O Óbvio Ululante: As Primeiras Confissões

O Óbvio Ululante: As Primeiras Confissões Nelson Rodrigues




Resenhas - O Óbvio Ululante


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Darcio 16/01/2024

Ótimas crônicas.
Grandes crônicas de Nelson, seu sarcasmo, exagero nós leva a entender o Brasil de seu tempo, e um pouco como esse grande brasileiro via esse país.
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Wilson 18/06/2023

Essencial
Nelson Rodrigues, sem dúvidas, foi um dos maiores gênios que este país já teve. Pena que não é valorizado como deveria nos tempos modernos. Apenas leiam. Apesar de serem crônicas do século passado, continuam ecoando na atualidade.
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Gustav.Barbosa 10/03/2023

Obviamente Nelson
"Tudo é memória", já dizia não sei quem. "Tudo é autobiografia", já dizia Saramago. Nelson Rodrigues une reminiscências pueris com convicções patentes. Põe seu trauma de não ter um pão com ovo para comer na merenda da escola ao lado de suas obsessões pela juventude progressista e personagens cotidianos da política brasileira da década de 1960. Rodrigues faz um verdadeiro retrato da sociedade carioca da época. E como em fotografias antigas às vezes precisamos de legenda, aqui também é bom fazer um estudo prévio do estado de coisas da sociedade brasileira e estrangeira.

Década de 1960. O Brasil iniciava seus duros anos de ditadura militar. A Guerra do Vietnã estourava, desdobramento da Guerra Fria. Figuras como Dom Hélder Câmara, Antônio Callado, Hélio Pellegrino e Otto Lara Resende constituíam a intelligentsia brasileira, da qual o próprio Nelson fazia parte. E o mesmo se aproveitou de tudo para produzir suas crônicas.

Há de tudo. Da banalidade do barzinho ideológico à sublime dimensão da morte. Conhecemos Nelson Rodrigues em suas cínicas opiniões sobre os mais diversos assuntos. Na verdade, não tão diversos assim, pois, como disse o próprio Nelson, ele era um homem de obsessões. Mas nessas obsessões descobrimos um grande escritor. E como vale a pena ler um grande escritor!
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Procyon 18/06/2022

O Óbvio Ululante ? comentário
?O mesmo
livro é um na véspera e outro no dia seguinte. Pode haver um tédio na
primeira leitura. Nada, porém, mais denso, mais fascinante, mais novo, mais
abismal do que a releitura.?

Nelson Rodrigues foi um senhor da hipérboles. Esse homem ordinário do Rio de Janeiro ? cidade essa indissociável de sua obra ? reúne aqui uma prosa melancólica, crítica, com o cínico linguajar de Nelson Rodrigues. Esse dramaturgo da solidão, abarcado de uma vida absolutamente, inseriu um realismo que imprimia personagens dissonantes e em paroxismo de linguagem.

Nesta seleção de suas crônicas, ou confissões, reunidas pela Companhia das Letras, Nelson fala sobre muitas coisas: as passeatas, o ?Poder jovem?, a esquerda festiva, os festivais da canção, a agressão ao elenco de Roda viva, a pregação da violência, o Vietnã, Sartre, Mao Tsé Tung, d. Hélder, o anti-Brasil? Porventura, numa única crônica, ele consegue abordar os mais diversos assuntos com uma escrita cativante. Ele sintetiza toda aquela ousadia e cinismo de suas peças, com o deboche e a perenidade de observações.

Chega a ser um paradoxo um sujeito que viveu o absurdo em vida ? cegando a ser chamado de ?tarado?, ?amoral?, ?reacionário?? esteja entre algo mais próximo de um romântico do que o de um amargurado.

?Tudo é falta de amor. O câncer no seio ou qualquer outra forma de câncer. É falta de amor. As lesões do sentimento. A crueldade. Tudo, tudo falta de amor.?

Intercalando com a leitura de sua formidável biografia, escrito por Ruy Castro, pode-se ter uma noção mais ampla da correlação de vida e obra.

