Dyonathan 25/04/2021
Eu ainda estou aqui. Ainda estou aqui.
"(...) Caso alguém não tenha reparado: Eu ainda estou aqui. Ainda estou aqui."
"Ainda estou aqui" é um livro que emociona e choca:
Emociona ao tratar do Alzheimer de Eunice Paiva. Choca com os relatos de tortura em Rubens Paiva.
Não pensem que aqui é uma "continuação" de "Feliz Ano Velho", porque não é. Sabe o acidente do Marcelo? Ele é citado pouquíssimas vezes ao longo das quase 300 páginas. Como ele mesmo diz no fim de um capítulo: "No fim de 1979, sofri um acidente. Quando acordei na UTI, eu estava paralisado do pescoço para baixo. Ela ficou do meu lado. Mas aí é outro livro." Aqui é sobre Eunice, ela é o destaque. Ela é a heroína.
No decorrer da leitura questionamos o porquê do Alzheimer em Eunice. Porquê uma família que já sofreu tanto, deveria sofrer mais? Porquê Eunice, uma mulher que se reinventou na vida, que nunca chorou em público para não demonstrar fraqueza alguma, que fez direito depois dos 40, se tornou advogada, assessora do Banco Mundial, defensora das causas indígenas, frequentadora de reuniões na ONU, não poderia passar sua aposentadoria calma e tranquila? Eunice queria um descanso. Aquela família merecia um descanso. Contudo, como Marcelo cita no livro, o descanso não chegaria: "Por que provação mais a minha família devia passar? Por que nos testavam até o limite? Chega! Queríamos um descanso. Não teríamos." p.
230"
Existem, ao longo da leitura, páginas e trechos que nos levam as lágrimas sobre o Alzheimer em Eunice. Quando Marcelo fala sobre as fases da doença, citadas pelo Doutor Dráuzio Varela, e o impacto de cada uma em Eunice, é difícil não se emocionar. Tem uma página que me tocou profundamente: a página 250. Essa foi a que me devastou, me fez chorar como criança. Apesar de tudo, de toda confusão, choque, doença, o instinto materno estava lá. Se preparem, porque o primeiro parágrafo aqui vai te fazer chorar copiosamente.
Vale mencionar o bom trabalho do autor em falar mais sobre essa doença, que ainda permanece um mistério em muitas frentes, para o leitor. É feita uma ótima pesquisa contando mais sobre a doença de Alzheimer e como existem muitas incertezas ao redor dela, mesmo em 2015, ano de publicação do livro e com tantos avanços na medicina.
Marcelo também fala sobre os horrores da tortura de seu pai na Ditadura. Mergulha fundo na história que fez o telefone da sua casa tocar naquele dia 20 de janeiro de 1971, feriado no RJ, em que seu pai foi retirado para sempre da vida dele, de sua mãe, e de suas irmãs. Da família Paiva. É chocante algumas páginas sobre a tortura e como após tantos anos, DÉCADAS, o caso parece longe de terminar.
Não podemos flertar, NUNCA, com uma ditadura novamente. E tivemos momentos nos últimos anos, em que flertamos. Que em 2022 vá embora esse Presidente, pelo bem da democracia. Não podemos tolerar mais alguém que demonstra ter saudosismo pela ditadura militar.
Rubens Beyrodt Paiva pode ter sido morto pela ditadura, mas ele jamais será esquecido.
Eunice Paiva morreu em 13 de dezembro de 2018. Ela não está mais aqui em vida, mas sua história estará para sempre neste livro. O Alzheimer não vai levar isso embora. Vai ficar aqui.
Eu ainda estou aqui. AINDA ESTOU AQUI.