Preparação para a Yoga

Preparação para a Yoga I. K. Taimni




Resenhas - Preparação para a Yoga


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Cesar270 19/05/2020

Excertos do livro
Um conjunto maravilhoso de conhecimentos, teóricos e práticos, uma tradição, uma múltipla técnica, é isto que constitui o Yoga. É por meio desta ciência sagrada que todas as verdades da vida interior, todos os profundos segredos da natureza e do universo, todas as realidades do Divino dentro do homem, foram descobertos e demonstrados como fatos, frutos da experiência direta. Esse conhecimento e essa técnica são a mais valiosa contribuição dada pela Índia ao pensamento mundial e ao progresso da humanidade, em relação ao seu objetivo espiritual.

Esta técnica de autorrealização implica exploração de vários reinos internos da mente e da consciência, por parte de cada indivíduo e por meio de seus próprios esforços.

Algumas das verdades descobertas pela experiência direta possuem uma natureza tão transcendente que é impossível transmiti-las por meio da palavra. É natural, portanto, que a maior parte da técnica não possa ser apresentada claramente na forma de um sistema rígido.

Entretanto, apesar de os Adeptos do Yoga não transmitirem seu conhecimento aos que não estiverem preparados, eles estão ansiosos para que o maior número de pessoas esteja em condições de adquirir as qualificações necessárias para trilhar o caminho do Yoga, a fim de se libertar e de auxiliar os outros a se libertarem das limitações que os envolvem.

Na realidade, não estamos tão separados, independentes e isolados, lutando por um progresso e numa existência individual, como pode parecer ao intelecto exclusivista, devido às ilusões dos mundos inferiores. Aqueles que estão tentando trilhar o caminho do Yoga e se esforçando para atingir a sua meta não estão empenhados em nenhuma competição para vencer os seus irmãos e ganhar o prêmio supremo da realização humana antes dos
outros. Estão procurando se libertar, porque ninguém que tenha se conscientizado das ilusões da vida poderá ficar contente permanecendo nelas, e também porque só um indivíduo livre dessas limitações pode efetivamente ajudar os outros. Por isso os Irmãos Mais Velhos, que guiam a evolução da humanidade, sempre estão ansiosos para ajudar os aspirantes esforçados que desejam percorrer o caminho espiritual e possuem as qualificações necessárias.


A causa real dos problemas é a falta de discernimento, ou viveka, que nos capacita a abrir o caminho através das ilusões e a perceber a vida em sua simplicidade, despida de todas as fascinantes atrações e tentações mundanas. É a falta de um modo de pensar mais profundo, ou seja, a opção por uma vida superficial, que nos leva a prosseguir com as mesmas experiências; a passar pelas mesmas misérias; a nos satisfazer vivendo dentro das mesmas limitações; e a sacrificar a liberdade, a força, o conhecimento e a bem-aventurança que nos estão destinados, trocando-os por alegrias e confortos efêmeros e pelas excitações e conquistas da vida comum.

Porém, terá o Yoga algo a oferecer aos aspirantes envolvidos nesse estado mental tão peculiar? Ou ele se destina apenas aos que já possuem uma forte urgência interior e uma aptidão especial para a sua prática? Há uma grande confusão em torno dessas indagações. Alguns confundem o Yoga com certos exercícios preliminares, não essenciais, de natureza
puramente física, como āsanas (posturas) e prānāyāma (controle da energia vital), acreditando que o Yoga é apenas uma prática para alcançar uma vida física sadia. Outros têm a impressão de que o Yoga significa a prática do samādhi (êxtase) e de outras técnicas avançadas, empregadas somente nos seus últimos estágios. Naturalmente, acham que tudo isso está além da capacidade do sādhaka (aspirante) e concluem que o Yoga não se destina ao homem comum. Porém, nenhum desses modos de pensar representa a verdade sobre o Yoga e o seu uso como um instrumento para libertar as pessoas das limitações e ilusões que as envolvem.

