Helder 01/12/2011Relato "Tapa na Cara"Você curte livros tristes? Se sim, encontrou o perfeito.
E para que pode servir um livro triste? O que vou ganhar lendo um livro assim?
A certeza de que sua vida é maravilhosa e que qualquer reclamação que você faça é demonstração de puro egoísmo e egocentrismo.
Foi assim que me senti após ler este relato. Sim, pois é tão pequeno que é até difícil de chamar de livro. Acho que li em duas horas, ou 3 sentadas.
O autor abre totalmente sua alma e nos mostra os sentimentos contraditórios existentes em um pai que concebeu dois filhos deficientes mentais. Como disseram para sua outra filha, “ele só pode estar querendo contar vantagem contando uma estória assim, né?”
Mas não é Estória, é verdade. E ele nos mostra toda a dor existente nessa realidade. Não ter orgulho de seus filhos e eles não terem orgulho de você por nem saberem o que é isso.
Em muitos momentos, os termos usados por ele para definir os meninos são horríveis, mas quando nos colocamos no lugar dele, pensamos: Como eu agiria se isso acontecesse comigo?
“Eles requerem uma paciência de santo, e eu não sou santo”
Quando eu descobri que minha esposa estava grávida passei a ter medo. É estranho isso, mas é a minha verdade. Junto com a alegria, vinha um medo enorme. Ele seria perfeito? Ele seria feliz? Ele...? Cada ultrasom passou a ser uma vitória. Nuca ok, não tem down, deu para ver o sexo, tem todos os dedos, tem pernas, braços e orelhas, cabeça tamanho normal.Mas e quando nascer, vai ser tudo bem? Foi! Mais uma vitória. Teste do pezinho, ouvido, olhinho, aprender a mamar no peito, ficar sentado, rir, andar, falar, aprender as cores, aprender o nome. E hoje já sabe até algumas palavras em inglês!!
O autor deste livro na primeira vez não teve estes medos. Na segunda já teve. Mas como ele disse, jogo com a genética e perdeu!
E por isso, não pode ter muitas outras coisas que almejamos. Seus filhos não aprenderam a falar, não podem jogar bola com seu pai, nem ganhar medalhas. Seus amigos reclamam que não agüentam mais receber os presentes tranqueiras feitos pelos filhos nas escolinhas, e ele daria tudo para receber qualquer presente feito por seus pequenos. Esses e muitos outros exemplos citados durante o livro nos mostram no fundo de nossa alma a tristeza deste pai, que muitas vezes ainda se culpa por ter sido tão incompetente a ponto de trazer ao mundo duas crianças somente para sofrerem.
Mas além de mostrar este lado triste, ele também põe na mesa a discussão com a sociedade, onde existe sempre um medo de se falar sobre crianças deficientes, como se rir de algo que elas façam fosse sempre um pecado. A mania do Politicamente Correto. Achamos que vamos ofender os pais, mas tudo o que ele queria era que as pessoas rissem das “criancices” de seus filhos como riam dos outros. Ao ler o livro percebo que não sei me comportar nem como o pai de uma criança assim, nem como alguém que está ao lado. Muito complicado!
E para a maior ironia desta vida, este pai trabalhava com humor e escrevia livros para crianças. Fez muitas crianças felizes, mas nunca poder fazer seus filhos rirem.
Ao ler este livro lembrei muito de uma musica do Depeche Mode chamada Blasphemous Rumours, onde eles dizem:
“I don't want to start any blasphemous rumours, but I think that God's got a sick sense of humor. And when I die I expect to find Him laughing”.
“ Eu não quero começar nenhum rumor blasfemo, mas eu acho que Deus tem um senso de humor doentio. E quando eu morrer, espero encontrá-Lo rindo”.
Cada um com suas crenças. Para ler e pensar muito.
E abraçar o seu filho!