desencaixados 23/05/2017
UM DOS MELHORES LIVROS QUE LI EM 2017
Voltando tarde da noite para casa, Carlos decide cortar caminho pelo Parque Treze de Maio com o intuito de chegar mais rápido ao ponto de ônibus. O parque já estava próximo a fechar e o garoto presencia uma das piores cenas de sua vida. Mais a frente — no parque — um grupo de garotos encapuzados estavam rodeando um morador de rua fazendo ameaças horríveis, infelizmente o final daquela situação não foi positiva. O morador de rua que nada tinha feito foi morto com dois tiros na cabeça, a notícia passou em vários jornais e já em casa — após o acontecimento — Carlos queria ir à delegacia contar o que tinha ouvido nos assassinos, mas sua mãe muito conservadora preferiu que ele não entrasse no meio da história.
Alguns dias atrás Carlos brigou com seu melhor amigo, Márcio. Tudo aconteceu quando eles estavam comemorando o último ano escolar da turma e muitos ali estavam esperando o resultado dos vestibulares, então tudo era motivo de comemoração. Durante a festa quase todos já estavam alcoolizados e Guilherme — um garoto totalmente intolerante e rico — inventa de cheirar cocaína e distribuir entre os participantes da festa, aquele ato causou discórdia e acabou com uma briga entre Márcio e Guilherme.
"Com raiva desliguei a TV. Era tão inacreditável ver a cara de que a repórter fez depois de ter anunciado uma brutalidade daquelas. Ela parecia feliz em noticiar as atrações para o final de semana, como se isso fosse nada, como se aquela notícia fosse tão comum que não fizesse diferença para ninguém o fato ocorrido, como se as atrações para o final de semana fossem muito mais importantes do que aquele crime. (página 21)"
Foi durante essa briga que Carlos e todos os seus amigos descobriram que Márcio é homossexual — não direi como, pois é considerado spoiler —, a forma que a maioria das pessoas soube da “noticia” foi totalmente cruel e sem noção, principalmente da parte do seu melhor amigo. Inconformado com tudo que havia acontecido, Carlos resolve criar um blog com o nome O Meu Melhor Amigo é Gay para tentar reconciliar a sua amizade com Márcio, só que as coisas estavam mais do que complicadas. Um grupo de jovens intolerantes estavam matando pessoas que se encaixam como minorias pela sociedade — moradores de rua, travesti, crianças carentes, índios e afins —, além disso, o seu amigo que também é considerado como minoria estava sem dar notícias e tinha acabado de ser expulso de casa.
Infelizmente a introdução da obra vai ficando por aqui, pois durante a leitura acompanhamos Carlos publicando em seu blog sobre a sua amizade com Márcio. Eu não posso dar continuidade a trama inicial, pois tenho medo de soltar algum spoiler sem perceber, então para não estragar a leitura de ninguém eu prefiro deixar vocês com a curiosidade do que aconteceu com Márcio e como ele está lidando com os acontecimentos. Mas é válido lembrar que durante a resenha irei abordar assuntos importantes da história que vão ajudar vocês terem uma visão mais ampla da obra.
O Meu Melhor Amigo é Gay, de Dielson Vilela é um livro totalmente gritante e importante na sociedade que vivemos. Ele foi publicado pela Editora Coerência, é uma literatura LGBT e aborda assuntos muito relevantes.
Esse foi o segundo livro que fiz a leitura com a temática LGBT. Com disse na resenha de Não Tão Primos, eu estava muito incomodado com a minha ausência na literatura LGBT, mas acabei recebendo a proposta da Editora Coerência e recebi alguns exemplares da editora e entre eles vieram os dois — Não Tão Primos e O Meu Melhor Amigo é Gay. — As minhas expectativas com essa obra estavam altas e felizmente o autor conseguiu alcançar todas elas.
Como muitas pessoas vem dizendo; o livro é necessário. Quando falando de livros com personagens homossexuais, transexuais e afins, sempre pensamos em críticas sociais sobre aquele público, e foi justamente isso que pensei quando comecei a fazer a leitura de O Meu Melhor Amigo é Gay. Felizmente o Dielson conseguiu quebrar positivamente as minhas expectativas, pois além das críticas sociais com os LGBTs ele conseguiu fazer alertar sociais com todas as outras “minorias” que a sociedade rótula. Eu fiquei extremante feliz por isso, pois ele conseguiu falar sobre homofobia, transfobia, falsos cristãos, contradição bíblica e intolerância religiosa e cultural — é válido lembrar que o autor não desrespeita nenhuma religião.