Como o Yoga é a ciência que trata dos métodos que podem, gradual e sistematicamente, efetuar essa união, o aspirante sempre está livre para aplicar esses métodos ao seu próprio caso, segundo as suas necessidades e estágios de desenvolvimento.

O Yoga não aborda apenas um problema específico. Não procura tratar só de uma determinada espécie de aflição humana, tendo, se assim fosse, uma aplicação limitada. A técnica do Yoga está fundamentada na filosofia de que todas as espécies de aflições têm raízes em avidyā (ignorância), ou falta de percepção de nossa natureza real. Pela remoção de avidyā, ou seja, tomando consciência de nossa real natureza, é possível remover todas as aflições pela raiz, para sempre.

Aqueles que desenvolveram essa prática, após penetrarem nos profundos problemas e realidades da vida e da consciência humana, não ignoravam as limitações do homem comum e as diferenças de seus temperamentos e seus estágios de desenvolvimento. Eles perceberam claramente a necessidade de desenvolver uma técnica abrangente, que pudesse ser adaptada a qualquer tipo de pessoa, independentemente de seu temperamento ou estágio evolutivo. Criaram variantes dessa técnica para atender aos diferentes temperamentos nos estágios iniciais, onde as diferenças individuais precisam ser consideradas para assegurar o progresso. Pensaram em exercícios preliminares e num desenvolvimento progressivo de autodisciplina, para preparar adequadamente aqueles que ainda não eram capazes de empreender uma prática de Yoga mais séria e intensiva. Essas adaptações fizeram com que os benefícios do Yoga estejam ao alcance de qualquer um que deseje seguir esse caminho.

Quando o aspirante atingirá a meta? Essa é uma pergunta irrespondível, mas muito importante para quem realmente começou a trilhar esse caminho. A vida espiritual é um estado dinâmico de ser e consciência; seu objetivo não é alcançar um estado estático ou final. O que é significativo é o processo de desenvolvimento, e não qualquer estágio temporário ao qual o discípulo seja levado.


Portanto, o aspirante deve lembrar que os benefícios obtidos, mesmo por essa Yoga preliminar, são tão impressionantes e substanciais que, sem dúvida, compensam a sua autodisciplina. A paz e a alegria, que não dependem de qualquer estímulo externo; a força espiritual, que não necessita de nenhum apoio externo; o conhecimento intuitivo, que gradualmente começa a fluir do interior para a mente; a certeza nascida do contato parcial com as realidades internas; a libertação das preocupações, à medida que se tem cada vez menos apegos. Tudo isso é o fruto, mesmo preliminar, do Yoga. Esse fruto precisa ser notado, para que o aspirante tome plena consciência de tudo o que estava perdendo enquanto continuava completamente imerso na vida comum.

Os Yoga-Sātras de Patañjali formam um livro com 196 sātras, ou aforismos, divididos em quatro capítulos. O primeiro capítulo trata da natureza geral do Yoga e suas técnicas. Samādhi é a técnica essencial do Yoga; por isso, mesmo sendo de difícil compreensão, foi estudada no primeiro capítulo.

O segundo capítulo aborda as limitações, ilusões e consequentes misérias humanas e da filosofia de kleshas, com um método geral para libertar a alma humana dessas aflições. Aborda, também, a preparação preliminar para uma vida yóguica e as cinco primeiras das oito partes em que se divide a técnica do sistema de Patañjali. Esse capítulo inteiro trata, portanto, da filosofia básica e das práticas preliminares a serem dominadas antes que o sādhaka esteja em condições de lidar com a própria mente com seriedade e eficiência. Esse é o capítulo mais importante para o principiante.

O terceiro capítulo aborda as práticas puramente mentais que culminam em samādhi e as realizações que se tornam possíveis com sua prática bem-sucedida. Nestas últimas estão incluídos não apenas os poderes psíquicos do Yoga (chamados siddhis, em sânscrito), mas também a liberação final da consciência das limitações e ilusões da mente, o que leva à kaivalya (autorrealização).

