Cristiane.Brasil 29/04/2023
Os 13 Tique-Taques
The 13 Clocks contém todos os elementos essenciais de um bom conto de fadas. Há o príncipe que se faz passar por um pobre menestrel, a princesa que é encarcerada no castelo pelo duque malvado, a missão que precisa ser cumprida num prazo praticamente impossível. Esse limite de tempo é vital à trama, uma vez que o duque afirma ter ?assassinado? o tempo, e os 13 relógios do castelo se encontram congelados às 4h50. Cabe ao príncipe encontrar um precioso tesouro e entregá-lo assim que os relógios marcarem as 5h. Sua única esperança é o Golux, um minúsculo mago que ostenta uma estranha lógica e um indescritível chapéu.
O castelo é um lugar perigoso, ruidosamente protegido por enormes guardas metálicos, silenciosamente controlados pelos espiões encapuzados do duque. Criaturas assombradas espreitam na escuridão das masmorras. Toques de absurdo fazem contraponto a essa atmosfera de horror. Bolas multicoloridas ricocheteiam pelas escadarias nos momentos mais improváveis - serão os fantasmas de crianças assassinadas que brincam lá em cima? Risadas distantes sugerem que sim. A história também possui traços de parábola: o amor acaba vencendo, o tempo é descongelado, e o mal? se dá mal. Nas páginas finais, o duque é perseguido por uma ?golha de bosma? que cheira a quartos velhos que não se abrem mais e ressoa como coelhos a gritar.
A linguagem é extraordinariamente criativa, e o tom, perversamente irônico: marcas registradas de um dos mais admirados e polêmicos humoristas da primeira metade do século XX. À época em que escrevia The 13 Clocks, Thurber quase não enxergava mais, e diversas passagens do livro (em que figuras vagas se deslocam nas sombras, feixes de luz atravessam os cômodos escuros, raios subitamente iluminam o breu da noite) sugerem a preocupação do autor com a cegueira que estava por vir.
A introdução é de Neil Gaiman que descreve ?é capaz de ser o melhor livro do mundo. E mesmo que não seja o melhor livro do mundo, ainda assim ele é, de certo, algo nunca antes visto, e, até onde me consta, nunca se viu algo como ele desde então.?
Trecho:
?Metade dos lugares a que já fui nunca existiu. Eu invento e reinvento. Metade do que digo que há não se encontrará. Quando eu era moço, falei de ouro enterrado na mata e homens correram léguas para a matar cavar. Até eu cabei.?
?Mas por quê??
?Achei que a lorota fosse verdade.?
?Mas você disse que inventou.?
?Eu sei, mas não sabia mais. Eu também esqueço.?