Cartas a Cristina

Cartas a Cristina Paulo Freire




Resenhas -


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WellingtonBSA 27/12/2023

Sempre bom me encontrar novamente com Paulo Freire. Neste livro, ele é só o Tio Paulo, contando as histórias de sua vida e de sua obra de forma familiar e próxima. As histórias do Tio Paulo ajudam a entender como ele se tornou o grande Paulo Freire, e essas histórias por diversas vezes se confudem com a história de nossas famílias e de nosso país. Grata surpresa foram as notas explicativas da esposa de Paulo, que enriquecem grandemente esta obra.
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Fabricio.Macedo 21/05/2023

Um texto onde Paulo Freire conta por meio de cartas sua história de vida e suas experiências com a educação. É um texto memorial desse grande mestre. Como já disse aqui, Paulo Freire é um profeta da educação brasileira que a seu tempo lutou por tanto. A organização das cartas assim como as notas feitas por Ana Maria Freire dão um toque final ao livro.
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jmrainho 13/11/2016

Direita, esquerda; volver, estudante!
Paulo Freire é reconhecidamente um dos maiores educadores brasileiros. E sua obra esta cada vez mais atual. Neste livro são reproduzidas - editadas - a correspondência de Paulo Freire a sua sobrinha quando estava no exílio na Suíça. A pedido dela, conta sua história; de como se tornou educador e o contexto da infância e juventude.

Freire foi exilado como dezenas de outros brasileiros de forma estúpida pela ditadura estúpida. Talvez por ser barbudo achavam que era um revolucionário comunista. É cômico pensar em Paulo Freire vestido de uniforme de guerrilha, de coturno e arma em punho para atuar na "revolução", fruto do delírio dos ditadores da época. Mas era isso que eles pensavam do educador.

O livro mostra a infância difícil de Freire. O pai, ex-integrante do exército e depois da polícia militar de Pernambuco, aposentou-se precocemente por razões médicas e para não se tornar matador, destino de boa parte de seus colegas no contexto autoritário da época. Com dificuldades financeiras, a família Freire saiu da capital Recife, para a pequena Jaboatão. Passaram necessidades financeiras e discriminação. A mãe foi humilhada publicamente por comerciantes que lhe vendiam fiado. Seu pai morre e agrava-se a situação. Mas seus irmãos e irmãs sobrevivem com dignidade e conseguem dar uma guinada para um destino cidadão. A volta a Recife, o estudo numa escola pública de qualidade, o convívio com grandes educadores da época e da região, a formação como professor de Português. Paulo Freire poderia ter sido vitima das circunstâncias, da pobreza forçada. Mas a educação mudou seu destino, e sua determinação também, sem perder as referências com suas origens, as origens de seu povo sofrido. E a percepção que as pessoas precisavam melhorar seu nível intelectual e educacional para ter consciência do mundo em que vivem, de sua condição social, dos dificultadores econômicos e políticos, e as alternativas a disposição das pessoas de bem incorruptíveis. Atuou como gestor no Sesi, entidade patronal de "relações contraditórias com a classe operária", e onde fez um trabalho notável de gestão participativa e democrática. Depois, no Movimento de Cultura Popular, na Universidade Federal de Pernambuco, a experiência na Alfabetização de Adultos.

No livro, publicado em 1994, Paulo Freire fala do conceito de Direita e Esquerda na política, que existe sim, apesar da tentativa fascista de inventar um mundo sem partido e sem ideologia. Dizendo-se politicamente comprometido (com a verdade e a democracia e não com partidos), criticava a direita reacionária e parte da esquerda com pretensões ditatoriais, que odeia a democracia. Dizia-se, acertadamente, um "educador progressista" Também tinha orgulho de sua crença cristã, o que incomoda ainda hoje parte da intelligentia, que por uma razão pouco racional, acha que o intelectual deve ser ateu, como se a religião fosse antagonista da razão.

Quase 1/3 do livro são notas explicativas de Ana Maria Araújo Freire, última companheira do mestre e herdeira oficial de seu legado.

TRECHOS

Nunca vivo um tempo de puro escrever, porque para mim o tempo de escrita é tempo de leitura e de releituras.

O que se espera de quem escreve com responsabilidade é a busca permanente, incansável, da pureza que recusa a hipocrisia puritana ou a desfaçatez da sem-vergonhice.

Homens existencialmente cansados e historicamente anestesiados.
Negar a crítica em função do erro tático é uma forma de opor-se ao sonho estratégico. O educador progressista coerente tem de estar atento às relações, sempre tensas, entre tática e estratégia.

Valeu muito mais para mim surpreender, aflito, meu pai em seu quarto, escondido dos filhos e da filha, chorando, sentado à cama, ao lado da sua mulher, nossa mãe, pela impotência diante dos obstáculos a vencer para oferecer um mínimo de conforto a sua família.
Aprendi na minha infância atribulada e convivendo com a dor moral de meus pais.

Expulsão escolar, ingênua ou astutamente chamada evasão escolar.

Talvez nunca, mais do que hoje, as classes dominantes se sentiram tão livres em campo para a prática manipuladora. A pós-modernidade reacionária vem tendo certo êxito na sua propaganda ideológica ao proclamar o sumiço das ideologias.