Nelson preenche essa prosa com suas obsessões. D. Helder, Tristão de Athayde, Otto Lara Resende, Hélio Pellegrino, Antônio Callado; temas como a morte e sexo; as esquerdas brasileiras; as influências literárias, que correm de Dickens a Dostoievski; pelo fraque? Como ele mesmo diz: ?Sou um homem de fixações inarredáveis. Insisto em assuntos e figuras de nossa época, como um pertinácia quase doentia.?

Nelson ainda tem uma certa fixação pelo passado. É profético no enfático ?anti-Brasil?, e preenche essa prosa com frases memoráveis. É nessa cidade, o Rio de Janeiro, que foi quase um personagem em sua obra, em que traça um rico panorama socio-políticos do Brasil dos anos 1920-60.
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Lurdes 01/01/2022

Gostei demais da leitura das crônicas do Nelson Rodrigues.
Eu li praticamente toda a dramaturgia dele w gostei muito de descobrir um lado mais suave, empático que ele não deixa transparecer em suas peças teatrais.
Quero seguir lendo msis crônicas de Nelson em 2022.
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SamuellVilarr 08/09/2021

O óbvio ululante, Nelson Rodrigues.
Reunião de crônicas do Nelson Rodrigues (reunidas e escolhidas pelo próprio escritor) em que os temas variados e diversificados tem como objetivo indireto ou também as vezes demonstrativo e sagaz de destacar temas de caráter político, social e cultural, porém, há uma perspectiva imediata do leitor de que encontraremos nas crônicas textos opinativos e argumentativos que sejam de alguma maneira expositivos ou politizado e que utilize disso material para degradar a composição do texto ou apenas empobrecê-lo, contudo, aqui há o inverso de tudo isso, encontramos na verdade um texto abrangente, tanto no sentido literário, onde a colocação das palavras por mais espontânea que possa parecer ser (pois o próprio "ofício" pro escritor, em especial o que aqui tratamos, diria alguém que era tão natural quanto a respiração, isto é, havia uma solenidade e uma facilidade no exercício da escrita), também demonstra uma precisão e um caráter estilístico excepcional. O escritor opta por ser expressivo no aspecto daquilo que o mesmo pretende expor ou revelar ao leitor, utiliza disso conteudo para preencher lacunas nas corrupções e das circunstâncias que o leitor consegue distinguir no cotidiano e em situações as vezes triviais e as vezes pitorescas, especialmente do ponto de vista cultural e na perspectiva do escritor, pois encontramos uma classificação do escritor, suas palavras contém uma passagem ou uma tentativa digna de transmitir aquilo que alcança a capacidade e as profundezas do seu espírito; sua característica obsessiva, como o próprio o diz e também seus próximos (assim relata) é um aspecto perceptível no decorrer do texto, ou seja, pode de alguma maneira causar um espanto, ou melhor, um incômodo em quanto a isso, porém, diria firmemente que aquele que se incline e deseje mais se atentar em quanto ao texto em si, perceberá sua estima qualidade e perspicácia no sentido literário e também individual da relação do escrevente, da consciência do que escreve e do resultado que é o texto. Palavras indicativas e representativas como "toda uma" e as referências a personagens de seu passado que serviram como influências para formação e constituição de toda sua personalidade e seus valores, ou os próprios personagens repetidos e presentes frequentemente de um modo contínuo nas crônicas, sobretudo amigos seus como Otto Lara Resende ou Hélio Pellegrino, são pequenas maneiras de desvelar a característica da busca do escritor de manter, estabelecer e expressar sua experiência e sua pessoa enquanto personagem de seu universo, cacterizar seu universo. A abrangência que cito no início da resenha também está associada com a maneira de redigir o texto com inconveniências, trivialidades e situações descritivas que causem uma perspectiva e uma reação de comicidade no leitor provido das ironias, podendo até em alguns casos dar gargalhadas, como também, uma perspectiva da condição do homem, em especial do homem diante de sua sociedade e em confronto consigo mesmo, as vezes consegue exprimir orientações e utilizar de sua formação um escopo para uma negação ou apenas descontentação da estupidez e de objeto de sagacidade perspicaz da passagem e da errônea percepção de "desenvolvimento" social, político e também religioso que costumamos atribuir ao nosso tempp, onde a irreverência consegue transitar e também fazer com que o leitor consiga discernir o que move e impulsiona as vezes tão naturalmente sua condição e sua vida. Livro surpreendente que me faz querer conhecer outros escritos do autor, suas crônicas proporcionam também uma intimidade consigo, por mais que seu perfil como dramaturgo seja mais renomado, suas crônicas são interessantíssimas, este como experiência primeva, indico firmemente.
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Aquino 29/05/2021

