Babi 07/05/2016 A paixão pelo chocolate não deve ser adiada nem reprimida. Esqueça tudo o que você vai associar a esse título. Paixão por Chocolate não é nenhuma grande história de amor entre um casal de apaixonados. E, sim, uma declaração de amor ao melhor e mais saboroso doce de todos os tempos, o chocolate. Eu confesso que comecei a ler esse livro esperando algum romance de época bem escrito, mas o que eu encontrei foi a história de uma linda e delicada chocolateira de porcelana branca, com uma única identificação em azul em sua base, "Pertenço à Sra Adélaide de France".
A delicada chocolateira, que oferece apenas três xícaras do elixir dos deuses, terá sua história relacionada com as vozes de três mulheres - Sara, Aurora e Mariana - que viveram na cidade de Barcelona em épocas distintas. Cada história é contada do início ao fim, sem que a história das três sejam intercaladas. Talvez esse formato de narrativa tenha prejudicado um pouco o envolvimento com o livro, já que ao terminar cada história a sensação que temos é que terminamos três livros diferentes, ligados apenas pelo destino da peça de porcelana da Sra Adélaide de France.
"As pessoas - é próprio de nossa natureza - entendiam-se com tudo. Com os objetos, com a família, inclusive com elas mesmas. Não importa que tenham tudo o que desejam, que gostem da vida que escolheram ou que compartilhem seus dias com a melhor pessoa do mundo. Mais cedo ou mais tarde, todas acabam se entendiando com tudo." (p. 17)
O diferencial de Paixão por Chocolate é que a autora, Care Santos, escolheu um tipo de narrativa para cada uma das personagens. A primeira história que somos apresentados - que se passa nos tempos modernos - é a de Sara, que tem um narrador em terceira pessoa e onisciente. Sara é uma mulher presa em um triângulo amoroso com seus dois melhores amigos. Se por um lado intelectualmente sua alma gêmea é Max, seu marido, por outro, a alma gêmea de sua parte carnal é Hector, o melhor amigo de seu marido. E o que a chocolateira tem a ver com esse triângulo? Simples, Sara a compra quando sai pela primeira vez com os dois homens de sua vida, depois das aulas do curso de técnicas para chocolateiros que faziam juntos. Assim, a peça de porcelana fina e francesa se transforma no símbolo da amizade dos três.
A história da Sara não me conquistou tanto, algumas cenas eu achei meio forçadas para que a personagem parecesse alguém de mente aberta e rebelde. Algumas partes me empolgavam mais, outras menos. Dessa forma acabei perdendo o ritmo de leitura e perdendo as expectativas com o resto do livro. E que bom que perdi as expectativas! Porque depois da primeira história o livro foi ladeira acima.
"Estou vendo, Sara, que você está interessada em tudo isso que estou contando. Você é daquelas, como eu, que acha que as coisas do passado continuam vivas entre nós." (p. 144)
Ao contrária de Sara, Aurora é uma jovem totalmente submissa que não teve o privilégio de nascer em berço de ouro. Sua mãe era uma simples serviçal da família nobre Turull, do século XIX, e teve complicações no parto - o que a levou à morte, deixando sua recém nascida sob os cuidados da Sra. Hortensia Turull que tinha acabado de dar à luz a uma meninha chamada Cándida. Como um ato de agradecimento por Sra Hortensia ter cuidado de Aurora e ter lhe dado um teto, sua vida foi amarrada para sempre com a de Srta Cándida, a quem servia todas as manhãs o melhor chocolate da cidade em uma pequena chocolateira que dava apenas três pequenas xícaras.
Essa segunda história é narrada em primeira pessoa, como se a Aurora estivesse relembrando para ela mesma vários momentos de sua vida, com frases como "Lembra quando você...". Achei bem interessante esse formato de narrativa, já que ajudou a mostrar o lado humilde da personagem. E apesar de nessa altura do livro ainda não ter me empolgado com a leitura, gostei muito mais da história da Aurora do que a da Sara, pois não senti as cenas forçadas que senti com a primeira história. Mas, ainda sim, senti falta daquele momento em que você se sente totalmente envolvido com os personagens e apegados a eles.
A última história é narrada por forma de cartas escritas por Victor Philibert Guillot, o secretário pessoal das princesas Adélaide e Victoria. Victor foi à Barcelona a pedido da princesa, filha do rei Luíz XV, para investigar uma máquina criada pelo melhor fabricante de chocolates, o Sr Fernández. É, assim, que Monsieur Guillot acaba conhecendo Mariana, mulher do chocolateiro. Essa foi de longe a melhor história do livro! Repleto de mistérios e com uma pitada de romance, tudo narrado com o bom humor do secretário, com quem me identifiquei muito e fez valar o livro todo.
"Não costuma lhe acontecer que, quando move os pés, os pensamentos também se movem, lá em cima? Eu penso muito melhor com os pés em movimento, madame, e já faz muito tempo que descobri isso." (p. 351)
Apesar de ter esperado um pouquinho mais da história da espanhola Care Santos, adorei a oportunidade de ler um livro com uma proposta tão diferente. Sem falar que foi muito agradável passear pelas ruas de Barcelona ao longo dos séculos e sair um pouco do eixo EUA-Inglaterra. Paixão por chocolate é um livro muito bem escrito, cheio de passagens interessantes e marcantes e que vale muito a pena - principalmente pela última história.
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