícil de Capote e por ele ter sido homossexual em uma época ainda mais preconceituosa. Além disso, o bom humor e a perseverança no trabalho é fonte de inspiração.
Por fim, como se não bastasse essas experiências, ainda é possível refletir sobre o fato de mandar cartas e como a distância pode aproximar as pessoas. Familiares que se veem todos os dias constroem muros invisíveis do cotidiano. Basta a distância e nasce a oportunidade de expressar coisas que jamais seriam expressadas. As cartas de Capote mostram isso. O outro lado da moeda é o fato de que a tecnologia tornou a benção que existe na distância uma banalidade. E-mails, aplicativos. Existe a ideia que a pessoa está próxima, mas não está. As cartas dão o devido respeito a esse algoz, a tecnologia muitas vezes não.