Luiza 25/07/2013
Belíssimo Documento sobre o Graal!
Adorei o livro! O prefácio e as notas ao final dos manuscritos reunidos ali esclarecem muito sobre a Demanda do Graal. Gostaria de ler em língua francesa para me aprofundar no assunto, pois a maioria dos documentos são franceses (sem tradução em português).
Seguem alguns trechos que me chamaram atenção:
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"O Graal é ora é um prato fundo, ora uma pedra. Em seu livro sobre a lenda do Graal, fundamentado nas pesquisas de C. J. Jung, Emma Jung demonstrou que os dois símbolos são conexos. Ao graal-vaso, cálice que recolheu o sangue de cristo, correspondem os signos mitológicos da cornucópia da abundância, do caldeirão mágico dos celtas, da taça dos gnósticos. Acrescento o Cesto de Elêusis. Vasos miraculosos que alimentam o corpo e a alma. Quanto à pedra caída do céu, vamos reencontrá-la no vocabulário da alquimia. É o símbolo da reconciliação dos contrários. Para a alma medieval, atormentada pelo problema do mal, a Pedra do Graal é um símbolo de esperança, o sinal da nova promoção, da irrupção do divino no âmago do humano."
* Armand Hoog, em prefácio para o livro "Perceval ou O Romance do Graal", de Chrétien de Troyes.
O tema do Graal é ao mesmo tempo oriental, céltico e cristão. A bacia sagrada que devolve a vida aos mortos, o Rei Pescador, a lança, a terra enferma, o reino do outro lado do mundo: imagens equívocas e obscuras como o destino do homem. Quando, do fundo das idades, afloram as consciências individuais, estas as interpreta de formas diferentes. Porém, aos olhos do homem, o mito continua a ser a reencarnação de uma sabedoria superior e sagrada, velha como a espécie. Quando os sonhos individuais assumem dimensões mitológicas, vemos a imagem fálica da lança, símbolo elementar da vida, surgir ao mesmo tempo na dança dos curetes, na tradição irlandesa da «bleeding lance», no bastão imemorial do tarô, nas cerimônias do rito de greco-bizantino, na magia mediaval, nos remanescentes folclóricos atuais da Cornuália e das ilhas Shetland. Admiro, então, não como um contrassenso, mas como uma correspondência, que a imaginação cristã do século XIII tenha reconhecido na lança pagã que sangrava ininterruptamente o instrumento da nova redenção, a arma de Longino transpassando o flanco de Cristo.
* (prefácio de Armand Hoog para o livro de Chrétien de Troyes, "Perceval ou O Conto do Graal")
O cristianismo vai ao fundo das imagens coletivas do ciclo arturiano recuperar, para uso próprio, a taça, a lança, o prato e a espada. Batiza a taça de Graal, põe uma gota do sangue de seu Deus na ponta da lança antiga. A procissão dos mistérios é santificada. O local de iniciação passou a ser o Castelo - Castelo Aventuroso, Castelo do Rei Pescador, Castelo de Cobérnic. Tudo isso sem maldade, é verdade. Entretanto há algo de novo. Ao se tornar cristão, o mito ficou mais rico. Depois de passarem pelo ciclo arturiano, nunca mais os símbolos da libertação humana serão raramente os mesmos.
* (prefácio de Armand Hoog para o livro de Chrétien de Troyes, "Perceval ou O Conto do Graal")
"Quando natureza e coração se juntam, nada mais é difícil".
O amor tem tão grande império sobre os que domina e inspira que eles nada ousariam recusar do que lhes é ordenado.
"Muitos dos beijos que recebeu ele dispensaria facilmente. Mas quando um homem é desejado com era sire Gawain, cada uma toma o que pode, mais do que ele quer; porém como se defender?" - ("Manuscrito de Mons", parte da Vulgata dos romances arturianos / continuação de "Perceval ou O Romance do Graal", de Chrétiens de Troyes)
Perceval deixou Brancaflor com o coração mais triste do que ela poderia imaginar. Concentrado em seu objetivo de grandeza e valor, ele se proibiu qualquer repouso, qualquer esquecimento ou sonho. A própria ventura que Brancaflor representa parece-lhe abandono do dever. (Texto de Gerbert de Montreuil, século XII, parte da Vulgata dos romances arturianos - continuação de "Perceval ou O Romance do Graal", de Chrétiens de Troyes)
Perceval está deitado, porém dorme mal. Sonha que está deitado sobre um ninho de répteis, que incomoda com seu peso e que fervilhavam sob ele. Depois ouve uma voz melíflua que canta: "Onde encontrarei meu meigo amigo?". É um pesadelo que o desperta. Sente como se exalasse um vapor. Abre os olhos e vê a mais linda mulher que homem possa encontrar na terra, mas que se curva sobre ele como um demônio, bela, perigosa e perturbadora:
- Perceval, gentil amigo, como fazes mal a meu corpo! Há mais de um ano te procuro e até agora não sei se terei recompensa! Sou filha do Rei Pescador. Vou te revelar todos os segredos que inda ignoras. Amo-te e desejo-te tão intensamente que desvendarei a verdadeira razão da Lança mágica e do Graal nutritivo, contanto que deites comigo e proporciones meu deleite.
...
Perceval porém responde:
- Certo que estás louca, ou viveis de galanteria! Não desejo vosso deleite, pois sois falsa apaixonada. É indigno de uma jovem tão bela atirar-se a novos amores. Pensei em Deus e em honra e na Cruz onde Ele pendeu!
Traçou então o sinal-da-cruz, e o Inimigo em fuga fez um barulho horrível, com tal tempestade que não houve nos bosques, meia légua ao redor, ave nem fera que não sentisse mortal pavor. Perceval entendeu que novamente tivera afazer com o Demônio. Tirou a espada da bainha e com a ponta desenhou um grande círculo no chão, ao redor do cavalo e da cama. Depois recolocou a espada na bainha, tornou a deitar e finalmente dormiu em paz.
(Texto de Gerbert de Montreuil)
"É preciso saber que no leito de Perceval colocaram um rico edredom feito de plumas escolhidas pela fada Brangemal na ilha de Guernemue, e quem deitar sob ele nunca terá gota, nem fogacho ou mal algum, e o coração permanecerá fiel a seu amor." (* texto de Gerbert de Montreuil, parte da Vulgata dos romances arturianos, continuação de "Perceval ou O Romance do Graal", de Chrétiens de Troyes, séc. XII)