Nelson Rodrigues não envelhece uma ruga
Isso é clichê -- já li isso em algum lugar... Acho que foi o João Pereira Coutinho que falou. Mas é a verdade: Nelson Rodrigues, simplesmente, não envelhece. É incrível como críticas feitas à sociedade dos anos 60, ao mundo dos anos 60, continuam vivas e incomodam até hoje. Fora as profecias que ele fez sobre como seria um tempo futuro e que, invariavelmente, se tornaram realidades. Talvez, Nelson seja imortal.
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Emanuele 12/04/2020

Conhecendo Nelson
Foi meu primeiro livro de Nelson Rodrigues e, como esperado, ele é magistral com as palavras, frasista excepcional, escreve tão perfeitamente que a gente fica querendo gravar aquilo para ter essas frases no dia a dia!
Não classificaria como um livro de crônicas... o livro é feito de uma coletânea de artigos escritos em jornal. Alguns interessantíssimos, outros mais enfadonhos, o que por vezes pode deixar a leitura cansativa.
Tive um pouco de dificuldade porque ele remete a muitas personalidades de sua época, algumas não mais tão conhecidas hoje em dia.
No geral, porém, o livro é muito bom! Humor com inteligência, crítica com fundamento. Além de trazer muito da personalidade do próprio Nelson.

Nelson é ácido, crítico, frasista, Nelson é atemporal!
Fico pensando o que essa mente escreveria sobre os dias de hoje!
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Henrique Fendrich 19/12/2019

A crônica psicanalítica de Nelson Rodrigues
Entre os usos que Nelson Rodrigues fazia da crônica, um dos mais notáveis era a memória – ele chegava a dizer até mesmo que essa era a única coisa que se salvava nele. Por vezes, chegou a se declarar efetivamente um memorialista, um homem suscetível a violentas nostalgias. Episódios banais do seu cotidiano eram suficientes para lhe trazer o passado: “Hoje uma simples bacia deflagra em mim todo um movimento regressivo, todo um processo proustiano”. Como resultado, evocava o Rio de Janeiro do passado, o Rio de Janeiro da sua infância, o Rio de Janeiro do fraque e do espartilho, bem mais solene, onde até o “bom dia” era dado com “uma ênfase insuportável”.

Desse período evocava episódios específicos, a que recorria constantemente, pois era, como ficou conhecido, uma “flor da obsessão”. O assassinato de Pinheiro Machado, por exemplo, era algo a que ele sempre voltava, pois ele havia sido um dos “mortos fundamentais” da sua infância, sendo certo que cada infância tem a sua antologia de mortos. O cronista reconhecia que a citação de datas e fatos antigos exalava “um cheiro de remédio de barata”, mas considerava isso ótimo – o remédio de barata, em verdade, era o próprio passado em forma de aroma. Era outro o Rio de Janeiro, como era outro o Brasil (na infância de Nelson, o Brasil tinha algo de Gógol). Mas o tipo de crônica que Nelson fazia não era aquela que se encerra no próprio saudosismo que tenta evocar.

De fato, é possível enxergar na crônica de Nelson Rodrigues uma função quase psicanalítica, como um instrumento de que o escritor se vale para melhor compreender as suas próprias motivações no tempo presente. Episódios traumáticos da sua infância podem ser trazidos à consciência porque eles ainda influenciam e orientam comportamentos da sua vida adulta. Nelson empregava às suas crônicas, não à toa chamadas de “confissões”, uma nota essencialmente pessoal, não hesitando em admitir fraquezas ou comportamentos que pouco prestígio poderiam lhe trazer. Afora a função de “chocar” o leitor, é plausível enxergar tais confissões como um processo de autoconhecimento.

