Aline T.K.M. | @aline_tkm 01/01/2016Talita poderia muito bem ser o retrato de cada um de nós, algumas décadas mais adiante“Minha boca já não merece beijos. Meu rosto perdeu o viço, meu corpo não seduz mais.” É assim que, em determinado momento, Talita expressa seus sentimentos enquanto rememora os versos de um poema de Pessoa. À beira dos sessenta e do ano 2000.
A vida de Talita passa diante de seus olhos em memórias vívidas de sua infância e juventude. Deixada ainda menina pela mãe na casa dos avós, ela narra as dores, esperanças e aventuras de uma vida experimentada no Rio de Janeiro da segunda metade do século 20, vida que daria um bom romance. De fato, Talita passa a escrever suas lembranças, revivendo os períodos de sofrimento e os de felicidade que se intercalam em sua trajetória.
Entre a dualidade da relação com a mãe e o sofrimento relacionado ao próprio filho, Talita – “a bela Helena” – percorre caminhos sinuosos de adultério, intrigas e desencontros. E ainda há Laerte, uma paixão que aparece e desaparece de sua vida inúmeras vezes, mas cujos rastros jamais se apagam completamente.
Se a princípio eu não tinha ideia sobre o que esperar da leitura, A Bela Helena se revelou uma ótima companhia durante aqueles três ou quatro dias em que devorei o livro. Presente e passado se alternam, descortinando períodos da vida de uma mulher que busca pela felicidade. Ausências e perdas, casamentos fracassados, o afastamento do filho pequeno; a vida de Talita, cuja adolescência se passou nos “anos dourados”, é repleta de grandes traumas e decepções. A trajetória dessa mulher dolorida e forte, mas um tanto solitária, envolve quem a lê e por alguns instantes faz pensar sobre o tempo, sobre o processo necessário e quase nunca indolor que é amadurecer e ingressar na terceira idade.
A prosa gostosa da autora Miriam Mambrini aproxima ainda mais protagonista e leitor, o que faz com que certos momentos da trama – em especial, os mais dolorosos – toquem fundo e deixem resquícios de uma dorzinha aqui dentro. Mas, ponto bom e superválido mencionar, o romance não cai no dramalhão que poderíamos – com certo preconceito, confesso – esperar de histórias que trazem a trajetória de vida de protagonistas sofridas.
Se não traz material para uma reflexão mais profunda, A Bela Helena ao menos faz olhar para as lembranças e pensamentos da protagonista e trazê-los para dentro de si, numa constatação do que é o tempo e do que ele – e nossas próprias escolhas – pode fazer com nossas vidas.
LEIA PORQUE...
Talita, “a bela Helena” e a protagonista deste romance, é o retrato de uma mulher forte, já endurecida da vida e que, como todo ser humano na face da Terra, fez escolhas acertadas e outras nem tanto, bem como sofreu as consequências de escolhas de outras pessoas. Talita poderia muito bem ser o retrato de cada um de nós, algumas décadas mais adiante.
DA EXPERIÊNCIA...
Leitura rápida e gostosa. Foi meu primeiro contato com a escrita de Miriam Mambrini e o saldo foi positivo.
FEZ PENSAR EM...
As mudanças no Rio Janeiro ao longo das décadas em paralelo ao decorrer da vida da protagonista. Este é um caso em que o pano de fundo faz diferença e conversa diretamente com a trama – gosto de livros assim.
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