deuxdesoleil 21/12/2023
Os saxões viraram amigos e o destino é inexorável.
Desde a trilogia “As crônicas de Artur”, ainda não encontrei nenhum escritor de ficção que descrevesse cenários medievais, batalhas e tramas políticas tão bem e de forma tão cativante quanto o Cornwell. Ele é um mestre e como escritora fico emocionada em ler cada palavra das histórias dele. Dessa forma, fica nítido, que eu tinha muitas expectativas ao pegar “O último reino” para ler. E, para minha (não) surpresa, amei cada detalhe!
A história acompanha Uhtred, um personagem fictício, entre os séculos VIII e IX no que conhecemos hoje como Inglaterra. Cornwell tem algo muito afetivo em narrar crianças sofrendo e/ou tendo infâncias agitadas; eu gosto, mas confesso que em vários momentos senti similaridades com outros livros do autor.
As personagens são escritas de forma crível e o cenário machista, opressor, agressivo, patriarcal, tudo que a gente sente aversão ao pensar na Idade Média está aqui. O ator não tenta escrever ficção comercial, ele traz fatos históricos e cria a ficção em cima disso. É uma verdadeira aula de história! E o mais absurdo: os nomes esquisitos, o vai e vem entre os territórios, a politicagem, os costumes diversos etc., é tão fácil e fluído de ler que parece mágico! (Digo isso porque, apesar de besteira, é extremamente complicado encontrar livros atuais com toda essa complexidade narrativa e ainda assim serem coesos e coerentes).
Penso que, por ser uma ficção histórica, fica bem difícil criticar a atitude de certos personagens. Apesar dos esforços do narrador, não desgosto totalmente do Rei Alfredo, não detesto totalmente todos os cristãos, assim como não amo totalmente todos os pagãos. Seguindo as histórias de Cornwell, no século V, eu detestei os saxões; agora, séculos mais tarde, os saxões enfrentam as “mesmas” batalhas que seus antepassados infligiram nos britânicos e eu simpatizo com eles agora! O destino é inexorável, eu acho.
O cristianismo não apenas sobreviveu, como está mais forte. Porém, não sinto que é o carro chefe desse primeiro volume. A história é muito sobre o Uhtred, o crescimento dele, as dúvidas, as crises existenciais de um jovem que perdeu muita coisa e precisa ser esperto para sobreviver. A personagem é um verdadeiro camaleão! Já na infância, podemos ver essa esperteza e gosto muito dos potenciais caminhos para essa personalidade. Meu único ponto negativo é a voz da personagem. Não acho clara o suficiente, mas talvez seja por conta da infância/juventude ou do narrador-futuro.
Em suma, eu me emocionei, eu ri, eu imaginei batalhas como se estivesse presente nos acontecimentos. Os costumes pagãos são de uma riqueza cultural e de um respeito lindos de se ler! Cornwell escreve de uma maneira mágica e “O último reino” tem a essência do escritor. Era exatamente o que eu esperada e conseguiu superar minhas expectativas. Tive que iniciar a continuação no mesmo dia!