A Cancão do carrasco

A Cancão do carrasco Norman Mailer




Resenhas - A Cancão do carrasco


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Luiz Pereira Júnior 13/09/2023

Obra-prima
A primeira impressão para muitos leitores que se tem do livro “A canção do carrasco”, de Norman Mailer, é desistir da compra; afinal, não são todos que se animam diante da visão de um livro de 1.030 páginas, mais parecido com um tijolo ou um apoio de porta.

No entanto, posso dizer com toda a sinceridade que em momento algum tive vontade de desistir do livro. Mas também é necessário que se diga que não é para qualquer um, pois são minúcias em cima de minúcias, detalhes sobrepondo-se a detalhes, centenas de personagens (todos reais, ao que parece) para descrever os crimes cometidos pelo assassino real Gary Gilmore e, posteriormente, todo o processo de acusação, condenação à pena de morte, execução e pós-execução.

Não é um livro para se ler às pressas (talvez seja bom intercalar com outras leituras, mas fiquei tão absorvido com o livro que nada mais li durante um mês), mas também não é um livro arrastado, cheio de moralismos psicologizantes ou tentativas de angariar a simpatia do leitor. Um prato cheio, ou melhor, um banquete inteiro para uma discussão sobre a pena de morte.

O livro é basicamente composto por narrativas, em sequência cronológica na maior parte da obra, de praticamente todos os personagens (melhor seria dizer pessoas) envolvidos na trajetória de Gary Gilmore. Assim, aparecem as visões, ideias, conceitos da família do protagonista (uma pessoa real, é necessário salientar), mas também dos advogados, das secretárias dos advogados, dos policiais, das vítimas, das famílias das vítimas, dos profissionais de imprensa e da mídia, dos carcereiros, dos colegas de prisão, da amante, da família da amante e por aí vai.

E o que talvez seja mais impressionante: todo esse enorme acúmulo de dados é contado praticamente apenas por meio de narrações e diálogos, com pouco uso de descrições e menos ainda de trechos digressivos ou filosofantes, o que seria de esperar de uma obra tão longa e tão complexa.

Mas também é preciso realçar que Norman Mailer, mesmo sem utilizar opiniões ou subjetivismos quaisquer e apenas por meio de sua monstruosa força narrativa, consegue passar uma visão das classes baixas (ou menos favorecidas, se preferir) americanas, com toda a sua enorme carga de preconceitos (raciais, sociais, de gênero, de orientação sexual, de faixa etária, geográficos) e seu materialismo à toda prova. E, mais uma vez, reforço: para ser grande, retrate sua aldeia de forma que o mundo inteiro se reconheça nela. E isso Norman Mailer o faz como poucos.

Vale a pena? Se você tiver coragem para uma obra que retrata um crime real, com minúcias que parecem desnecessárias (mas que, sem elas, o livro não passaria de mais um relato de crime), com dezenas (talvez centenas) de personagens e com mais de mil páginas, sim, esse é o livro para você.

E de poucas obras posso afirmar isso: sim, “A canção do carrasco”, de Norman Mailer, é uma obra-prima.
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