Melina21 11/10/2023
Uma carta aberta a Ana C
Você,
Mulher que gostava tanto das cartas e as escrevia com o coração na ponta da caneta escorrendo tinta. Você que, apesar de tantos anos ainda reverbera, ainda ecoa como melodia jazz na boca do violão velho daqui de casa. É que às vezes a cidade do Rio se faz tão quieta, tão solitária. Tento, e muito, transcrever pro papel o que sinto quando te leio, inspirada pela falsa facilidade que suas palavras me enganam. Mas será mesmo que enganam? Ou será que no fundo o barato é justamente brincar de entender. Bom, se entendo ou não renderia outra carta e você mais do que ninguém sabe da dor de cabeça que é colocar o que se pensa no papel, um caminho sem volta. Enfim, me pergunto o que você acharia da nova juventude, da rapidez da comunicação e da ausência - quase completa - disto que estou fazendo agora. Irônico, levando em conta a demora que minha carta levaria pra te encontrar (uma eternidade?). É verdade, a questão epistolar se foi a muito tempo e mesmo assim cá estou, no meu diário/caderno terapêutico (aprendi contigo) redigindo palavras a uma remetente que nunca vai lê-las, será que era assim que tu se sentia? Mulher, a verdade é que você me encanta e me angustia, porque a intensidade que existe aí dentro também é minha. É que nós, meia-bruxas, meia-feras, feminino sagrado em corpo de luz, temos uma certa musicalidade na forma de existir. Aí que dó de quem não reconhece, imagina pra quem não te conhece?
Eu preciso sair mas volto logo, beijo!
- Uma de suas interlocutoras