Bruna 29/07/2015 Hoje temos a resenha de um incrível suspense policial. Se você gosta do gênero, e curte um mistério bem bolado e construído, esse é seu livro. E se você espera um juvenil, ou algo ligado a contos de fadas, por causa do título: pense outra vez! Lobo Mau é um livro da autora alemã Nele Neuhaus, Publicado no Brasil pela Ediora Jangada.
Vamos lá?
Uma adolescente é encontrada morta no rio Meno, logo após uma festinha regada a álcool feita por alguns jovens. Em um primeiro momento, acredita-se que ela pertença a esse grupo, e caiu bêbada no rio. Porém, basta os especialistas polícia forense e legistas começarem seu trabalho para perceber que ela já estava morta a alguns dias, e que não foi no rio que faleceu.
Pia Kirchhoff e Oliver von Bodenstein são nossos protagonistas e policiais alemães, do departamento de homicídio, e assumem o caso. No decorrer das investigações descobrem que a jovem foi brutalmente espancada e estuprada, e seu esqueleto revela anos de abuso. Ninguém sabe que ela é, ninguém deu queixa de desaparecimento, ninguém reconhece a foto que circula nos meios midiáticos. E o caso parece não ter solução.
Pia é uma mulher competente, determinada, perspicaz e honesta. É uma daquelas policiais que tem um faro excelente e uma capacidade dedutiva de dar inveja. Bodenstein é o chefe do departamento de homicídios, e não teve tanto destaque quanto Pia, tanto que só descobri que ele era um dos protagonistas quando vi o nome da série :-). No decorrer do livro, acompanhamos um pouco a vida pessoal dos dois, Pia com seu namorado e a netinha dele (sim, netinha, pois todos eles tem mais de 40), e Bodenstein se acostumando a vida de um recém-divorciado.
Uma das principais razões pelas quais ela gostava de fazer seu trabalho, por mais frustrante e deprimente que muitas vezes pudesse ser, era a de que, ao esclarecer as circunstâncias das mortes, tinha a sensação de poder demonstrar respeito às vítimas, e pelo menos, restituir-lhes um pouco de sua dignidade humana.
Págs. 89-90
Paralelamente, outros grupos vão sendo apresentados. Um ex-presidiário, inicialmente sem identidade revelada. Uma apresentadora de TV ambiciosa e inescrupulosa, e sua filha revoltada e carente. Uma mulher grávida, que trabalhava em áreas de risco no exterior, e retorna ao país com o marido e a filhinha de 5 anos, para viver com a família perfeita dele, até o nascimento do bebê. Uma gangue de motociclistas tatuados. Uma psicoterapeuta que trata de mulheres traumatizadas. Estes são os núcleos apresentados no livro, que vão tendo suas histórias contadas de forma intercaladas, até irem se unindo, em uma inteligente e instigante rede de acontecimentos.
Ao longo do livro, outros crimes acontecem. Brutais, chocantes! Que nos levam a questionar a humanidade de muitas pessoas, que nesse caso, de humanos não tem nada. São simples monstros. Verdadeiros lobos em pele de cordeiro.
Com uma narração em terceira pessoa inteligente, minuciosa e detalhista, a autora nos conduz por um mundo pérfido e nojento, que mostra o quão baixo o ser humano pode chegar com seus desejos e prazeres doentes. E é incrível acompanhar o desenrolar dos fatos e o curso das investigações. Pedofilia, abuso de mulheres, corrupção de poder, e o peso das aparências são temas muito bem retratados no livro, sem necessidade de cenas grotescas e explicitas.
Não é difícil para o leitor matar as charadas do livro, já que a autora vai deixando várias pistas, mas mesmo assim, nada nos prepara para o choque quando descobrimos o nível da podridão por trás dos crimes. Minha única reclamação do livro foi a falta de duas explicações no final, que embora não tenha sido nada que tenha comprometido o desfecho, fizeram falta, pelo menos para mim.
O título do livro é uma metáfora importante para a trama, que tem como principal foco o abuso infantil. Afinal, que criança não tem medo do lobo mau (ou outro vilão imaginário)? E qual a melhor forma de garantir o silêncio de uma criança abusada do que ameaçando com seu pior pesadelo? Nojento, não? Mas funciona! E o livro mostra bem como funciona, e o nível das consequências para quem passa por isso. E ao longo de todo o livro vemos pequenas referências analogias ao conto do Lobo mau e Chapeuzinho Vermelho.
Só de pensar em ir para a casa, sentiu-se mal de tanto medo, mas não podia dizer nada, era um segredo que não podia contar a ninguém; (...) Mas na última noite voltou a ter pesadelos e aquele medo dos lobos. Pois alguém viria para comê-la se falasse a alguém do segredo.
Pág. 166
Os capítulos são divididos por dias, e portanto, são bem longos. Porém há quebras a cada duas ou três páginas, que tornam a leitura fluida e dinâmica, uma vez que a cada parte temos um núcleo diferente. A narração detalhista da autora deixou a leitura cansativa no início, mas quando a investigação desenrola, e os novos crimes ocorrem, e perfil detalhista se torna incrível, pois no permite até mesmo sentir o que os personagens estão sentindo, até suas reações ao ambiente e clima.
A diagramação do livro é muito bem feita, com folhas amareladas, letra grande e espaçada. Os títulos dos capítulos são datas escritas em vermelho, e há manchas vermelhas, simulando sangue, nos números da página. A revisão está muito bem feita, e não vi erros, e há notas de rodapé para explicar expressões ou lugares, uma vez que poucas pessoas estão familiarizadas com a Alemanha (eu sei que não estou, rs). E tenho que fazer um elogio especial à capa, que foi simplesmente perfeita! O título em destaque, o lago no fundo, a lua cheia e a capa vermelha iluminada pelo luar dão um ar bem sinistro e mistérios.
Lobo Mau é o 6º livro da Série Bodenstein & Kirchhoff, e, além dele, apenas o 4º, Branca de Neve Tem que Morrer, foi lançado no Brasil. Mas não se preocupem com isso, pois é possível acompanhar a história tranquilamente, sem se perder, mesmo não tendo lido os anteriores. Apesar disso, eu quero ler os outros, porque gostei muito da escrita da autora, e isso não é possível, porque nem em inglês tem os livros. Acho uma maldade da editora não lançar a série toda, e na ordem.
Recomendo demais o livro! Sério, vocês precisam ler. Além de ser um policial muito bem escrito, o tema é muito importante, e algo que, apesar de atual e recorrente, ainda é tratado como tabu.
No microssomo fechado da família, era a violência mais praticada e, apesar de todas as campanhas públicas, esse tema continuava sendo um tabu.
(sobre abuso sexual infantil)
Pág. 239
Leiam, leiam!
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