O bom de tudo isso é que o autor não para por ai, ele não elimina os personagens principais e “secundários” das intolerâncias e ignorância ao assunto, o foco é mantido o tempo inteiro e a forma que os personagens lidam com as minorias me incomodou bastante — é intencional da parte do autor —, pois personagens que eu não esperava cometeram homofobia com muita agressão verbal. Mas por outro lado eu super entendo a intenção do autor, pois durante a leitura as coisas vão se encaixando e alguns personagens deixam de serem alienados. Um grande exemplo e que não é considerado spoiler é o protagonista Carlos.
Outro ponto super relevante que o autor pensou muito bem foi a forma que Carlos lidar com a homossexualidade no geral. Depois de presenciar a morte do morador de rua e reconhecer o erro, aparentemente ele pesquisa sobre o assunto e melhora o seu entendimento sobre em relação as intolerâncias da sociedade, só que é muito comum as pessoas que estão começando a entender sobre sexualidade usar o termo “opção sexual” — o termo certo é orientação sexual, ninguém escolhe a sexualidade, muito pelo contrário, ela se orienta —, eu fiquei muito feliz em saber que Dielson Vilela conseguiu ficar atento com esse detalhe, assim enriquecendo MUITO a história tornando-a mais realista.
Esteriótipo é outro assunto que o autor destrói por completo, pois Márcio — o protagonista homossexual — é extremamente diferente do que a sociedade tem costume de rotular com o LGBT. Ele é muito bom em futebol, já beijou várias meninas — o que é considerado fachada — e em nenhum momento fez com que seus amigos percebessem a sua verdadeira sexualidade. Em comum com os outros homossexuais, mas não posso generalizar porque nem todos são assim, Márcio defendia um colega de classe que tinha trejeitos afeminados e muitas das vezes ele já foi “xingado” por defender o garoto, mas fora isso os esteriótipos são eliminados por completo.
"— Não, você não vai saber. Você nunca vai saber o que é ter medo de ser você mesmo só porque as pessoas preferem não lhe entender e respeitar. (página 111)"
Eu acho que deixei bem nítido que os personagens criados pelo Dielson Vilela foram muito bem projetados, mas é válido lembrar que todos eles têm muito que nos ensinarem durante a leitura do livro. O legal de tudo isso, é que cada um é capaz de nos surpreender de formas diferentes, seja os protagonistas ou personagens secundários, todos eles nos ensinam lições de vida extremamente importantes para uma vida socialmente saudável.
O cenário escolhido pelo autor foi muito bem descrito, até porque ele mora no local e conseguiu nos passar informações muito relevantes; como o Parque Treze de Maio e outros locais citados durante a história. O que podemos adicionar como mais um ponto positivo, pois torna a história mais real. Andei pesquisando no Google e infelizmente alguns ou todos os casos citados na história são baseados em fatos reais, Dielson até colocou na dedicatória o nome deles para um melhor entendimento.
A diagramação do livro está impecável, o trabalho editorial da Coerência sempre me surpreende e em O Meu Melhor Amigo é Gay eles conseguiram ser muito criativos. Em cada capítulo é encontrado uma layout de website como se fosse as publicações do blog que Carlos estava escrevendo, além disso, em alguns capítulos também encontramos plataforma de “CARREGANDO” e no final da livro tem a ferramente de formatos para finalizar a sua utilização com o notebook/computador. A capa do livro é muito coerente com a história, o notebook aberto na parte da frente e fechado atrás condiz muito com todo o enredo, sem falar que a fonte e o espaçamento das palavras são ótimos e colabora para uma leitura muito prazerosa.
Sinceramente, eu me apeguei tanto na história que fiz a leitura em menos de 24 horas e devido ao final da obra eu chorei muito. Não sou de me emocionar com livros, mas a forma que me apeguei aos personagens e torci para que tudo desse certo, mexeu com meus sentimentos e chorei feito criança — de revolta — com o final da história, e para não estragar a leitura de vocês, eu recomendo não olharem as últimas páginas pode ser um GRANDE spoiler.
Portanto, eu vou usar o rótulo que as pessoas estão usando para definir o livro e fazer uma indicação em especial; o livro é necessário para você que infelizmente é intolerante ou não acha certo determinada decisão, o livro é necessário para você que avha certo engavetar um crime, o livro é necessário para você que acha certo e comum filhos de organizadores de instituições — igrejas — serem extremamente agitados, o livro é necessário para você que não importa com os sentimentos dos outros, ou seja, o livro é necessário para qualquer pessoa que prefere julgar e apontar o dedo antes de realmente conhecer a vitima.
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