L. Gabriel 28/04/2024
"Em 9 de setembro de 1976, dez minutos depois da meia-noite, Mao Tse-tung morreu. Permaneceu lúcido até o fim e em sua mente havia apenas um pensamento: ele e seu poder".
A escritora chinesa Jung Chang e seu marido, o historiador irlandês Jon Halliday, propõem-se a perscrutar toda a vida do líder socialista Mao Tse-tung, responsável por governar a China desde a Revolução de 1949 até o fim de sua vida, em 1976. Em virtude da evidente parcialidade do livro e da ausência de identificação de algumas pessoas entrevistadas (a fim de salvaguardá-las), não surpreende que tenha causado celeuma e polêmica na comunidade da História desde sua publicação em 2005, em virtude das controvérsias sobre o seu rigor científico em alguns trechos. Não obstante, não se pode negar que há um trabalho geral muito bem elaborado a respeito da personalidade megalomaníaca de Mao e das intrigas do Partido Comunista ao longo das décadas.
Chung e Halliday destrincham os contextos sociais de cada etapa da vida de Mao, trazendo informações preciosas não só sobre ele, mas também sobre seus colegas de confiança, como Lin Biao e Chou En-lai. Os trechos de atas e de entrevistas inclusos enriquecem a obra e ajudam a compreender momentos até então nebulosos. Além disso, a quantidade de páginas dedicada à fome causada pelo Grande Salto para Frente evidencia a preocupação dos autores em identificar os impactos de um momento tão desastroso e triste da história humana e quem foram seus culpados. Ademais, à medida que o livro progride, levantam-se dados recolhidos em diferentes países e até com chefes de Estado que conheceram Mao, o que demonstra a dedicação dos pesquisadores.
Entretanto, os autores exageram em algumas adjetivações do presidente, trazendo às vezes uma abordagem caricata que mais prejudica do que auxilia a credibilidade do escrito. Além disso, pela vastidão de acontecimentos registrados, o livro traz uma quantidade considerável de personagens, e diante da numerosidade de nomes, é natural que o leitor possa se perder em relação a "quem é quem". Assim, seria adequado que os escritores rememorassem vez ou outra os papéis sociais ou os principais feitos das personas ao longo do livro para facilitar a lembrança do leitor (isso é feito com alguns personagens, mas com frequência insatisfatória). Um outro problema a ser destacado (que, admito, não sei se é da obra original ou da edição brasileira), é o fato de as fotografias estarem concentradas em apenas dois anexos. A seleção de fotos é ótima, mas seriam muito mais úteis se estivessem dispostas ao longo dos capítulos, pois ilustrariam de imediato os fatos ou pessoas mencionadas e deixariam a leitura do calhamaço mais dinâmica. Inclusive, o segundo anexo traz fotos de acontecimentos que só serão abordados muito adiante no livro, então o leitor observa fotografias de eventos que ainda não é capaz de entender totalmente.
Em suma, a obra merece ser lida por qualquer um que se interesse em conhecer mais sobre a história da China, dos governos socialistas ou, simplesmente, a vida de Mao. Importante ter em mente, contudo, as controvérsias que rondam o livro.