Ari Phanie 27/04/2022"O que estou dizendo é que leva tempo para entender os humanos porque eles não entendem a si mesmos."
Depois de ler The Midnight Library e me apaixonar pela escrita e história criada pelo Matt Haig, resolvi colocar o autor sob o meu radar e investir em outras obras dele, que logo descobri que eram várias das quais nunca ouvi falar. Supostamente ele era um autor subestimado, até sua última obra. E o primeiro livro dele que eu resolvi ler depois de Midnight foi Os Humanos. E, mais um vez, eu tive uma ótima experiência lendo esse autor.
A história já chama atenção na sinopse. Um extraterrestre toma a forma de um ser humano para cumprir uma tarefa de grande importância para a sobrevivência da sua própria espécie e a dos seres humanos também. Ele precisa destruir toda e qualquer existência de informações sobre a teoria que esse humano chamado Andrew Martin conseguiu provar e tudo o que ele descobriu através dela. A tarefa não é simples e esse ser sem nome repudia imensamente estar entre humanos. Para ele, essa espécie é primitiva e repugnante. O que faz sentido diante das informações que ele tem sobre os humanos.
"Os humanos são uma espécie arrogante, definida pela violência e pela ganância. Eles pegaram seu próprio planeta, o único a que atualmente têm acesso, e o colocaram no caminho da destruição. Criaram um mundo de divisões e categorias e têm deixado continuamente de ver as semelhanças entre si mesmos. Desenvolveram a tecnologia em uma velocidade muito rápida para a psicologia humana poder lidar com ela, e ainda assim continuam a perseguir avanço após avanço e, com o objetivo de obter dinheiro e fama, eles têm cada vez mais ansiedade."
Mas ao se infiltrar na família do tal Andrew Martin e conhecer sua esposa e filho, ele começa a notar que esses seres tem muitas nuances. Ele começa a perceber que eles são mesmo violentos, gananciosos e confusos, mas descobre que há muito mais do que isso. Percebe que eles podem fazer coisas incríveis, como a poesia e a música, e que são capazes de ações altruístas como fazer compras para as pessoas que precisam, ou amar e cuidar de outra pessoa sem nenhuma razão aparente. No meio da sua missão, o Andrew ET percebe que é muito difícil não se “contaminar” com sentimentos e afetos como todo e qualquer humano. E percebe que o seu adorado e perfeito mundo há mil anos-luz de distância em que todos pensam no coletivo e ninguém está acima de ninguém, e onde não há nada parecido com família ou casamento ou amor; onde nunca haverá Emily Dickinson ou um cachorro chamado Newton, é um lugar para o qual ele não quer mais retornar.
"O amor provoca medo porque o suga com uma força intensa, um buraco negro supermassivo que não parece nada visto de fora, mas, quando se está dentro, ele desafia qualquer coisa ditada pela razão. A pessoa se perde, como eu me perdi, na mais cálida aniquilação."
E assim, com umas boas doses de humor, poesia, filosofia e matemática, a história mostra as doçuras e agruras de alguém que está se descobrindo humano e descobrindo como é amar um ser humano. Ao acompanhar Andrew ET tentando decifrar as várias dinâmicas desse novo e confuso mundo, nós somos levados a fazer várias reflexões sobre nossas crenças, nossas capacidades e a confusão que é ser da nossa espécie.
Eu adorei esse livro, sinceramente. Acho que o Matt Haig conseguiu captar a essência humana de uma forma tão visceral! E suas reflexões são todas interessantes. Também amei os personagens, mas senti falta de mais cenas com o Gulliver, o filho. Ele tem todos aqueles problemas, e eu senti que deveria ter havido mais espaço e profundidade para o personagem. A conclusão também me pareceu meio desconectada com o começo que para mim pareceu deixar implícito que Andrew ET está falando com os seus conterrâneos, mas até a última página fica claro que o contato com os seus compatriotas não é mais possível, e eu achei essa uma pequena falha narrativa, mas que não influencia a história. Foi apenas porque eu fiquei à espera de um final um pouco diferente.
Em suma, o livro é bem melhor do que eu esperava e eu tinha expectativas altas. O Matt Haig é um escritor muito sensível e que gosta de escrever histórias com grandes análises sobre a vida, e isso me ganhou na primeira vez que o li e nessa também. Por ser alguém que sofreu com problemas de saúde mental, ele consegue mostrar uma sensibilidade e emoção muito latente e realista em suas histórias e personagens. Não vejo a hora de ler mais de suas obras. Recomendadíssimo.
"Um paradoxo. As coisas de que não precisa para viver – livros, arte, cinema, vinho, etc. – são as coisas de que precisa para viver."