Tati Tavares 08/05/2017O livro de Stella Florence, trás uma temática muito pouco falada, senão raramente citada no mundo literário: a violência contra a mulher. É dividido em duas partes, entre antes e depois de um ocorrido.
A autora criou uma a protagonista como uma jovem dos dias atuais: despojada e adepta de relacionamentos não fixos, e que facilmente nos identificamos – não somente por esse fato, mas também por seus ideais.
Karina é uma jovem adulta, determinada e casual. Ainda mora com os pais, entretanto se identifica e possui uma relação mais amigável com sua avó Evelyn, apesar da idade. A mãe da garota é obcecada por limpeza e organização, e Karina descreve o lugar como “um típico hospital”, de tão puro que é o ar. A mãe também é um subordinada das antigas. Aquelas mulheres que acreditavam ou ainda acreditam que a mulher deve ficar com o serviço da casa, e o homem, sai para trabalhar para sustentar a família. E para a moça, isso é inadmissível.
Com vinte e poucos anos, Karina é estudante de odontologia, e estagiária na clínica da faculdade. Às vezes trabalha a noite em um bar, o Quintal da Vizinha, de sua Renata, não só pelo dinheiro, mas mais para ajudá-la com o negócio. Os funcionários lá sempre possuem uma desculpa para não ir trabalhar.
Ainda nos primeiros capítulos, que por sinal são curtos e fáceis de leitura, somos introduzidos a Gustavo J. Karina o descreve apenas como um ex namorado não muito desejado, porém mais a frente descobrimos que ele não foi só isso.
Com muita coisa acontecendo em casa, as brigas com a irmã Mariana só aumentando, os pais insistindo para que ela foque somente na faculdade, Karina acaba desistindo de seu estágio, para poder trabalhar no Quintal, o que não deixa seus familiares felizes.
Entre trabalho e boas conversas na noitada, a garota conhece Thiago, um amigo de Renata. Ele parece encantador, e depois de alguns drinques, convence Karina a ir para um lugar mais íntimo com ele.
O rapaz possui um hábito estranho na cama:
“Diz que me ama!
Diz: “Thiago, eu te amo”
Karina não entende, mas mesmo assim o satisfaz. Eles sempre saem, porém para Thiago não passa daquilo, mesmo que ela até deseje algo a mais. Não possuem nada sério, o que faz com que a garota sinta ciúmes toda vez que o vê com “outra”.
E entre um saída e outra, conhecemos Caio, mais um amigo que um parceiro para Karina. Os dois passam a se encontrar sem o objetivo óbvio de uma noite à dois: sexo. Eles possuem uma química que vai além disso.
Ivan, é um romântico a moda antiga. Quer jantar, sair à dois. E isso às vezes assusta a garota.
Karina conhece Lúcio em uma das saídas do bar. Ela vai para a casa dele. Descobre que o cara possui próteses nos braços, apesar de isso atrapalhar Karina em meio ao sexo, ela foca e fecha os olhos. Ele não é como os outros rapazes que eles saíra. É diferente.
“A sombra também faz parte da luz.
Eu só vejo luz na minha frente. Lúcio.”
Ela se sentira diferente. E a partir daquele dia, ela estava determinada de que sexo não era só corpo, não sentiria mais vergonha do que aconteceu, de seu corpo que ganhara uns quilos em meio ao sofrimento, ela agora, se sentia livre.
*
A mente da garota está a mil. Sua amiga Renata está a beira de um fiasco e de fechar o bar do marido, pois ela só entrara com a mão de obra no negócio, e ele, com a grana toda. Karina quer sair da faculdade, e conversa com Evelyn, sua confidente.
A avó lhe da inúmeros conselhos, entre eles o de sair da casa dos pais e ir morar com ela. E, abrir um bar em sociedade com Renata, ela lhe daria a metade do dinheiro.
A princípio ela não quer aceitar, mas se vê obrigada a mudar de vida. Então, conversa com a amiga, e juntas estão dispostas a abrir um novo bar, o Taverna Z.
Quando se encontrou com Lúcio naquela noite, tudo pareceu tão rápido, e nem telefones os dois trocaram. Como eles tinham se conhecido no Quintal – que estava prestes a fechar, Karina resolve fazer algo inusitado, não conta à ninguém, apesar de o pessoal do novo bar notar:
“eusovejoluznaminhafrente@gmail.com”
A garota picha o muro do estabelecimento, na esperança de que Lúcio note ao passar pela rua.
Mas isso não acontece. Passam-se meses, e ele não lhe escreve. Karina fica frustada, pois imagina que o rapaz facilmente pensou que ela era apenas uma garota qualquer de uma noite só.
*
A inauguração do Taverna Z sai como esperado, as meninas estão a todo vapor. E assim segue-se por algumass semanas… Até que Renata decide tomar a frente do negócio, e contratar uma dupla sertaneja para tocar no estabelecimento todo fim de semana. Karina discorda, pois acredita que isso pode ferir a identidade do lugar, e afetar o público que estava frequentando fielmente lá.
Renata discorda, e insiste em fazer o que somente ela acha melhor. Com dívidas e muitos problemas, o bar está em ruína total. Karina se vê desesperada.
Então a história começa a se desenrolar para o leitor. Gustavo J, desde que Karina trabalhava no Quintal, quase todas as noites estava presente, simplesmente para ter uma chance de uma conversa com a moça ao fim do expediente. Mas a moça não se agrada muito disso, e todos seus colegas sabiam disso.
– A seguir contém spoiler.
Na noite em que conhecera Gustavo J, Karina estava completando mais um aniversário… Frustada e desanimada, aceitou ir até a casa do rapaz. Chegando lá, após o jantar, ele bruscamente parte para os “finalmentes”, deixando a protagonista sem chance de reação.
Ela era virgem, e ele até a acusa de não tê-lo avisado que estava menstruada, mas ela não estava. Aquele sangue era a marca do que havia acontecido. E a partir de então, ela se calou por um bom tempo, ganhou alguns quilos e, – inicialmente, começou acreditar que era sua culpa o que havia acontecido.
*
Karina sai da sociedade do bar Taverna Z, ele está preste a falir…
Cansada da insistência de Gustavo J em querer sair com a garota novamente, ela decide “dar um basta”.
Escreve um e-mail de algumas longas páginas, desabafando e dizendo o que estava preso em si por tanto tempo.
*
Confesso que esperava mais do livro. A leitura é rápida e flui facilmente, talvez seja por isso que enfeitiça o leitor a querer saber mais sobre a história. Possui sim um texto de empoderamento feminino, mas retrata muito sutilmente as marcas e sentimentos da garota quanto à violência sofrida.
Queria que Karina detalhasse como se sentia, como e por quê de ter se calado por muito tempo… Mas…
O desfecho da bela, é como sempre pensamos que será quando pensamos em “mulher destemida”. Karina está livre do que por muito tempo te prendeu, e não tem planos para o futuro, somente de que ninguém jamais a possuirá além dela, a não ser que ela queira.
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