O cronista chega mesmo a problematizar a questão do psicanalista, cuja popularidade, em seu tempo, atribuía à dificuldade do ser humano em encontrar quem lhe escute. “A utopia de cada qual é encontrar um ouvinte. Nada mais”. A possibilidade de escrever em jornal era também a de ser lido por diferentes pessoas, cada uma delas, de certa forma, ouvindo os ruídos da alma de Nelson. Sua crônica, portanto, era também um meio de ser ouvido sem recorrer a uma sessão profissional. Diga-se, além do mais, que um dos melhores amigos de Nelson era o psicanalista Hélio Pellegrino.

Como a justificar essa relação, o cronista reconhecia que, a toda hora e em toda parte, o passado se insinua no presente – embora visse nisso o patético da sua época. A influência da infância, em todo caso, seria tão decisiva que a própria existência do adulto podia ser questionada: “O que há de adulto, no homem, é uma pose. Mas o que vale mesmo é o menino que está enterrado em nossas entranhas”. Com essa consciência é que ele passeia por memórias e traumas infantis, não ignorando a impressão de estar simplesmente retocando e valorizando reações do menino que um dia foi.

O mergulho no próprio passado é um processo que pode gerar angústias tremendas, como as que Nelson sentia na igreja, vendo os círios nos altares e ouvindo o frêmito das rezas: “Há em mim o despertar de velhas culpas e a memória de não sei que abjeções”. A igreja era também um ouvinte, mesmo quando vazia, pois ouvia o eterno e o sagrado que estavam enterrados dentro de Nelson. Ao escrever “confissões”, de certo modo Nelson alçava o leitor à inusitada posição de sacerdote.

Por mais pessoais que possam ser as descobertas que se faz ao olhar para dentro de si, o cronista tenta encontrar linhas gerais que expliquem também o comportamento da sociedade em que vive. Nesse sentido, chega por vezes a resultados admiráveis, como é o caso de “História de lagostas”, um dos melhores espécimes da sua coletânea “O óbvio ululante“. Relata-se as alucinações que Sartre teve ao vislumbrar uma lagosta imaginária. A partir desse mote, Nelson faz o esboço de uma teoria que muito tem de psicanalítica. Defende que qualquer um de nós tem as suas falsas lagostas, os seus falsos valores, as suas irrealidades prodigiosas, mais saborosas, inclusive, que as verdadeiras:

"As palavras são, em nossa experiência, como que as lagostas do Sartre. O sujeito que diz “eu te amo” fala de um sentimento que não tem a uma pessoa que não existe. Pode parecer exagero. Nem tanto, nem tanto. Retocamos e acrescentamos tanto ao ser amado, e o recriamos tantas vezes, que ele se torna a mais absurda e irreal das lagostas. O nosso “muito prazer” refere um sentimento que também não existe. E, no entanto, o que nós chamamos de “vida real” é tecido de “muito prazer”, “bom dia”, “te amo” e, pois, de frenéticas irrealidades".

Na sequência da crônica, Nelson conta uma história – se real, se imaginada, não importa – na qual aplica a teoria que acabou de levantar, em uma trama que é típica de “A vida como ela é”. Aliás, esse é um expediente comum do autor, ou seja, valer-se de histórias para justificar as reflexões que promove em suas crônicas, algumas, como a citada, de teor francamente psicanalítico. A partir dos estímulos e da histórias que chegaram até ele desde cedo (ainda menino, ele já era um fascinado pela grande dor, aquela que não passa jamais) e que sobreviviam dentro de si, o cronista tratava de retrabalhá-los de forma criativa. O resultado, com frequência, não era tanto o prazer estético que a história podia causar, mas a acertada avaliação que fazia de comportamentos típicos da sociedade. Em certa medida, pois, Nelson Rodrigues podia agir também como um psicanalista dos brasileiros.

A tensão entre passado e presente em suas crônicas abrange ainda temas como a antiga imprensa (“passou a época do grande jornalista”) e o novo teatro, mas Nelson também se dedicava a temas essencialmente contemporâneos, fazendo julgamentos que, naturalmente, eram ainda produto do modo como havia sido criado e das experiências que havia tido ao longo da vida. Nelson era, e não negava, um reacionário, criticando o progressismo nos costumes dos anos 60, e para isso, imagina-se, influenciava também a visão de aspectos do seu próprio passado que ele gostaria de manter.

