Alexandra 30/07/2015
Ótimo para levantar debates
Em “Submissão”, o personagem principal, François, é um professor da universidade de Paris IV-Sorbonne obcecado pelo escritor Huysman (curiosamente, o literato era um homem que, após uma vida desregrada, se converteu ao catolicismo, fazendo uma analogia à história contada nessa obra).
François pouco sabe sobre política e todas as explicações sobre esse tema são feitas a ele por meio de amigos ou conhecidos, não tem uma opinião própria e é facilmente influenciável. Na vida amorosa também encontra problemas (talvez por ser um tanto misógino), chega a se apaixonar por uma mulher, mas o caso não vai muito longe. Ou seja, mesmo sendo um professor respeitável e entendido em vários assuntos, em outras matérias se mostra completamente ignorante.
Nessa distopia, a França passa por eleições em 2022 onde o candidato da Fraternidade Muçulmana é eleito o presidente. No clima das eleições, o personagem principal se mostra assustado com o que pode acontecer com o futuro do país, mas após o início do governo, as mudanças que ocorrem o agradam. As ideias de rejeição ao humanismo, submissão da mulher, poligamia e retorno do patriarcado o satisfazem, e percebe que ele tem muito em comum com os islâmicos.
Na literatura é difícil poder afirmar o que o autor queria dizer com sua obra, mas é possível o leitor dizer a sua visão do livro, o que ele entendeu e o sentimento que a leitura o causou. Por isso, não posso dizer com certeza as intenções de Michel Houellebeq, mas eu consegui enxergar semelhanças entre o personagem principal e várias pessoas que conheço. Quem nunca encontrou alguém que critica o islamismo por seu radicalismo, mas ao mesmo tempo têm casos com várias mulheres e gostaria de restringir certos direitos femininos? Nessa distopia, seria muito provável que as mesmas pessoas que criticam essa religião hoje, acabassem aderindo a ela futuramente.
Até aí, o livro possui uma ideia interessante, ao falar de pessoas facilmente influenciáveis que possam aderir a um regime opressor. O problema se encontra justamente em escolher o islamismo para falar disso, afinal, se trata de uma religião que, na Europa, é mais oprimida que opressora. Enquanto “Admirável Mundo Novo” imagina um futuro onde as pessoas são controladas pelo prazer (muito parecido com o nosso) e “1984” prevê um futuro exagerado para fazer uma crítica aos regimes totalitários da época, “Submissão” faz uma mistura dos dois, o que pode ser algo muito bem vindo, mas peca por fazer generalizações sobre um tema polêmico em uma época e lugar inadequados. Afinal, supor que todo muçulmano é um radical só gera mais motivo para preconceitos na Europa atual. E nem acho que o livro seja islamofóbico, a ideia dele é maior que essa, mas assim como eu posso fazer uma interpretação própria, algumas outras pessoas podem utilizar a obra como uma ferramenta para aumentar a xenofobia.
É um pouco difícil eu ler um livro cujo personagem principal sempre me soe detestável, mas é importante ressaltar que não tive a impressão de que o autor concorde inteiramente com seus atos, pois existe um olhar satírico sobre François, como se ele fosse uma caricatura.
Para quem não é muito familiarizado com a literatura francesa e com alguns filósofos, talvez seja interessante pesquisar um pouco sobre algumas figuras citadas no livro, a fim de entender com maior profundidade a ideia a ser transmitida pelo autor.
Para concluir, posso dizer que o livro gera debate para várias discussões, seja sobre o ser humano, o islamismo, o futuro da Europa, política ou até mesmo sobre a influência que uma obra pode ter sobre a sociedade. É, talvez, como diz a capa, “o livro mais polêmico do ano”e uma leitura essencial para as pessoas que gostam de discutir sobre as questões atuais.