spoiler visualizarFelipe 09/01/2022
Bizarro, absurdo, porém útil de certa maneira
Ayrton é empregado de uma firma a serviço dos insuportáveis Srs. Sá e Pato. Certo dia é enviado a trabalho a outra cidade e, conduzindo seu carro pelas estradas sinuosas, é acometido por um acidente e resgatado com vida pelo professor Benson.
Assim sendo, Ayrton resolve ficar na companhia de Benson e solicita um emprego em sua casa. Lá, Benson revela a ele que inventou uma máquina, capaz de prever acontecimentos futuros, denominada "porviroscópio".
Eis que, certo dia, o professor Benson morre, sendo que, ao pressentir a própria morte, destroi antes de tudo seu invento, para que nao caísse em mãos erradas. Ocorre que sua filha, Miss Jane, já havia testemunhado o futuro e, nos capitulos seguintes, após o enterro do pai, dedica-se a revelar o evento denominado "Choque de Raças" a Ayrton, contando que este fosse escrever um livro a respeito.
No futuro os EUA são uma nação eugênica, dividida entre brancos meticulosamente selecionados e negros despigmentados por meio de técnicas científicas. O núcleo da trama consiste na eleiçao presidencial e a cisao entre homens brancos, sob representação de Mr Kerlog e mulheres brancas, sob representação da candidata Miss Astor. Um terceiro candidato surge: Jim Roy, de cor negra, e consegue se aproveitar da cisao branca para se eleger.
A trama do livro é envolvente no início, mas deixa de ser cativante com a destruição do invento do professor Benson, quando foca no relato de uma história curiosa. Fato é que a trama não tem muito significado para um leitor em pleno século XX. É profundamente machista pois caracteriza as mulheres como seres incompreensíveis, passionais, imprevisíveis, impulsivos e sedutores. Há uma redução do gênero feminino e uma concomitante submissão. As ideias feministas e o sufragismo universal são ridicularizados no livro.
Semelhantemente, os negros são criticados como seres inferiores, pouco inteligentes, e que conseguiram a proeza de ameaçar o branco pela emergência de um lider, Jim Roy, excepcional para sua raça. O livro termina com o triunfo do branco sobre o negro por iniciativa do próprio negro: quase toda a populacao adere a um tratamento capilar alisamento permanente que, em contramão, leva à esterilidade. Isto é, por uma trama de Kerlog, ocorre um etnocídio: os negros são objeto de eliminação eugênica.
Não é minha intenção ser anacrônico, mas a obra parece muito ousada até mesmo para sua época. É, todavia, uma obra que considero importante para a desmistificação da figura de Monteiro Lobato, adepto de ideias eugenistas e do arianismo.