O cronista era o primeiro a admitir: “Sou um homem de fixações inarredáveis. Insisto em assuntos e figuras de nossa época, como um pertinácia quase doentia”. E, realmente, nas suas crônicas figuram sempre Dom Hélder, Tristão de Athayde (esses sempre confrontados), os amigos Hélio Pellegrino, Otto Lara Resende, Gustavo Corção, Antonio Calado, as influências literárias (Dostoievski, Dickens, o velho Dumas), como também estão as críticas ideológicas ou ao culto do jovem. O interessante é que essas obsessões, à parte do que possam significar psicanaliticamente, são expostas por meio de um estilo tão envolvente que o leitor pouco as sente. Nelson passa meia dúzia de crônicas falando da morte de Guimarães Rosa, mas faz isso de forma tão criativa, e usando ângulos tão variados, não deixando, aqui também, de recorrer às suas próprias memórias infantis, que a impressão que se tem é que a gente poderia ler um livro inteiro composto de crônicas sobre a morte de Guimarães Rosa.

É bem curioso observar Nelson confessar que sua imaginação é rala e escassa. “O meu processo é repetir. Arranquei de mim mesmo, a duras penas, uma meia dúzia de imagens. E, um dia sim, outro não, repito a metáfora da antevéspera. A televisão vive da reprises dos seus filmes, eu vivo das reprises das minhas imagens”. Muitas dessas imagens, contudo, podem ser vistas praticamente como “clássicos”, e o efeito no leitor é ao menos um sorriso sempre que as vê aparecer novamente, como quando alguém diz algo “de olho rútilo e lábio trêmulo”. Mesmo com “pouca criatividade”, há imagens das mais bonitas: “Sentiu-se atravessada de luz como uma santa de vitral”. É facilmente perceptível também que grande parte das imagens que usa, como do seu estilo como um todo, tem o objetivo de fazer graça – porque a autoanálise de Nelson é, também, bastante humorística.

Nelson, como todos nós, é um personagem complexo e contraditório. Sua tentativa de olhar para si, para o seu passado e, a partir disso, interpretar a realidade ao seu redor, é uma atividade prazerosa para quem lê. Se ele queria ouvintes, conseguiu também um bom punhado de entusiastas.

site: http://rubem.wordpress.com
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Camille.Pezzino 03/11/2017

A FLOR DE OBSESSÃO E OS REQUINTES DE SOCIABILIDADE
Há autores que não são capazes de se desassociar de suas obras, tornando impossível, para qualquer resenhista, falar sobre o livro sem chegar as minucias daquela personalidade que, geralmente, é tão intrigante e instigante. Nelson Rodrigues, como Cora Coralina ou Rupi Kaur, é exatamente esse tipo de escritor: sua vida, sua obra; qual a diferença mesmo?

Essa pergunta não é despropositada, principalmente ao falar de "O Óbvio Ululante". Esse livro retrata uma série de confissões - e seu subtítulo é "as primeiras confissões" - publicadas por Nelson na década de sessenta, mas especificamente nos anos de 1967 e 1968. O autor retrata - como um belo cronista e excelentíssimo poeta em prosa - a vida cotidiana da cidade do Rio de Janeiro, comentando sobre personalidades e nos levando tanto para a década de vinte, época a qual o autor retrata muitas vezes como foi sofrida por conta de sua infância pobre, quanto todo o resto de sua vida até ali. O autor usa o bom humor e a própria vida para criticar a sociedade em diversos aspectos, inclusive, celebridades e amigos. Seja num falar educado, num falar bem ou belamente debochado, mas sempre, e repito, sempre brilhante e com um exímio de refinamento linguístico e jogo de palavras.

Durante o decorrer do livro, o leitor encontrará oitenta e uma confissões, dedicadas à sociedade, tanto ao próprio Nelson, quanto aos vizinhos ou ao Guimarães Rosa. São crônicas, ou seja, textos de cunho histórico, apresentados como uma compilação desses fatos e que se mostram em uma ordem sucessiva de tempo. Muito embora, dentro do livro, não tenha de fato uma cronologia, pois podemos perceber - mediante da apresentação das datas após cada confissão - que algumas são de meses antes ou meses depois, sem ter uma ordem muito específica de tempo.

