Egberto Vital 16/04/2024
Laura, uma mulher lésbica (Ou seria bissexual?), vê-se confrontada com a iminente demolição de seu prédio, no qual ela é a única residente remanescente, é a narradora-protagonista de "Julho é um bom mês para morrer", de @betomenezes.
Certa de que não vai entregar fácil o seu apartamento para uma grande empreiteira de João Pessoa, que comprou todos os outros do edifício, Laura caga para as advertências judiciais, desafia a ordem de despejo, optando por permanecer em sua casa e encarar as consequências sem se dobrar.
No meio de todo esse imbróglio, ela decide escrever uma carta à mãe ausente, Lucy, que a abandonou na infância. Com isso Roberto introduz uma narrativa não linear, em que a memória é uma extensão do corpo e, numa incursão em suas vivências, Laura revisita uma vida marcada por adversidades, obstáculos e enfrentamentos.
No entrelaçamento das memórias de Laura, emerge toda sua revolta pela ausência de Lucy na vida dela e de sua irmã. Sylvia, sua avó, passa a ser o fio condutor dos movimentos de transformação na narrativa da neta. Enquanto sua irmã Lara, seu elo contrastante, revela o sentimento de culpa e a angústia da autorresponsabilização pelo destino alheio. Delineando assim os laços familiares conflitantes que permeiam a jornada de Laura.
A trama é permeada por elementos de uma existência tumultuada, moldada pela rejeição e carência afetiva. Os desafios nos relacionamentos familiares e interpessoais conduzem Laura a buscar na droga e em diferentes crenças uma forma de preencher o vazio existencial, um padrão que se repete constantemente.
O mais interessante é que o eco do homem escritor não emerge na construção de Laura, o que poderia acabar escoando em algum momento, aqui isso não acontece, Laura é uma narradora autônoma e a narrativa é conduzida por sua voz. Roberto se despe de si quando escreve, fica nítido. A virada do século também é um ponto muito interessante e aparece como pano de fundo dos conflitos da protagonista.
O plot twist que introduz o desfecho de Laura é surpreendente, não esperava nunca que o final dela fosse ser o que aconteceu. Beto é foda!
MENEZES, Roberto. Julho é um bom mês pra morrer. 1ª Ed. São Paulo: Patuá, 2015.