A esquerda e a direita estão aí vivas, mas é preciso, do ponto de vista da direita, apregoar que já não existem, oque significa revigorar a direita.
Os neoliberais que trombeteiam a inexistência das classes sociais, portanto da luta entre elas, espumam de raiva quando não se acredita no seu discurso.

Eu me empenhava em fazer uma escola democrática, estimulando a curiosidade critica dos educandos, uma escola que, sendo superada, fosse substituída por outra em que já não se apelasse para a memorização mecânica dos conteúdos transferidos, mas em que ensinar e aprender fossem partes inseparáveis de um mesmo processo, o de conhecer.

A aprendizagem dos educandos tem que ver com a docência dos professores e professoras, com sua seriedade, com sua competência científica, com sua amorosidade, com seu humor, com sua clareza política, com sua coerência.

Era preciso estarmos de olhos abertos para evitar, rigorosamente, qualquer dicotomia entre fazer e pensar entre prática e teoria, entre saber ou aprender técnicas e conhecer a razão de ser da própria técnica entre educação e política, entre informação e formação.
Na verdade, toda informação traz em si a possibilidade de seu alongamento em formação, desde que os conteúdos constituintes da informação sejam assenhoriados pelo informado e não por ele engolidos ou a ele simplesmente justapostos. Neste caso, a informação não comunica, veicula comunicados, palavras de o ordem.
Informação é comunicante, ou gera comunicação, quando aquele, a quem se informa algo, apreende a substantividade do conteúdo sendo informado, quando o que recebe a informação vai mais além do ato de receber e, recriando a recepção, vai transformando-a em produção de conhecimento do comunicado, vai se tornando também sujeito do processo de informação que vira por isso formação. A formação, por sua vez, não pode dar-se na limitação a crítica e asfixiante dos especialismos. Só há formação na medida em que vamos mai salém dos limites de um saber puramente utilitário.

Não vale, por outro lado, a prática educativa que fique apenas na denúncia e no anúncio, no alumbramento em face do sonho, e se esqueça ou minimize a preparação técnica, a instrumentação para o trabalho.
Aprendizado, por exemplo, da importância incalculável da informação e da formação, quer dizer, da informação que no processo, vai virando formação.

[Um diretor do Sesi queria impor o uso de bonés para os funcionários. Achava uma ideia boa, sem consultar quem fosse usa-los. Freire fez uma consulta, e os funcionários rechaçaram a ideia, que vinha de cima para baixo, como quase sempre]. O caso do boné virou, na minha história de vida, um caso exemplar: Quantos "bonés" não vem sendo impostos a nós sem que tenhamos sido consultados e , ainda, em nome de nosso interesse e de nosso bem-estar".

A prática precisa da teoria, a teoria precisa da prática, assim como o peixe precisa da água despoluída.

a concepção mecanicista da história, em que o futuro, desproblematizado, é algo conhecido por antecipação, o papel da educação é transferir pacotes de conhecimentos previamente sabidos como úteis à chegada do futuro já conhecido. Na concepção dialética, por isso mesmo não mecanicista, da História, o futuro eclode da transformação do presente como um dado dando-se. Daí o caráter problemático e não inexorável do futuro. O futuro não é o que tem de ser, mas o que façamos com ele do presente.
História como possibilidade. Começa que não há um só futuro, mas diferentes hipóteses de futuro. Os homens e mulheres são seres programados, condicionados, mas não determinados. E porque além de ser se sabem condicionados, podem intervir no próprio condicionamento.

Não há prática educativa que não se direcione para um certo objetivo, que não envolva um certo sonho, uma certa utopia. Não poder ser a prática educativa neutra.

O processo discriminatório gera em quem discrimina um mecanismo de defesa que quase os petrifica ou os impermeabiliza. Às vezes, até parece que se convencem, mas não se convertem. Intelectualmente, aceitam que se contradizem, mas, visceralmente, não se sentem em contradição.

Liberdade de imprensa não é licenciosidade de imprensa. Só é livre a imprensa que não mente, que não retorce, que não calunia, que não se omite, que respeita o pensamento dos entrevistados.
Defender nossos direitos não é prova de autoritarismo, é sinal de amor à liberdade, à democracia e à justiça.
O fracasso dos jovens negros não é de sua responsabilidade, mas da política discriminatória contra eles.
A tomada de consciência é o ponto de partida.
A curiosidade que chamo epistemológica, apreender não o ou um objeto em si, mas a relação dos objetos entre si, percebendo a razão de ser dos mesmos.

A questão da violência não só física, direta, mas sub-reptícia, simbólica, violência e fome e interesses econômicos das grandes potências, violência e religião, violência e política, violência e racismo, violência e sexismo, violência e classe social.
A paz, porém, não precede a justiça. Por isso a melhor maneira de lutar pela paz é fazer justiça.
Não podemos aceitar o que venho chamando "fatalismo libertador", que implica o futuro desproblematizado, o futuro inexorável, não podemos igualmente aceitar a dominação como fatalidade.
Sonhar com este mundo, porém, não basta para que ele se concretize. Precisamos de lutar incessantemente para construí-lo.
A liberdade não se recebe de presente.



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