Julia G 23/01/2017Depois da última dançaDepois da Última Dança, de Sarra Manning, despertou minha curiosidade por alguns diferentes motivos. Primeiro, porque intercala passado e presente, e alguns dos livros que eu mais gostei tinham essa construção. Em segundo lugar, porque parte da história se passa durante a segunda guerra mundial e, além de adorar tramas que se desenrolam nesse momento histórico, questionei-me se a autora (conhecida por publicar livros mais voltados aos jovens, como Os Adoráveis e Onde Deixarei Meu Coração) conseguiria dar ao enredo a seriedade necessária. Sarra Manning não me decepcionou e conseguiu criar um romance intenso e realista, duro, mas sem deixar de lado a doçura necessária às histórias de amor.
A narração do livro é feita em terceira pessoa e os capítulos se dividem entre os tempos de guerra, em que Rose era uma jovem que fugiu para Londres em busca de um pouco de brilho para sua vida, e os dias atuais, mais focados em Jane, uma mulher incrivelmente bela que pode criar para si várias novas personalidades, mas não consegue ser ela mesma. E o mais interessante: a história dessas duas mulheres se cruza em determinado momento e, ainda que não saibam, elas deixarão suas marcas na história uma da outra.
"Não deveria mesmo se importar se Rose acreditava nela ou não, e Jane não deveria se preocupar. Ela deveria estar ali só de passagem, esse fora o plano, só que não tinha sido bem um plano, e sim mais uma série de eventos catastróficos que haviam colocado Jane na órbita de Rose."
É difícil dizer qual dos trechos é o mais interessante. A vida das duas mulheres possui pontos de luz e de escuridão e ambas são admiráveis e desprezíveis na mesma medida. Quero dizer que as duas erraram e acertaram, tiveram seus momentos de egoísmo e de altruísmo, mas, igualmente, foram moldadas pela dureza da vida. Manning criou personagens críveis, ainda que romantizadas, que podiam não ser exemplos de bom comportamento, mas que faziam seu melhor quando estava ao seu alcance - no caso de Jane, isso acontecia regado pelo interesse próprio, mas acontecia.
Todas essas nuances das personagens, porém, não aparecem de uma única vez, a autora não entregou um pacote pronto. Muito pouco é contado no início e a verdadeira natureza de Jane e Rose não são claras ao leitor, mas, no decorrer dos capítulos, aspectos do passado das duas vão aparecendo e compreende-se as marcas que cada uma carrega.
Além disso, a autora é irritantemente comedida: ela deixa escapar apenas pouco a cada capítulo e assim que alcançamos o ápice daquele momento, ela encerra o trecho de uma personagem e parte para a outra. Isso significa dizer que a curiosidade do leitor é constantemente aguçada, pois há sempre um enredo pendente de conclusão, e a leitura avança sem qualquer dificuldade. Apesar de me sentir um pouco frustrada quando o foco do texto alternava, porque queria muito saber o que acontecia na sequência com a personagem anterior, admito que essa construção foi ousada e magistral, dando ao enredo certa cadência que manteve, durante todo o livro, o bom ritmo da leitura.
"- Quando eu estiver pronta, você vai estar aqui, não vai?
- Querida, eu não vou a lugar nenhum. Vamos cuidar para que você não esteja sozinha.
- Tem que ser você. Você é forte. Vou precisar que você seja forte o bastante por nós duas - disse Rose.
- Não sei se sou tão forte assim - hesitou Jane quando os olhos de Rose, de repente bem focados, olharam bem no fundo dos dela.
- Você é. Como eu era. Acho que nós duas somos bem parecidas. Nenhuma de nós tem medo de enfrentar o futuro de cabeça erguida.
- Ah, Rose, querida, não. Você... - Jane engoliu em seco. - Quando veio para Londres, você estava correndo em direção a alguma coisa. Tudo o que eu já fiz foi correr das coisas."
Os personagens secundários são tão complexos quanto as protagonistas. Os amigos de Rose nos dias atuais, por exemplo, são daqueles que nos tocam o coração, e Charles foi um personagem que se destacou, sobre o qual eu adoraria saber ainda mais. Por outro lado, os parceiros românticos de Rose e de Jane são tão cheios de defeitos que, no início, questionamos se autora pretendia mesmo que elas se apaixonassem por eles, o que parecia bastante difícil de acontecer. Manning, no entanto, conseguiu mostrar também as diversas facetas de Danny, de Edward e de Leo, e o leitor logo se vê sentindo a mesma emoção daquelas mulheres.
O que mais gostei do livro foi o fato de autora ter colocado como protagonistas duas mulheres com tantas diferenças, mas muito semelhantes. Em especial, o fato de que as duas são fortes, independentes e decididas, que se permitem amar e viver com alguém, não para serem subjugadas por qualquer homem, mas para com eles construirem algo, juntos.
Depois da Última Dança é um romance com protagonistas femininas fortes e cheias de defeitos, mas admiráveis mesmo assim, e a leitura é encantadora, deliciosa e apaixonante. Terminei o livro com um sorriso no rosto e acho que a história só não ficou em maior conta comigo porque senti falta de alguma coisa, algo que a destacasse dos demais romances e marcasse a leitura de alguma forma. De todo modo, trata-se de uma bela história, tão séria quando precisava ser e que me fez querer ler outras obras de Sarra Manning.
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