Flávio 20/08/2013
[Resenha] Batman: Gotham City 1889 - Vortex Cultural
Gotham City 1889 foi lançada pela editora Abril em 1990 e foi a primeira história publicada pelo Elseworlds (Túnel do Tempo), que colocava seus personagens clássicos em outras realidades. E que personagem melhor do que Batman para inaugurar esse selo? Ainda mais sendo essa história ambientada na Inglaterra Vitoriana e trazendo como vilão ninguém menos que o maior serial killer que o mundo já teve: Jack, o Estripador. Por que não colocar o maior detetive do mundo para enfrentá-lo?
Essa foi a ideia de Brian Augustyn, roteirista de 1889, ao desenvolver essa história. Apesar da premissa ser algo que poderia ser extraordinária se bem desenvolvida, o roteiro não traz uma grande narrativa ao melhor estilo detetivesco escrito por nomes como Conan Doyle, Allan Poe, Simenon ou Agatha Christie; Augustyn consegue escrever uma plot “redonda”, com um ótimo argumento e colocando o Homem-Morcego em um ambiente propício para suas histórias investigativas.
A trama relata um período logo após os crimes cometidos por “Jack”, um assassino brutal que em 1888 assombrou Londres com seus assassinatos, que após sair impune de todos eles, decide buscar outro local para cometer suas atrocidades e cruza o Atlântico, onde encontra Gotham City. Uma cidade decadente, o cenário perfeito para seus novos crimes.
No mesmo ano, 1889, conhecemos uma figura mítica que se veste como um morcego e se torna o alvo dos noticiarios junto com o assassino. A grande sacada é justamente essa, traçar uma analogia entre elas, e é o que acontece para os habitantes de Gotham e leitores das manchetes de jornais, pois ambos são confundidos como um só, o cruzado mascarado e o assassino vil são consideradas a mesma pessoa para eles e não demora muito para que um inocente seja condenado por crimes que não cometeu.
Temos um roteiro simples mas muito bem amarrado por Brian Augustyn, que além de tudo inunda a HQ de referências steampunk, da própria mitologia do morcegão e da própria época em que foi ambientada, o que só ajuda a enriquecer a obra.
E o que falar da arte?
Mike Mignola, ainda um iniciante no mercado de quadrinhos mas já mostrando a que veio, faz um trabalho gráfico de elevar esta HQ a um novo patamar, que sem dúvida seria muito inferior sem a narrativa visual dele. Para os leitores de comics, não tem quem não conheça o traço de Mignola hoje em dia, mas na época o único grande trabalho dele era Odisséia Cósmica, mas com Gotham 1889 foi onde o devido reconhecimento chegou. A ambientação da história colabora e muito para Mignola deixar sua assinatura soturna com seus traços firmes e composição sóbria de seus personagens e da arquitetura gótica de Gotham. É claro que seu trabalho não seria o mesmo sem a arte-final de Craig Russel e as coloração de David Hornung, que deixam aquela “cereja no bolo”, abusando de tons frios em toda HQ, casando perfeitamente com o estilo do desenhista.
Batman parece estar em seu habitat natural, e ao ler a HQ chegamos a pensar se ele não deveria continuar no século 19 em vez dos tempos atuais. A combinação do personagem, tempo em que vive e a própria cidade é tão forte, que as suas histórias atuais simplesmente deixam de fazer sentido se comparadas (essa é a hora em que as pedras são jogadas).Gotham City 1889 é sem dúvida alguma uma HQ de sutileza, seja ela no roteiro, desenhos, ou no trabalho de cores, pois cada um desses artistas deixam um pouco de si, apesar de o roteiro não ser algo imperdível, é bem escrito e prende a atenção de quem lê.
Um ponto que deve ser comentado é a tradução da HQ, que enquanto lá fora a obra foi lançada como Gaslight, traduzindo seria ”à luz de gás”, e por aqui chegou como Gotham City 1889. A tradução não é ruim, mas perde outra sutileza que a obra teria, Gaslight é como são conhecidos alguns romances do gênero Steampunk, e apesar de não ser uma HQ que faz referência direta a essa vertente (pois não temos uma tecnologia típica do gênero na obra), toda a ambientação típica está lá, e não podemos esquecer que sua continuação Batman: Mestre do Futuro é uma HQ steam sim, mas isto é outra estória.
Se toda série Elseworlds tivesse acertado como aqui, estaríamos repletos de boas histórias, uma pena que nem sempre temos artistas talentosos como é o caso dessa HQ.
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