Ainda que o tempo não seja específico, o que o Nelson comenta é muito específico, em alguns momentos. Suas críticas, ao meu ver, são muito bem fundamentadas e contemporâneas. Logo, o título de seu livro não se torna somente interessante, mas também se torna necessário e mostra o quão gritante é a questão trabalhada.

Quer saber mais? Acesse: https://gctinteiro.com.br/resenha-10-a-flor-de-obsessao-e-os-requintes-de-sociabilidade/

site: https://gctinteiro.com.br/resenha-10-a-flor-de-obsessao-e-os-requintes-de-sociabilidade/
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Priscila.Gontijo 14/03/2015

Que só os profetas enxergam.
"O óbvio ululante" é um livro de memórias que nos dá um panorama da cidade do Rio de Janeiro dos anos 20 aos anos 80 e da singular visão de mundo de um dos maiores dramaturgos e cronistas brasileiros. Tachado de tarado, reacionário e pornográfico, Nelson Rodrigues é antes de tudo o poeta do patético, do que há de mais humano e terrível em nós. Leitor assíduo de Dostoiévski: "Pode-se viver uma vida inteira para um único livro de Dostoiévski ou um único soneto de Shakespeare ou um único livro de não sei mais quem. O mesmo livro é um na véspera e outro no dia seguinte", Nelson, assim como o ficcionista russo, deu voz aos humilhados e ofendidos, aos nossos fantasmas e demônios internos. Sem dúvida, o escritor deixou um legado para o teatro como nenhum outro dramaturgo nacional. Com "Vestido de Noiva" inaugurou o moderno teatro brasileiro. Seu olhar singular, por vezes cruel, por vezes pungente diante dos acontecimentos da época, o humor sagaz, a poética coloquial (descobriu e eternizou algumas gírias cariocas como: "É batata!", "E aí batuta, vai sair ou tá de calça?") e máximas literárias de grande poder estético como: "A adúltera é mais pura porque está salva do desejo que apodrecia nela", o autor nos ajuda a vislumbrar o mundo pelo buraco da fechadura e a enxergar o pior e o melhor de nós mesmos. No livro de memórias, Nelson problematiza os acontecimentos da época e nos deslumbra com deliciosos personagens, sempre patéticos em sua desesperada luta pela sobrevivência. Criador de personagens memoráveis, tão bem retratados como o Sobrenatural de Almeida, os padres de passeata, os cretinos fundamentais, além é claro, das grã-finas com narinas de cadáver. Suas observações perspicazes nos revelam um Rio de Janeiro dotado de contrastes sociais e imagens antológicas como as mulheres da "Belle Époque", as vizinhas cheias de varizes, a demente nua, a adúltera e as professoras de bigode. Recheadas das memórias do Nelson menino, acompanhamos essa vida dilacerada por tragédias, sua paixão por ópera, suas obsessões inapeláveis e sua incursão pelo teatro. Nelson nos ensina a olhar para o Brasil de maneira mais generosa e menos tacanha e a idolatrar menos o que vem de fora. Livro fundamental.
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Marcone 21/06/2013


Reunião de crônicas publicadas em 1968. Contém, dentre outras coisas, a mais lúcida crítica ao Maio de 68 francês.

Este não é um livro indicado para quem pretende se iniciar na leitura de Nelson Rodrigues. A obsessão, a ironia e o humor cáustico podem causar um desconforto em quem não esteja acostumado com o autor (ou em quem não conheça sua biografia).

Mas, para quem já é um rodriguiano como eu, este livro é um verdadeiro deleite! Alguns capítulos são de arrancar gargalhadas! A grande diferença deste livro para o "Cabra Vadia", também de crônicas, é o humor acentuadíssimo! Em algumas crônicas, é quase possível escutar a voz arrastada daquele Nelson irônico e mordaz, gesticulando ao dizer:

- Kennedy levou um tiro no queixo; Luther King levou outro, no peito; Guevara, uma rajada de metralhadora. Imaginem Dom Hélder, atropelado por uma carrocinha amarela de Chicabon!
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Marc 07/01/2012

Para ser sempre lido
Confesso não lembrar quem foi que escreveu, se Nietzsche ou Henry Miller, que é nos diários que as pessoas mais se escondem. Adoro esse tipo de pensamento: o escritor como aquele que todos tentam classificar, colar um rótulo para ter uma receita de como lidar com ele e que escapa, sendo liso demais para algo aderir a sua superfície.

