No Limite da Razão

No Limite da Razão J. Bernlef




Resenhas - No Limite da Razão


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Val Alves 30/03/2021

"O que se esconde dentro do meu corpo e  tem raiva de mim?"
É desolador perceber quantos livros incríveis muitas vezes não são tão falados como deveriam. Apesar de ter sido o livro do ano na Inglaterra, essa obra de J. Bernlef parece não ter a popularidade merecida por aqui no Brasil. Por outro lado fico feliz quando livros assim caem nas minhas mãos.


O personagem-narrador é Maarten Klein, um septuagenário que está enfrentando a perda progressiva da memória em decorrência do Alzheimer. Ele e a esposa, Vera, são imigrantes holandeses que vivem nos EUA desde que escaparam do nazismo.
O percurso de esvaziamento mental de Maarten é percebido no decorrer da sua narração, que é feita como uma espécie de diário,  onde nos perdemos junto com ele nos eventos cotidianos avulsos, confusos e cheios de cortes abruptos.  Conforme o texto progride, percebemos esse esvaziamemto também na escrita,  que vai se esmaecendo e se tornando cada vez mais recortada, superficial, tênue e ganha , lá no final,  uma sequência perturbadora. 

"Olha o furioso para sala da frente. Parece que perco as palavras como alguém perde sangue. E então de repente ficou outra vez apavorado. A presença de tudo! Cada objeto parece mais pesado e mais denso do que deveria ser (talvez porque por uma fração de segundos eu não saiba mais o nome dele). Rapidamente me deito no sofá e fecho os olhos. Uma espécie de enjoo na mente, parece. Sob essa vida agita-se outra vida em que todas as horas, nomes e lugares ficam girando na maior confusão e onde já não existo como pessoa."

Tive a ideia de ler uma parte do livro escutando Everywhere At the end of Time (Caretaker, 2016), outra obra de arte que tentou simbolizar o processo da demência, para testar se encontraria semelhanças entre a obra literária e a obra musical.  Por mais que sejam expressões artísticas totalmente diferentes posso pontuar uma sensação em comum: angústia. Em Everywhere at the end Of Time o sentimento surge nos silêncios abruptos, sons irreconhecíveis, 'sujos' e dissonantes, que parecem indicar sempre perigo iminente. Em Bernlef a angústia surge na incapacidade de se localizar no tempo- espaço, quando Marteen não se reconhece mais nas fotografias, sua casa se torna estranha, todos ao redor se tornam desconhecidos, nada nem ninguém parece estar no lugar certo, como se o mundo de repente tivesse resolvido lhe pregar uma peça ou quando se está num daqueles pesadelos onde se pode identificar duas ou três coisas e o resto é completamente sem sentido.
E o medo. Medo de acabar sendo sorteado para também passar por isso. Medo de voltar a estados primitivos onde se necessita do cuidado alheio e passam a lhe tratar como criança.

"A arrogância da juventude.  Acham que conhecem um pouco da vida depois de lerem alguns livros."

Apesar do tema pesado a leitura fluiu agradavelmente devido a escrita descomplicada de Bernlef. Espero ter outros contatos com sua obra.
Mariana 31/03/2021minha estante
Me inspirou... Já coloquei na minha lista!


Val Alves 31/03/2021minha estante
Espero que seja uma ótima experiência para vc também, Mariana! ?


Mariana 31/03/2021minha estante
??




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