Leonardo.H.Lopes
26/05/2024Livro bom, mas ...Interessante a paisagem de desenvolvimento da narrativa, como o autor vai pintando o deserto do Saara e sua paisagem árida, cercada de camelos, afundada no calor extremo e habitada pelos Tuareg, um povo milenar para quem a honra está acima de tudo, abaixo apenas dos desígnios de Alá. Nesse cenário, desenvolve-se a história de Gacel Sayad, guerreiro do deserto que, ao hospedar dois homens desconhecidos, vê um deles, que estava sob sua proteção,ser assassinado a sangue frio por um oficial do exército e o outro ser levado à força. Altivo, orgulhoso, resistente e extremamente devoto da tradição de seu povo, Gacel abandona a família para vingar a morte do hóspede e a mácula de sua honra, bem como para garantir a integridade e a liberdade do outro hóspede.. Nessa aventura, ele mata mais de quinze pessoas e descobre que a obediência cega aos costumes, que se revela também uma forma de extremismo, deságua em um destino triste e inexorável.
É um bom livro, não há dúvidas. Achei o início muito bom, a ambientação, o cenário árido, a construção dos personagens e dos cenários. Mas, à medida que a narrativa avança, senti a história cambalear, principalmente com as saídas óbvias ou os acontecimentos meio inverossímeis que ocorrem para que o enredo caminhe. Muitos dos eventos no ápice das situações extremas que os personagens vivem no deserto, quase à beira da morte e de um acontecimento terrível, são resolvidos através de verdadeiros deus ex machina, algo que ocorre do nada apenas para salvar a situação trágica e fazer com que os personagens se salvem. Esses elementos, em minha experiência de leitura, acabam por empobrecer a obra, pois geram no leitor certo ceticismo quanto à verossimilhança do que está sendo contado e exigem muito da suspensão de descrença.
Superados esses pormenores, é um livro que vale a pena ser lido quando nos pegamos naquelas tardes sabáticas de tédio. A primeira metade é mais interessante que a segunda, e as coisas se atropelam pelo final da história, como se o autor tivesse se cansado de escrever e quisesse colocar logo um ponto final no texto. Confesso que o final acabou, sim, me surpreendendo e fiquei de boca aberta durante alguns segundos tentando assimilar os quatro últimos parágrafos que encerram, talvez, até mesmo uma lição de moral: tudo na vida deve ser pesado e sopesado, até mesmo as tradições que alicerçam a essência de nosso ser. Agir com irracionalidade por uma causa é um jogo de soma zero, pois nos destrói e gera consequências que nos levam à regressão, destruindo aquilo que julgamos proteger.