Calebe 30/09/2013
Livro: "As palavras que ninguém diz" de Carlos Drummond de Andrade
Este é o terceiro volume da coleção "Mineiramente Drummond", sobre o poeta de Itabira, Carlos Drummond de Andrade, e contém 19 crônicas com temas variados, mas bastante próximos do universo dos adolescentes. Em vários textos deste livro, Drummond revitaliza palavras que pareciam estar irremediavelmente perdidas na linha do tempo de evolução do vocabulário corrente.
Escrever bem não é escrever difícil. Não empregue palavras complicadas ou supostamente bonitas, principalmente se você não tem certeza do significado delas. O vocabulário deve ser adequado ao tipo de texto que se pretende redigir, e de acordo com seu interlocutor. No caso de redações escolares, deve-se empregar a norma padrão ou norma culta da língua. Evite erros gramaticais, ortográficos, gírias, palavrões, pois não condizem com a boa linguagem. Acima de tudo, seja claro e objetivo em sua maneira de escrever.
O texto “As palavras que ninguém diz” de Carlos Drummond de Andrade é um exemplo de crítica ao uso de palavras de difícil compreensão (basta observar o título do texto) para um texto que tem como objetivo a COMUNICAÇÃO entre quem escreve e quem lê.
Boa leitura! E não tente descobrir o significado das palavras. Algumas não são encontradas nem nos melhores dicionários. Hehe! Mas vale a pena realizar essa leitura! Abaixo segue uma das crônicas que mais gostei do livro:
GRAVAÇÃO
“Pronto, tá ligado. Posso começar?
— Pode.
— O senhor se sente realizado?
— Por que você quer saber disso?
— Nada não. O professor é que mandou lhe perguntar.
— O professor tem interesse em saber se eu me sinto realizado?
— Sei não senhor.
— Então diga ao professor que venha me procurar.
— Pra quê?
— Para eu lhe perguntar se ele se sente realizado.
— O senhor vai perguntar isso a ele?
— Vou.
— O senhor também está estudando? Nessa idade, poxa!
— Que que tem? Toda idade é boa para estudar, a gente não acaba nunca de saber as coisas. Mas não estou estudando não.
— Então por que vai perguntar isso ao professor?
— Porque se ele quer saber se eu me sinto realizado, eu também quero saber a mesma coisa dele. Indiscrição por indiscrição.
— Gozado… Mas se o senhor fizer isso, não bota o meu nome no meio, porque vai dar grilo. Vê lá, hem?
— Fique descansado. Não vou comprometer você.
— E o senhor só vai responder a minha pergunta depois de falar com ele? E se ele não responder? Se demorar? Tenho de entregar esta entrevista até quinta-feira.
— Bem, eu respondo agora mesmo.
— Então, responde, vamos lá.
— Primeiro eu preciso saber: o que é se sentir realizado?
— O senhor não sabe?
— Para dizer o que eu sinto, quero saber antes se o que eu sinto é o mesmo que se deve sentir quando se está realizado, ou se julga estar. E para isso é preciso saber o que é estar realizado.
— Poxa, não complica.
— Estou complicando, meu querido? Minha intenção era simplificar, esclarecer. O que é mesmo se sentir realizado?
— Ora! Se sentir realizado é… quer dizer… Não sei explicar muito bem, mas o senhor entende, né?
— Mais ou menos. Quer dizer: menos. E você?
— Se o senhor não entende bem, eu é que vou entender?
— Então, como é que eu posso responder?
— Ué, o senhor é o entrevistado, o que sabe das coisas.
— E quando não sei?
— Não sabe se está realizado?
— Não sei nem o que é realizado.
— Corta essa. Não vai me dizer que não tem dicionário em casa.
— Tenho alguns, mas em vez de me tirarem as dúvidas, me acrescentam outras.”
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