Ronaldo Thomé 03/07/2019
Onde Acaba a Memória e Começa a Criação
Não há como não se emocionar com a escrita de Lygia Fagundes Telles, e este livro não é exceção. Aqui, vemos um belíssimo apanhado de contos, em que a autora coloca seu estilo a favor da criação e do resgate. A genialidade da escritora está, justamente, em mesclar a realidade de sua vida com pequenas pitadas de imaginação, muitas vezes, de maneira bastante sóbria; outras, cedendo lugar ao mistério; e, em alguns dos seus melhores escritos, ao realismo fantástico. Você vai se perguntar muitas vezes: ela realmente viveu isto? Em outras: mas como é possível que Lygia tenha imaginado tudo isto? É nisso que reside a genialidade de uma das nossas maiores escritoras vivas, e talvez a autora mais subestimada da nossa literatura.
No quesito da narrativa, Telles é mestra absoluta na arte de fundir a voz dos personagens a sua própria: valendo-se do fluxo de consciência e do discurso indireto livre, lembra em muito a prosa de Lispector e Machado; no entanto, ao invés de parecer uma cópia dos dois, ela tem um estilo todo próprio, marcado pela fluência e precisão. Sua forma de escrever é mais leve e muito mais acessível que a dos autores citados acima, o que o faz uma autora mais indicada para quem quer conhecer essa forma tão específica de narrar (não é à toa que considero Lygia a autora que me fez ter vontade de escrever meus próprios textos).
Invenção e Memória é um breve, porém saboroso, reencontro com a infância, a adolescência, a juventude; mas com um tempero que só a imaginação de uma grande escritora é capaz de conferir.
Indicado para: quem quer conhecer, tanto na leitura como na escrita, formas de trabalhar a expressão e a imaginação.
Nota: 10,0 de 10,0.