O último capítulo trata da filosofia e da psicologia do Yoga de maneira geral, e também dos estágios finais da técnica do Yoga, que levam à autorrealização. O livro, portanto, abrange um vasto campo e trata de todos os problemas relativos ao autodescobrimento e à autorrealização por meio do Rāja-Yoga. Como, porém, o assunto foi tratado sob a forma de sātras, o verdadeiro conhecimento deve ser extraído aos poucos da mente de cada um, por meio de uma cuidadosa reflexão. Mas o assunto é tão importante, e tão fascinante para o aspirante, que vale todo o trabalho necessário.

Em primeiro lugar, são as agitações, distorções e modificações comuns na mente, chamadas citta-vrttis, que obscurecem a realidade e ocultam nossa verdadeira natureza divina. Se elas forem removidas, por algum método, e a mente ficar completamente calma, sem qualquer modificação – transparente, por assim dizer –, nós percebemos a realidade que já brilha no centro de nossa consciência. No Yoga, as agitações e modificações da mente, que existem em diferentes graus, vão progressivamente cessando, até que a mente se torna tranquila, transparente, límpida como a água. Ela está presente, mas imperceptível. Este é o estado de autorrealização.

Entretanto, devemos compreender que, embora o processo de remoção das agitações e obscurecimentos da mente e a consequente percepção da realidade pareça muito simples, na prática ele não é. Existem as fortes tendências mentais, os impulsos do passado, as impressões sob a forma de karmas e a lentidão das transformações que precisam ocorrer. Por isso é necessário um longo período de disciplina e de prática das técnicas do Yoga. Os resultados são seguros, mas devemos estar preparados para pagar o preço, sob a forma de esforços e sacrifícios. Nosso objetivo não pode ser atingido com métodos fáceis, ultrassimplificados, que são recomendados em certos círculos.

A palavra samādhi designa o mais elevado estado de meditação, quando há consciência apenas do objeto da meditação, e não da própria mente. O samādhi é o ponto culminante da meditação sobre um objeto cuja realidade deve ser compreendida diretamente. Ele é precedido por dois outros estágios, chamados dhāranā e dhyāna. O Yogue começa com drārana, ou concentração. Quando dhāranā se torna perfeita, transforma-se em dhyāna, ou contemplação; quando a contemplação é perfeita, transforma-se em samādhi, ou êxtase.

A percepção comum baseia-se numa relação sujeito-objeto, onde está presente uma triplicidade – o conhecedor, o conhecimento e o conhecido. A realização baseia-se na fusão desses três elementos num estado integrado de consciência.

O que esse sātra descreve é a ascensão da consciência nos diferentes planos e nos vários estágios de samādhi, (tratados no sātra 17 do Capítulo I). Quando a consciência atinge o plano átmico, o mais elevado plano no sistema manifestado, resta apenas uma barreira, um delgado véu. Chegamos, aqui, a uma situação peculiar. Nos estágios intermediários, havia sempre um nível mais profundo da mente onde mergulhar. Aqui, atingimos a barreira que separa o reino mais sutil da mente do reino da realidade. Portanto, o resultado de qualquer outro mergulho mais profundo na consciência só pode significar mergulhar na realidade, ou seja, atingir a autorrealização.

Tapas é, portanto, a transmutação da natureza inferior em superior por um processo de autodisciplina. Pode-se lançar mão de disciplinas austeras de várias espécies, e deve-se fazê-lo, se absolutamente necessário, mas essa não é a parte essencial do processo. A purificação e o controle podem ser obtidos por métodos mais eficientes do que a obediência a votos rígidos ou a submissão do corpo a desconfortos e sofrimentos desnecessários. Cada aspirante deve usar, com inteligência, seu método individual.

Todos os meios, métodos e práticas que têm o efeito de abrir o canal entre a mente inferior e a mente superior, (como reflexão, meditação, japa, etc.) são denominados svādhyāya. O principiante deve utilizá-los cada vez mais, à medida que crescem seus interesses e capacidades.

Quanto a Īśvara-pranidhāna, comumente traduzida como autoentrega a Deus, é realmente um aspecto da devoção e um método eficiente para desenvolvê-la.

