Lara Moreira 24/04/2020O livro faz uma discussão histórica das conquistas femininas, no Brasil, a medida que entrelaça os direitos alcançados e o trabalho massivo das lutas para manter esses direitos. Dividido em artigos, aborda sob óticas diferentes problemas sociais que as mulheres vivenciam: preconceitos, feminicídio, violência verbal, racismo, desigualdades no trabalho e no ambiente social como um todos. Em alguns momentos confesso que parei as leituras para aprofundar um pouco sobre as reportagens exemplificadas em alguns dos artigos e sobre as ondas revolucionárias decorrentes das injustiças sociais. Um livro de grande reflexão, de linguagem acessível e com conteúdo excelente, que nós faz repensar enquanto mulheres sobre nossas lutas e a importância de estarmos vigilantes quanto aos nossos direitos, bem como reforça a vivência que a desigualdade ainda é sinônimo de violência, sofrimento e morte. .
“Terceira Onda abriu caminho para a emergência de categoria de gênero, com a aceitação de outras feminilidades e masculinidades, além da desconstrução da categoria "mulher" singularizada, a partir da constatação de que havia "mulheres", de características variadas, em termos de raça, religião, identidade, nacionalidade e cultura.
Não deve deixar de ser dito, porém, que a mesma internet, ao incrementar a indústria pornográfica e difundir o acesso a seus produtos, vem possibilitando que muitas mulheres sejam prostituídas e mantidas em cárcere privado, processo que tem sido esquecido e/ou silenciado nas manifestações, a não ser quando algum escândalo estoura na mídia ou a ONU divulga novas informações sobre o tráfico.
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Quantas parlamentares, no planalto federal, estadual ou municipal, dedicam seu mandato à causa das mulheres? Por que as mulheres, sendo a maioria da população, estão tão pouco representadas?
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Inúmeros estudos apontam que as mulheres eram (e ainda são) o segmento mais vulnerável à violência e discriminação no Brasil, quer no período colonial, quer nos primeiros anos do séc XXI. E que, sim, essa vulnerabilidade sofria (e ainda sofre) gradações de acordo com o tom de pele e os trações fenotípicos da mulher em questão. .
Entre os muitos sintomas do estigma, está o duplo efeito de tornar a mulher que o carrega vulnerável à violência e desautorizar a sua defesa. Trata-se de uma forma mais dissimulada e nem por isso menos moralista de dizer que é bem feito. A grande repercussão de casos como esse se deve, obviamente, à natureza brutal do ataque. Mas devemos refletir sobre a despreocupação com que os algozes expõem a vítima e seus feitos, sobre como responsabilizam a vítima por ter sido vitimada, sobre como as investigações são conduzidas e os fatos noticiados. Há uma didática nisso tudo, um encadeamento que leva a nós, mulheres, a refletirmos sobre os perigos que corremos exercendo nossa sociabilidade, nossa afetividade e especialmente nossa sexualidade, e não necessariamente leva os homens a refletirem sobre o seu papel nesse processo. Isso costuma gerar um pânico generalizado, a partir do qual as mulheres se veem impelidas à vigilância constante, de si próprias e também das outras mulheres." (from "Lugar de Mulher: Feminismo e política no Brasil (Pensar Político)"
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A inserção do Brasil no movimento mundial de mulheres acontece, portanto, a partir do reconhecimento da trajetória de opressão compartilhada por pessoas que se reconhecem como mulheres em diferentes pontos do planeta, mas também recolhe elementos da política local para (re)armar uma pauta própria de demandas que busca fazer frente ao conservadorismo da política institucional por meio da sensibilização da sociedade.”