Ladyce 17/06/2017
Uma grande e boa surpresa me esperava em maio deste ano: “O pecado de Porto Negro” do escritor português Norberto Morais. Não me lembro de quem o recomendou. Mas agradeço a sugestão. Encontrei um livro de excelente qualidade literária, com enredo sedutor, personagens intrigantes e uma trajetória impensada. Tudo isso num mundo arquétipo do colonialismo lusitano que entendemos pela familiaridade cultural. Sua localização tão real que fui procurar a ilha no Pacífico, chamada São Cristóvão. Onde poderia haver tal lugar? Fui aos mapas mesmo sabendo que as conquistas portuguesas nunca chegaram a terras banhadas por este oceano. Maravilhada até o fim fico surpresa que, finalista do prêmio Leya em 2013, este livro não tenha sido o premiado.
Além de Porto Negro ser uma cidade estabelecida e enraizada no imaginário luso-colonial, sua descrição parece tão familiar que entendemos as razões de seus personagens, por mais estranhas que possam ser, sem que questionemos da validade de suas posições. Além disso, há a fascinante questão da época. Quando exatamente esta história se passa? Acredito que tenha sido nas primeiras duas décadas do século XX. Mas o resultado, como em toda boa obra é irrelevante. A obra é atemporal. Trata das histórias de seres humanos como todos nós com paixões e idiossincrasias. É universal.
Norberto Morais conta a história de algumas paixões entre habitantes de uma ilha esquecida pela modernidade. Há o homem sedutor, a mocinha seduzida, o bordel, o pai, a mãe calada e morta; há o açougue, a rede, o calor, a hora da sesta. O mal-de-amor. A praia. O porto. Outras paixões, a inveja, a Igreja, a intransigência, a vingança. E há sobretudo o Silêncio. Falar de silêncio numa obra com um vocabulário, um léxico formidável não é contradição, porque Norberto Morais domina desde o primeiro instante esta história com poucos personagens e uma trama bem tecida, fechada e densa, que surpreende a cada momento.
Para muitos, sua prosa lembra a de Garcia Marquez pelo onírico ou a de Eça de Queiroz pela limpidez do texto. Encontrei ecos de Eça e do Jorge Amado, de Gabriela e Capitães de Areia. Qualquer que seja a referência, fato é que Norberto Morais, que nasceu na Alemanha, mas é escritor português, se encontra bem enraizado na tradição literária da língua e da cultura portuguesa. Não há como negar. Belíssimo livro. Não é sua primeira obra, vou agora à cata de seu primeiro título. Esse é um autor para não perder de vista.