Cachorros de Palha

Cachorros de Palha John Gray




Resenhas - Cachorros de Palha


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Gabriel 03/10/2023

Neste compilado de ensaios pungentes e objetivos, John Gray disseca a realidade crua da natureza humana, trazendo reflexões ora preciosas, ora indigestas. Apesar da retórica de manifesto belicoso em alguns momentos, o livro é muito bem escrito e altamente convidativo para o leitor. É certo que não há uma ordem pré-estabelecida para leitura dos ensaios, que são independentes uns dos outros, mas ainda assim nota-se a coesão do conjunto ao fim da leitura.

Naturalmente pode haver dificuldade de entendimento daquilo que Gray realmente aborda, especialmente para quem cresceu imerso e enraizado na cultura cristã e moralizante. Contudo, o autor é didático ao tratar da relação entre humanismo e cristianismo, esclarecendo como o primeiro é apenas uma projeção secular do segundo, e como isso se relaciona com as nossas falsas impressões a respeito de nós mesmos.

O objeto principal do livro é demonstrar as lacunas messiânicas da crença no progresso, sustentadas hoje pela ciência. Gray acertadamente relembra que o progresso é sempre tecnológico, não necessariamente ético; que as tecnologias podem nos ajudar a lidar melhor com nossas necessidades, mas não nos ajudar a superá-las.

No fim das contas, fica evidente que as premissas trazidas no livro, especialmente a de que o homem nada mais é do que uma espécie que partilha a sua vida neste mundo com outras espécies, nada tendo que o torne superior, são plausíveis.

É evidente que as assertivas curtas lançadas por Gray estão amparadas por reflexões bem desenvolvidas durante todo o livro. O lapso de Gray, no entanto, é partir de exemplos grosseiros e vulgares da realidade humana para pautar todas as suas conclusões.

Concluir que a natureza instintiva da espécie pode tanto criar genocídios e devastações catastróficas como arte rupestre e Homero dos um pouco exagerado. Ainda assim, se analisarmos sob uma ótica puramente fria, não restam dúvidas quanto à constatação de que o nosso modo de pensar e enxergar o mundo hoje é fruto de uma determinada época, não havendo necessariamente nenhuma relação direta com alguma verdade abstrata e objetiva.

De todo modo, é um livro muito bem escrito, sem desperdício de palavras, com reflexões altamente preciosas até para quem se opõe às convicções do autor e com uma grande quantidade de referências da filosofia à ciência em geral.
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favero.o 29/12/2022

"Os humanos são como qualquer outra praga animal. Não podem destruir a terra, mas podem facilmente danificar o ambiente que os sustenta."
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Favero 13/06/2022

"A verdade não é que tememos o passar do tempo porque conhecemos a morte -- tememos a morte porque resistimos ao passar do tempo." -Cachorros de palha
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jota 28/03/2012

Cachorradas humanas
Cachorros de Palha tem como subtítulo Reflexões Sobre Humanos e Outros Animais (e é sobre isso que o livro é de fato) e além delas (muitas delas polêmicas, claro) também conta com alentadas referências bibliográficas (Leituras Adicionais) e Índice Remissivo.

Não espere muita moleza da parte de Gray ao colocar suas ideias embora o livro não seja tão enrolado quanto possa supor nossa vã filosofia antes de lê-lo. Mas ele está cheio de termos técnicos de diversas áreas sim, ainda que não seja necessário interromper a leitura para buscar um dicionário ou outro tipo de auxílio luxuoso.

Em resumo Gray afirma que a vida é uma casualidade, que a espécie humana, em sua essência, pouco difere das demais espécies vivas. Mas o ser humano, crente que é o centro do universo (antropocentrismo), que é obra divina (ou até mesmo um superhomem, segundo a ideia nietzschiana), não aceita que sua existência seja inteiramente acidental (uma vez surgida, evoluiu pela seleção natural de mutações randônicas).

Só que os humanos têm uma situação privilegiada em relação aos demais seres vivos - o homem sabe que sua existência é um acidente e somente ele pode assumir seu destino. Ao contrário de tudo mais que compõe a vida terrestre.

O problema é que nesse tal de “assumir seu destino” o homem, com a ajuda da ciência e tecnologia (informática, medicina, nanotecnologia, etc.), e buscando cada vez mais o ócio, o prazer, a felicidade e outros mimos, deixou de ser “sapiens” para se transformar naquilo que Gray chama de “homo rapiens”, ou rapace, destruidor de animais e plantas, água e outros bens naturais preciosos, etc.

