otxjunior 12/10/2021Caçada às Cegas, Lee ChildPelo histórico, eu confiei em Lee Child. Mas nem ele resolveria o problema complicadíssimo que propôs aqui, de maneira ambiciosa quase passando o limite do ridículo, satisfatoriamente. A saber, como matar uma série de mulheres, todas de passado do serviço militar, sem deixar nenhum vestígio. O bizarro e elaborado modus operandi é uma dificuldade à parte, que representaria algum desafio para alguém mais capacitado que a inepta e obtusa equipe do FBI responsável pelo caso. E Jack Reacher não tem escrúpulos em zombar de seus métodos, especialmente de uma agente em especial, que não por acaso é mulher, e ainda por cima, feia. Qualquer semelhança com James Bond não é mera coincidência. Mas o politicamente incorreto é menos perdoável para os leitores do século XXI.
A caçada às cegas do título se dá em sua maior parte em círculos e em ritmo lento, quase a induzir hipnose. As voltas que Reacher dá nas autoridades que acham que o têm sob controle e até a subtrama de extorsão, levando mais à ação habitual, envolvendo gangues de imigrantes em Nova York, divertem muito mais que o caso principal, de aspectos clássicos incompatíveis com o herói errante e justiceiro. Reacher não é um detetive, apesar das diversas referências a Sherlock Holmes. Além disso, por motivos óbvios, ele não está realmente investido e isso reflete na dinâmica da leitura.
Por um lado mais pessoal, seu espartanismo ainda é presente e fonte inesgotável de humor na série. Aliás, não lembro de outro romance da série, ou qualquer um realmente, com tantas milhas percorridas. Reacher basicamente não sai de um meio de transporte cruzando pontos longínquos dos Estados Unidos, com menos banhos e refeições que recomendam os limites da suspensão da descrença. Diferente de sua inspiração nos thrillers de espionagem clássicos, aqui os destinos exóticos são substituídos por academias de treinamento e bases de operações militares. Mas ainda acho que Lasalle Kruger seria um nome perfeito de um vilão 007 e também estendo minha antipatia para as reacher girls, embora isto deve dizer mais sobre mim do que elas.
Em suma, não importa muito se é mirabolante demais ao ponto de inspirar risos involuntários; ou se é possível antecipar a resolução, embora não se queira acreditar ou associar com mistérios infanto-juvenis da Coleção Vaga-lume; ou pareça muito sistemático, deixando pouco espaço para o acaso e subjetividade; ou ainda, indo contra tudo o que acredito, estimule um respeito às forças militares; um livro desta série ainda representa entretenimento de qualidade. E eu sou muito millennial para não entender o apelo de Reacher e sua filosofia de peregrino. E antes de tudo, um fã.