Lê Golz 12/04/2016Um passado sombrioUm passado sombrio é uma publicação da Bertrand Brasil, escrito por Peter Straub, um renomado autor do gênero terror. Minha curiosidade em ler o livro foi pela sinopse, claro, mas também por nunca ter lido realmente um livro do gênero. Depois de ler uma citação de Stephen King na capa elogiando o livro, minhas expectativas eram altas e achei até que sentiria medo, mas não foi o que aconteceu. E acredito que se realmente tivesse sentido medo, eu teria gostado mais do livro.
Lee Harwell é um escritor de relativo sucesso, que pretende escrever um livro sobre uma noite misteriosa que aconteceu há quarenta anos atrás com seus amigos de infância, inclusive sua esposa. No passado, especificamente em 1966, o guru Spencer Mallon, conquistou os jovens amigos de Lee, que passaram a segui-lo e concordaram em participar de um macabro ritual. O que acontece é que o ritual secreto acaba não funcionando como o planejado, resultando na morte de um deles, cujo corpo foi horrivelmente dilacerado, e o desaparecimento de outro. Os que sobreviveram tiveram suas vidas transformadas de alguma forma, e suas almas abaladas. Agora, Lee tenta desvendar tudo o que aconteceu naquela noite, e para isso precisa reencontrar seus amigos e convencê-los a falar depois de tantos anos.
A narrativa ora acontece em primeira pessoa pelos olhos de Lee, ora pelo relato das pessoas que participaram do ritual. Todas elas têm as suas versões, que devem ser juntadas para que ele finalmente entenda o que todos viram naquela noite. Partindo então dessa premissa, a escrita do autor é clara na maior parte do livro, onde ele trabalha muito bem cada visão dos personagens e seus pensamentos conflitantes. Porém, o primeiro capítulo do livro demorou um pouco a engrenar, pois achei a narrativa um pouco confusa no início. Não digo pela quantidade de personagens e seus respectivos apelidos, que de certa forma também causou confusão, mas algumas frases pareciam sem sentido, talvez tenha sido algum problema na tradução. Contudo, do segundo capítulo em diante, a leitura se tornou mais envolvente e foi mais fácil se familiarizar com os personagens e os acontecimentos.
O que mais gostei no livro foi a construção dos personagens - todos com seus inúmeros defeitos e mistérios. Vou destacar apenas alguns, para não estender a resenha. Hootie, por exemplo, foi o personagem que mais me cativou, tanto por sua inocência, quanto por ter sido ele um dos mais abalados depois da realização do ritual. Eel, a esposa de Lee, que é apelidada assim, mas tem o mesmo nome que o marido (Lee), foi um mistério total desde o início, e ainda, mesmo com o desfecho não confiei totalmente nela. Keith é o personagem mais perturbador. O fato de o autor ter trabalhado crimes que aconteciam na região, e ter levantado as suspeitas para esse personagem, foi algo que me rendeu entusiasmo. Só não vou entrar em detalhes para não soltar spoilers, pois prefiro que o leitor descubra o que esse personagem tem a mostrar ou a esconder.
Apesar dos pontos positivos, o que me fez dar três estrelas, foi principalmente a narrativa confusa em alguns trechos. Mesmo depois que acostumei com o nome dos personagens, fiquei um pouco embaralhada. Por exemplo, como temos dois personagens com o mesmo nome, a Lee, esposa de Lee Harwell, é apelidada de Eel, porém o que poderia facilitar me confundia, pois no mesmo parágrafo ela era chamada mais de uma vez, ora de Eel, ora de Lee, e às vezes, não sabia de quem realmente o autor estava falando. Isso aconteceu com o sobrenome de outros personagens também. Além disso, o medo que pensei sentir quando li a sinopse, não fez nem cócegas, e acredito, como já mencionei, que se tivesse ficado amedrontada com a história ela teria sido mais surpreendente no meu ponto de vista.
"Na elevação escura, três metros a direita do círculo pintado, uma coisa vaga, escura e extremamente zangada tremeluzia dentro e fora do alcance da visão. Algumas moscas giravam tontas sobre ela, atraídas por seu terrível fedor de bode..." (p. 268)
Quanto ao trabalho gráfico da editora, permitiu uma leitura confortável. As folhas são brancas, porém não me atrapalharam, a fonte e espaçamento estão no tamanho ideal, e a revisão apesar de poucos erros, também não atrapalhou a leitura. A capa, sem dúvidas, combina muito com o enredo, o que me agradou bastante.
Em linhas gerais, Um passado sombrio é um livro de terror, que apesar de não ter me causado medo, tem suas passagens bem macabras e aterrorizantes, nada que tenha me surpreendido, mas que pode dar um certo frio na espinha. Apesar disso, temos a construção de ótimos personagens e que irão introduzir, além de um mistério na trama, todos os seus dramas internos e seus maiores defeitos. É uma obra que deve ser lida lentamente a fim de não perder nenhum detalhe. Enfim, o que sempre digo aqui, o que não me agradou, pode agradar você, sem contar que Peter é considerado um dos mestres do horror. Se você gosta de livros nesse estilo, eu recomendo Um passado sombrio.
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