Enquanto vai desenvolvendo seu raciocínio pessimista, há algumas partes bastante interessantes em que Gray se vale de argumentos de diversos filósofos de várias épocas, para concordar ou discordar deles, como Kant, Schopenhauer, Nietzsche, Heidegger, Wittgenstein, Platão, Descartes, etc. e até mesmo discorre sobre obras de ficção como Lord Jim, de Joseph Conrad e Utz, de Bruce Chatwin, etc.

Toda a desesperança que Gray nos traz ao final da leitura ele chama na verdade de “libertação” e o que ele pretende é “sugerir ao leitor que leve sua vida da maneira mais bela e inteligente possível, pois o destino da Terra não está sobre seus ombros. (...) A necessidade de acreditar que o futuro será melhor é uma ilusão. A felicidade não vem daí, mas de aceitar a nossa natureza animal, que, ao contrário das crenças, é imutável.”

Discordando ou concordando com as ideias de John Gray, uma coisa é certa: Cachorros de Palha é leitura para botar os neurônios em efervescência. E isso é lá ruim?

Lido entre 25 e 28.03.2012.
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Wellington V. 28/02/2010

Um mundo empalhado - e real

(Não vou dizer como o livro chegou até mim. Antes, direi como eu cheguei até ele, porque foi exatamente isso que aconteceu.

Eu estava folheando um exemplar da revista Veja, na escola em que eu trabalhava até 2007, quando uma certa entrevista -- naquelas páginas amarelas da Veja -- me chamou a atenção pelo título, "O peso das ilusões". Lendo mais um pouco, notei ser uma entrevista de cunho filosófico. E isto me bastou para ler até o fim. Inclusive guardo comigo as páginas daquela entrevista...

Há pelo menos uns quatro anos que queria comprar esse ensaio "britânico" sobre o destino da humanidade. E foi o que fiz ontem, dia 27/02/2010. Deu um pouco de trabalho para encontrá-lo, mas achei-o e tentei esconder, o máximo que pude, da vendedora, o meu incessante desejo de obtê-lo. Mas tal desejo tornou-se claro...)

"Não podemos nos livrar das ilusões. A ilusão é nossa condição natural. Por que não aceitá-la?" (GRAY, 2009, p. 98)

Semelhante citação encerra em si um misto de budismo, niilismo(?), conformação pessimista (meu Deus! Será que tal termo existia antes de eu "trazê-lo" até aqui?) e, por que não, psicologia? (sinto até um "aroma" de auto-ajuda -- BRRRR! -- nisso). Digamos até que esse trecho, pertencente ao capítulo 2, "O Engano", subcapítulo 14, "O Derradeiro Sonho". E há paralelos textuais (leia-se intertextualidade, esse "fenômeno linguístico") com outros ensaios filosóficos ao longo das 255 páginas do livro.

Lao-Tsé (1324? a.C. - 1408? a.C.) trouxe a "palha", empregada por Gray na epígrafe do livro. O inglês "dissecou-a", fazendo afirmações (apontamentos), indagações e proposições para que possamos rever nossas vidas enquanto seres humanos -- ou animais (racionais?).

Há uma questão final bem direta e clara, como, segundo Burini (2001, informação verbal), cabe à toda boa conclusão de monografia (e eu pressuponho que tal característica caiba, também, a outros tipos de redação, como ensaios, dissertações e teses): "Será que não podemos pensar o propósito da vida como sendo simplesmente ver?" (id., ibid,. p. 212)


Referência bibliográfica


GRAY, John. Cachorros de palha. 6 ed. Trad. Maria Lucia de Oliveira. Rio de Janeiro: Record, 2009. 255 p.


Para quem quiser entender melhor o pensamento do autor, acesse:

http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT1094439-1666,00.html
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Andarilho 03/08/2009

Se tomarmos apenas os méritos literários de "Cachorros de Palha", somos obrigados a concordar que é um livro muito bem escrito, de forma realmente clara e sem jargão, além de trazer dados empíricos muito interessantes e suscita discussões excelentes.

Contudo, é difícil ler o livro e não perceber a atitude arrogante e contraditória do autor, que ao mesmo tempo que diz que o ser humano não tem salvação, que a verdade não liberta (e criticando todos os profetas que tentaram fazer isto), também diz o que devemos fazer para continuarmos vivendo uma vida menos miserável.

No fundo, toda a argumentação levantada por Gray depende de um pressuposto que não pode ser provado - a impossibilidade da salvação moral da humanidade. Claro, como disse meu professor "toda filosofia é dependente da opinião", mas não vejo muito uso em escrever um livro para dizer para as pessoas que elas estão perdidas e que não há nada que possamos fazer a respeito.

Enfim, um bom livro, apesar dos pesares.
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