spoiler visualizarIsadora Cecília 30/01/2022
Daqueles que inegavelmente impactam você
Acho péssimo classificar livros em 'um dos melhores que já li' ou rankea-los em Top 5, Top 3 e etc porque acredito que cada obra que lemos mexe de diferentes formas conosco a depender do contexto da nossa história, então qualquer um pode ser ' o melhor livro da vida'. No entanto, Um deus em ruínas definitivamente é um daqueles que você incontestavelmente anseia por recomendar aos melhores amigos, anota as frases em um caderninho de reflexões ou fica por horas a fio pensando na profundidade e genialidade de tudo aquilo e se questionando coisas nunca antes questionadas. Grande parte da minha admiração por essa obra se dá pela narração não cronológica. Os capítulos são nomeados por ano e não estão em sequência, nessa obra 2012 pode vir perfeitamente antes de 1947. Mais do que isso, mesmo dentro do passado há diálogos e acontecimentos do futuro, cada parágrafo pode se tratar de uma época, personagens ou lugares completamente diferentes do anterior, o que a princípio pode ser bastante confuso, mas a autora consegue fazê-lo de forma tão fluída que deixa tudo mais interessante. O tempo recebe um tratamento diferenciado nesse livro e com certeza eleva muito a qualidade do romance. Transitando entre uma simples narração de fatos e lugares, informações técnicas sobre modelos de aviões e planos de voos (o que incrivelmente não é enfadonho) até o conhecimento dos desejos mais íntimos dos atores envolvidos, o narrador faz comentários que se agregam com os pensamentos e ações dos personagens, e a história consegue ter ironia, leveza, empatia e humanidade(incluindo todas as falhas que ser humano implica),tudo isso na dose certa e no momento adequado. A construção dos personagens leva a um reconhecimento de si próprio com as atitudes de todos e você consegue compreender porque as pessoas são como são. Feitas essas conseiderações esse livro me fez ter um novo olhar sobre a 2ª Guerra Mundial, aprendemos na escola que foi a pior guerra em número de óbitos, que houve grandes avanços tecnológicos, que milhões sofreram em campos de concentração e foram dizimados e que o mundo nunca mais foi o mesmo. Contudo, o livro leva a reflexão sobre aqueles que lutaram como indivíduos, vemos números na escola mas não vemos pessoas. Vemos mortos nos livro didáticos e nos esquecemos do que poderia ter sido aquela vida.Deixamos de nos questionar em como se sentiam os que sobreviveram, quais os custos de uma guerra dessa proporção, quem financiou tudo isso, como as cidades bombardeadas foram reconstruídas, quem decidia se as fábricas de armamentos dos adversários seriam atacadas e se valia a pena o efeito colateral de tantos civis mortos. É um livro que faz refletir sobre a existência, sobre a morte (cheguei a conclusão com o livro de que são coisas bem diferentes) e se é possível existir por mais tempo mesmo após morrer. Meu palpite sobre a escolha do título antes de começar a lê-lo e só com o resumo da contra capa, era sobre as ruínas deixadas pela guerra. Ao terminar, acredito que seja, além das ruínas da guerra, algo como todos nós tornaremos ruínas algum dia. Somos deuses(??? com muitas interrogações egóicas aqui) e vamos desaparecer em ruínas do mesmo modo que uma cidade desaparece após ser bombardeada. A Arte (com letra maiúscula para honrar Kate e Sylvie) é a única forma de permanecermos.