lahmot 15/04/2024
Eu sempre tento ser o mais imparcial o possível, mas a verdade é que o ser humano é uma criatura parcial, não tem jeito; o nosso viés sempre acaba falando mais alto. É importante observar a obra através do contexto em que ela foi criada, mas ignorar minha própria visão do mundo ao analisá-la seria injusto e irreal com a minha própria experiência ao ler esse livro.
Asco é o sentimento que me acompanhou durante toda a leitura. Eu não sou contra uma história pessimista, não há nada de ruim em escrever sobre um sujeito miserável, mas a história deste homem não nos traz nada além de sentimentos negativos. Yozo me fez sentir pena de si - não empatia, pena mesmo. É uma obra com tantos temas pesados (suicídio, abuso sexual, alcoolismo) citados com tamanha naturalidade que beira à estranheza. Não foi engajante, foi deprimente e por mais que essa tenha sido a intenção do autor, foi uma experiência desagradável. Esse livro suga sua vitalidade e te puxa para baixo, não é algo que uma pessoa que não esteja muito bem emocionalmente deva ler, ele te deixa vazio; sentindo repulsa dos seres humanos, e é extremamente perigoso se você começar a se identificar com o personagem principal de mente nem um pouco saudável.
A alienação é um dos principais pontos aqui, Yozo vive em sua própria cabeça, e a maneira como ele enxerga o mundo ao seu redor está totalmente fora da realidade, e há uma grande ironia nisso, porque ao mesmo tempo, o mundo também enxerga ele de forma errônea. Ele cria uma máscara para si, que o auxilia a interagir com as outras pessoas, e dessa mesma forma, vê todos os outros como se usassem máscaras também. E quando a máscara cai, é como se o mundo dele desabasse. Afinal, quem era Yozo de verdade? O homem atraente que fazia todos rirem de suas palhaçadas, ou o homem patético autocrítico que em um momento tinha medo até de sair de casa? Em minha opinião, eram os dois. Querendo ou não, você acaba se tornando o que os outros pensam de você, de certa forma, mesmo que indiretamente, do mesmo jeito em que a sua opinião sobre os outros torna aquela pessoa naquilo que você viu nela. Do mesmo jeito que o ódio dele pelas mulheres fez com que elas fossem tão menores aos seus olhos (argh).
Longe de mim querer resumir a obra à misoginia do autor, mesmo que inegável, mas como eu falei, não dá para ignorar.
O livro é um eterno "meu deus, a sociedade... bottom text". É possível sim escrever algo bom em cima de uma base como essa - Dostoievski está aí como prova, ele consegue tratar de situações sombrias e tirar um proveito disso -, mas a cabeça de Osamu Dazai não é um lugar onde eu gostaria de estar. A autopiedade do Yozo é insuportável de se ler e olha que eu aguentei páginas e páginas de monólogos ansiosos do Raskolnikov em Crime e Castigo.
Ainda assim, um livro que te faz sentir algo - mesmo que negativo - está anos luz a frente de um livro medíocre que não te faz sentir nada, por isso, depois de esculachar essa obra, eu preciso dizer que reconheço o mérito dela. O autor escreve muito bem, eu até diria que é um incrível estudo de personagem, mas na verdade isso se encaixaria melhor num estudo do próprio autor.