A pergunta que surge em seguida é: aceitando que toda a vida
humana seja de miséria, é possível evitar essa miséria ou nos livrarmos dela? A resposta é absolutamente clara, inequívoca e enfática; está no sātra II-16: “A miséria que ainda não chegou pode e deve ser evitada”. Essa é a resposta que uma verdadeira filosofia de vida deve oferecer. Qual é a utilidade de mostrar as limitações da vida sem oferecer uma solução real, uma esperança de libertação? No entanto, muitas das filosofias modernas são assim; levantam questões e as deixam sem resposta, oferecem remédios que são meros paliativos ou simplesmente não os oferecem.

A necessidade de concentração em um determinado aspecto,
durante certo tempo, que tem gerado a noção equivocada de que somos mais bem adaptados, por temperamento, para trilhar uma determinada senda, e precisamos segui-la se quisermos que nossos esforços sejam bemsucedidos. Na realidade, as condições diferentes da mente, das emoções e das ações, que indicam nossa adaptação a um determinado caminho – jñāna, bhakti ou karma –, não passam de fases do nosso desenvolvimento interior. Por isso, não devemos hesitar em tomar um rumo diferente se sentirmos uma forte tendência para fazê-lo.

Não se trata de seguir uma determinada técnica, ou, melhor dizendo, de dar ênfase especial a uma determinada técnica durante certo tempo, de acordo com as necessidades do nosso desenvolvimento interno. O desenvolvimento harmônico não significa desenvolver todas as linhas com a mesma intensidade. Significa apenas não permitir que qualquer aspecto da nossa natureza fique para trás a ponto de afetar o nosso equilíbrio e impedir o progresso.

De modo geral, pode-se dizer que o sistema de Yoga apresentado nos Yoga-Sātras consiste em uma integração harmoniosa dos cinco principais sistemas que prevalecem no Oriente – Rāja-Yoga, Jñāna-Yoga, KarmaYoga, Bhakti-Yoga, Hatha-Yoga. Foram escolhidas as técnicas essenciais desses diferentes sistemas, combinando-as num todo efetivo, progressivo e sistemático, que pudesse ir ao encontro das necessidades de todos os aspirantes, em diferentes estágios de desenvolvimento. Seu valor baseia-se na abrangência e na ênfase dada aos elementos essenciais, excluindo todas as práticas não essenciais. Por isso, ele constitui o sistema mais útil e efetivo de Yoga, que sobreviveu às provas do tempo e da experiência.

A própria natureza das práticas evidencia uma certa relação
sequencial entre elas. Por exemplo, concentração (dhāranā), contemplação (dhyāna) e êxtase (samādhi) devem ser praticados nessa ordem, pois são três estágios progressivos do mesmo processo. De maneira semelhante, autodomínio (Yāmā), regras estritas para a autodisciplina (niyāma), postura (āsana), regularização e controle da respiração (prānāyāma) e abstração (pratyāhāra) também devem vir na mesma ordem, pois a prática bemsucedida de qualquer uma dessas técnicas depende do domínio, pelo menos parcial, das técnicas que a antecedem. Não se pode, por exemplo, praticar prānāyāma sem antes praticar yāmā-niyāma e adquirir um certo grau de controle sobre as emoções e os desejos. Da mesma forma, concentração (dhāranā), contemplação (dhyāna) e êxtase (samādhi) não podem ser praticados sem completo controle do corpo físico e a eliminação pelo menos dos desejos comuns, que exercem grande pressão na mente.

No famoso Sādhana-Chatushthaya, o sistema quádruplo de autocultura, é necessário primeiramente adquirir as quatro qualificações básicas para trilhar o caminho. Elas são chamadas, em sânscrito: viveka, vairāgya, shattsampatti e mummukshattva. É apenas em um estágio avançado do desenvolvimento que a prática da meditação intensiva é utilizada para abrir os canais entre o inferior e o superior e estabelecer o centro da consciência nos planos espirituais da manifestação.
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