Me pergunto que importância tem o subtítulo desse magnífico livro... Porque se por várias vezes Nelson Rodrigues parece nos confessar algo de seus segredos íntimos, logo em seguida seu raciocínio mostra o quanto isso é irrelevante. Suas crônicas são muito mais interessantes que seu teatro – que é muito bom, mas realmente não nasci para gostar de teatro. Por várias vezes ridiculariza as pretensões da esquerda brasileira (o que fez com que recebesse, com seu mítico bom humor, o título de reacionário). E vale lembrar que mesmo criticando a esquerda, que se via como bastião da democracia no mundo,teve seus problemas com a ditadura militar: "O Casamento", seu romance, foi censurado.

O que fica desse livro e de outros de crônicas é seu profundo humanismo. Esse é seu ponto de partida para oscilar tão livremente por posições que normalmente se espera que sejam fixas e definitivas. Nelson Rodrigues sofreu por essa característica livre, sendo ignorado solenemente pela esquerda e não chegando a endossar as posições tacanhas da direita brasileira. Teve livros censurados e ficou conhecido como “safado”, porque muitos confundem o tema do escritor com ele próprio...

Mais de uma vez ouvi que é uma espécie de Shakespeare brasileiro. Porque seus livros são trágicos. Mas não posso discordar mais dessa afirmação: por várias vezes cita ser leitor assíduo de Dostoiévski. E parece que o russo teve mais influência porque mesmo que seus livros tivessem algo de trágico, tinham também o elemento patético. Mesmo nas crônicas o patético é visto com facilidade, quando descreve sua própria miséria na infância e lembra como foi tomando conhecimento das coisas da vida. Ele fazia filosofia dos fatos cotidianos, como um sanduíche de ovo, a visita de uma atriz ao país e a reação ao Maio de 1968.

A crítica às mudanças sociais que pareciam trazer avanços mas na verdade mais e mais se distanciavam do humano como um valor de referência. Como seu constante mal-estar com as mudanças que a Igreja vinha sofrendo nos anos 60-70: uma apologia da juventude e dos novos ares que se respirava (veja como de repente o autor fica atual). “O Padre Ávila entende que a juventude expulse a lealdade assim como quem afasta uma barata seca com o lado do pé. E, de repente, o jovem passa a ter carta branca. Suas abjeções são até promocionais” (p. 90). Sobre um debate em que o religioso foi incapaz de criticar ao ouvir um jovem questionar sobre o valor da lealdade no mundo.

Suas crônicas parecem dizer que a política é mais do que estamos habituados a entender. Mas ela começa na maneira de nos relacionarmos com os mais próximos, em estarmos dispostos a ignorar seus desejos e aflições em nome de nosso mero bem-estar, até à escolha dos líderes (o líder é sempre o canalha, o santo nunca tem seguidores, ou, se tem, são poucos de qualquer forma).

Adoro um pensamento seu em relação a superação do sofrimento: “E ninguém entendia que a grande dor deve ser preservada (a dor que passa abre, na vida interior, imensas e lívidas sibérias)” (p. 85).

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Franco 03/02/2011

O cara tinha uma faciliade incrível para criar frases de impacto, e nesses tempos de MSN e Orkut, tá aí uma ótima fonte para um perfil ou coisa que o valha rs.

Porém as cronicas parecem sofrer um desgaste com a repetição de termos e histórias. Quer dizer, é indubitável a qualidade da escrita do Nelson, mas as cronicas repetem muito do que já foi dito nas anteriores e anunciam o que será dito nas seguintes... Enfim, larguei pela metade.
Lucas 11/09/2011minha estante
Certa vez vi uma entrevista dele com Otto Lara Resende, aliás personalidade copiosamente citada no livro, em que Nelson Rodrigues se define como uma "flor da obsessão". Daí o seu gosto por soar repetitivo. Ele o é mesmo, e com orgulho. Gostei bastante do livro e o li rapidamente. As repetições enfatizam as suas memórias!




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